Proposto por ativistas profissionais de comunicação de todo o país durante o segundo II Comunicaids, a lista de recomendações foi entregue durante uma Live transmitida pela Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero e marcou o lançamento da terceira campanha institucional produzida pela ONG pernambucana este ano. O documento aponta a necessidade de uma comunicação baseada em evidências, que estimule afetos (de solidariedade e esperança) e promova direitos.

As recomendações partem de três perspectivas centrais: 1 – a aids não é uma doença superada no Brasil – o que implica desafios agravados pela Covid-19 (com a maior dificuldade de acesso aos serviços de saúde); 2 – não se pode negligenciar políticas públicas em comunicação diante de um contexto de desinformação generalizada (disseminada inclusive por órgãos públicos e autoridades nacionais); e 3 – que os meios de comunicação (principalmente os digitais) são espaços de disputas de opinião e narrativas, tornando a participação social fator primordial para a construção de estratégias coletivas de enfrentamento aos dois vírus.

“Recomendamos ao Ministério da Saúde que valorize o acúmulo das organizações da sociedade civil (OSC) na comunicação em saúde, evitando a concepção de grupos de risco e fomentando as participações das comunidades e dos públicos na construção dessas estratégias comunicacionais”, disse Alessandra Nilo, coordenadora geral da Gestos e co-facilitadora do GT Agenda 2030 no Brasil. “Pedimos que o Ministério da Saúde volte a reorientar sua comunicação a partir dos direitos humanos e dos princípios do SUS, para que isso aconteça, precisamos voltar a trazer temas que sejam essenciais para a resposta ao HIV e à Covid-19 – como questões ligadas ao racismo estrutural, equidade de gênero e o respeito às diversidades e direitos como um todo”.

Algumas das recomendações giram em torno do financiamento de ações locais promovidas pelas OSC e media training de ativistas como forma de intervenção social em saúde; bem como a utilização de linguagens inclusivas e o protagonismo das pessoas vivendo com HIV/aids (PVHA), além da implementação de estratégias de informação sobre HIV e Covid em espaços públicos e comunitários de saúde.

“Uma dessas estratégias consiste em aproveitar esse momento em que o SUS tem uma valorização momentânea (em função da vacinação de forma ampla) para incluir as pautas de aids como uma resposta de sucesso pretérito e desafios presentes”, destacou o jornalista, professor e ativista, Liandro Lindner.

Durante a entrega do documento, o diretor do departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis do Ministério da Saúde (DCCI), Dr. Gerson Pereira, se disse ansioso para tê-los em mãos, pontuando: “o aporte que essa reunião nos dará é importante para que a gente possa, de fato, escolher a melhor forma de comunicar sobre os agravos do HIV/aids para as populações que temos como prioritárias”.

Frente à atual conjuntura política nacional, Moysés Toniolo, membro do Conselho Nacional de Saúde, integrante da Articulação Nacional de Luta contra a Aids (Anaids) e da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids (RNP) avaliou que “as pautas mais importantes para nós, do movimento social de luta contra a aids (como a garantia dos direitos humanos e, principalmente, sexuais e reprodutivos das pessoas em vulnerabilidade), precisam estar sendo tratados sem ideologias que tentam reverter as questões de gênero e sexualidade. Precisamos falar de prevenção numa perspectiva ampliada e não mais minimalista; precisamos falar de promoção de saúde!”

“Neste sentido, a comunicação que se move de forma estratégica e colaborativa é fundamental para superar as barreiras sociais e realmente ajudar nas transformações que necessitamos na sociedade”, disse Claudia Velasquez, diretora e representante do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids no Brasil, que também pretende interiorizar as estratégias apresentadas ao Ministério da Saúde.

Agora, o próximo passo é a incorporação dessa agenda pelo Conselho Nacional de Saúde. O Movimento aids e as organizações da sociedade civil estão à disposição para colaborar com o Ministério da Saúde na implementação dessas recomendações. A lista também será traduzida para o inglês e o espanhol, a fim de internacionalizar as proposições.

Campanha

Um reflexo das recomendações que compõem o documento enviado ao governo podem ser vistas nas campanhas institucionais produzidas pela Gestos no ano de 2021. Todas estão interligadas pelo mesmo conceito: a conjugação dos verbos “proteger”, “tratar” e “respeitar”; cada verbo, marca uma nova campanha, todas conectadas pelo slogan: “A Gestos orienta, o SUS garante”.

A primeira campanha, lançada em 12 de junho, aproveitou o Dia dos Namorados para enfatizar que o cuidado (consigo e com o/a parceiro/a) é um gesto de amor e de prazer sexual. Abordando o tema da Prevenção Combinada, a campanha buscou estimular o autocuidado como fator central para o fortalecimento da saúde, informando sobre o que é e quais são os meios de prevenção combinada disponíveis no Sistema Único de Saúde e como acessá-los.

Já segunda campanha trouxe uma mensagem de esperança diante de um eventual teste positivo, estimulando a adesão ao tratamento a partir de informações sobre sua eficiência e baixa toxicidade (graças aos avanços da ciência). Apesar de incurável, com tratamento oferecido pelo SUS, pessoas vivendo com HIV/aids podem ter qualidade de vida, reduzir a quantidade de HIV no organismo e até mesmo tornar o vírus indetectável ou intransmissível. Esta segunda campanha foi protagonizada por pessoas reais vivendo com HIV, profissionais de saúde e parceiros/as da Gestos.

A terceira campanha, lançada ao final da Live de entrega das recomendações, teve como foco a luta contra o estigma e o preconceito, buscando referência em grandes personagens da história da humanidade (como Martin Luther King e Nelson Mandela) e enfatizando suas mensagens de respeito, diversidade, sabedoria, liberdade, dignidade e amor. A campanha evidencia ainda a necessidade de ações afirmativas de garantia de direitos para as pessoas vivendo com HIV. Enquanto o vírus se combate com prevenção e tratamento, o ódio deve ser combatido com atitude e lei.

Leia também: 

II Comunicaids: Para falar de aids em tempos de Covid-19 é preciso humanizar a pauta, defendem especialistas em comunicação

II Comunicaids: Ativistas apontam retrocessos em campanhas de prevenção e defendem comunicação voltada para públicos específicos

Dica de entrevista

Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero

Tel.: (81) 3421-7670