Com programação iniciada às 9h e previsão de término às 22h, acontece nesta quinta-feira (20) a 19ª edição da Feira Cultural LGBT+ organizada pela ONG APOGLBT, a mesma responsável pela organização da Parada do Orgulho LGBT+. A programação acontece ao ar livre e, em relação ao ano passado, mudou de endereço: em vez do Vale do Anhangabaú,é a Praça da República quem recebe as tendas do evento.

Neste ano, a movimentação dos visitantes não demorou a crescer. Em torno do meio dia, a Praça já estava tomada por diversas pessoas envoltas na bandeira do arco-íris. Do palco, localizado na ala oeste das imediações, tocava uma setlist animada de hits remixados dos anos 1980.

Os coletivos e ONGs ocupavam as ruas distribuindo panfletos e divulgando espaços e serviços disponíveis de assistência à população LGBT+. Nas tendas, marcas apoiadoras e voltadas para a comunidade LGBT+ vendiam roupas, DVDs e livros. Além delas, está cada vez mais forte o número de entidades e coletivos religiosos e profissionais da área da psicologia e jurídica, presentes para se dispor a acolher pessoas em grupo social de risco.

Com apoio do Sesc, a Agência de Notícias da Aids também marcou presença no evento e levou para o público a oficina da artista Adriana Bertini. Adultos e crianças aprenderam a utilizar preservativos como forma de produzir arte, ressignificando a prevenção e a sexualidade.

 

A artista Adriana Bertini conduz a oficina de produção de arte com preservativos

 

Neste ano, a empresa Burger King realizou uma ação de inventivo a entrada de pessoas trans no mercado de trabalho. A tenda da rede de fast food recebia currículos de pessoas LGBT+ para seu próprio banco de vagas; além de disponibilizar um fotógrafo para fazer fotografias profissionais com o intuito de atualizar redes sociais profissionais, como o Linkedin.

Patrocinador master dos eventos da Semana do Orgulho, Burger King recebia currículos de pessoas trans para trabalharem em sua rede

A Prefeitura e o Estado de São Paulo marcaram presença em ações de incentivo à prevenção e ao combate à ISTs, em especial o HIV/aids. Além de distribuição de camisinhas, foi montada um stand onde era possível realizar o teste rápido, em que é possível ter o resultado em torno de 15 minutos. Victoria Aline, 33, aderiu ao teste, registrou tudo e soltou nas redes sociais para divulgar esses serviços em sua rede de amigos. “Quanto mais informação, acredito que menor o preconceito”, explica.

 

 A prefeitura e o Estado de São Paulo disponibilizou um stand para retirada de autoteste e teste rápido

Jonathan Alves, 20, parabenizou a iniciativa de levar a estação de testes a um local tão visível como a República, porque vê a ação como uma maneira de quebrar o estigma e facilitar o acesso. “É importante não só para conscientizar, mas para cuidar da saúde”, diz. Até o fechamento desta reportagem, foram realizados testes no local.  Até o fechamento desta reportagem, 210 testes orais foram realizados e cerca de dois mil autotestes foram entregues.

Foram também divulgados panfletos com informações sobre a PrEP – tratamento diário com uso de medicamentos antirretrovirais para pessoas soronegativas antes de serem expostas ao HIV/aids – e a PEP – que previne a infecção após uma situação de risco. “Muita gente não conhece essas estratégias e procuramos fortalecê-las com materiais específicos e de incentivo aos testes”, diz Maria Cristina Abbate, coordenadora do Programa DST/Aids da capital.

Ivone da Paula, gerente da área de prevenção do Centro de Referência e Treinamento de DST Aids, vê uma maior aceitabilidade em relação ao autoteste. Tanto que, naquele mesmo dia, teve retorno de pessoas que o realizaram logo depois da retirada. “Começaram a entender que os testes são aliados, e não uma sentença de morte”, diz.

 

 Entre os espetáculos culturais previstos, estavam apresentações de drag queens

O posicionamento político não ficou de fora do evento, principalmente por parte da própria APOGLBT e do Centro de Referência e Defesa da Diversidade (CRD), mantido pelo Grupo Vidda. A primeira ONG organizou um abaixo assinado em repúdio ao PL 346/19, que estabelece que o sexo biológico como único critério para definição de gênero em competidores de partidas esportivas oficiais do Estado de São Paulo.

O CRD aderiu à pauta, mas também fazia um alerta quanto ao seu futuro incerto. Segundo Thais de Azevedo, que trabalha na organização desde sua fundação, em 2008, o serviço está sob ameaça de ser fechado, remanejado para a Secretaria de Direitos Humanos e fundido com o Centro de Cidadania LGBTI. “Eles não trabalharão com a questão do empoderamento do cidadão vulnerável, apenas cumprirão seus papéis e nada mais”, diz.

Do ponto de vista dos visitantes, tanto a feira como todos os eventos da Semana do Orgulho ganharam um simbolismo a mais de resistência. “Estamos sendo perseguidos”, diz o ator Tonny Salvatore, 26, ao comentar sobre o atual cenário de descaso com políticas públicas e com o surgimento de propostas de lei, como a qual o APOGLBT se posicionou contra, que visam ferir os direitos da comunidade. “É importante estarmos em um local como esse para ocupar as ruas e mostrar que não vamos parar de lutar”, completa.

A professora Viviane Barreto, 55, e a jornalista Taina Vilhena, 23, vieram do Belém do Pará e visitaram a feira”

A professora e artista plástica Viviane Barreto, 55, veio de Belém do Pará, onde mora há 15 anos, junto com a filha, a jornalista Taina Vilhena, 23, e incluiu a feira no roteiro. Ela sempre está presente nas paradas e se considera uma grande aliada do movimento LGBT. “Minha casa virou uma república, porque já acolhi jovens que foram expulsos pela família por não aceitarem sua orientação sexual”, diz.

 A filha explica que é muito importante existirem eventos tão fortes pela diversidade. “Espero que cresça a ponto de ser só mais um evento mensal, e não algo em que se precisa pedir por respeito”, explica. Já os olhos da mãe brilham ao falar das pessoas andarem de mãos dadas e poderem se expressar. “A sociedade precisa respirar liberdade em todos os sentidos, isso faz parte da construção da cidadania.”

 

Camila Cetrone em colaboração para a Agência Aids