Programa Brasil Saudável: os próximos passos da iniciativa

Para marcar a passagem do Dia Mundial da Saúde, comemorado sempre no dia 7 de abril, a Agência Aids conversou com o sociólogo Alexandre Grangeiro, ex-diretor do programa nacional de HIV/Aids do Ministério da Saúde (2003-2004). Atento observador das políticas públicas de saúde no Brasil e fora dele,  o pesquisador disse que  as políticas brasileiras de resposta à aids estão obsoletas. Fez mais observações. Segundo ele “ é uma ilusão achar que nós vamos conseguir eliminar o HIV sem traduzir essa prioridade em recursos. Hoje, com as restrições orçamentárias, nós temos reduzido os investimentos do Brasil”. (leia mais)

A Agência Aids convidou o atual diretor do Departamento de HIV, Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e ISTs, do Ministério da Saúde, Draurio Barreira, a responder às críticas e considerações feitas por Alexandre Grangeiro. O gestor comentou que a atual gestão “encontrou um cenário de terra arrasada” é que o governo atual “passou a enfrentar os determinantes sociais da doença e não apenas os determinantes biomédicos.” Acompanhe a entrevista na íntegra.

 Em entrevista à Agência Aids, o pesquisador Alexandre Grangeiro afirmou que a política de aids no Brasil está obsoleta. Qual é a análise do senhor sobre as afirmações feitas pelo sociólogo?

Draurio Barreira – Alexandre Grangeiro e sua equipe de pesquisadores são uma referência na resposta brasileira ao HIV/Aids e suas opiniões, críticas e sugestões devem ser levadas em consideração. Ao ler sua entrevista, o parabenizei e repassei o artigo a muitos colegas dentro e fora do Departamento de HIV/Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e IST (Dathi) do Ministério da Saúde. Eu reconheço e concordo com muitas das afirmações contidas na entrevista e minha intenção nos comentários que faço aqui, são menos no sentido de contestá-las do que dizer o que estamos fazendo em relação às suas propostas.

Quando o pesquisador Grangeiro fala em resposta obsoleta, principalmente no que diz respeito a falta de acesso a informações sobre novas tecnologias de prevenção, mostra que a comunicação não está chegando nas populações-chave. Qual é a estratégia do governo para dialogar com este público?

Draurio Barreira – Nossa gestão, desde o início de 2023, encontrou um cenário de terra arrasada, que não foi maior por causa do comprometimento de muitos colaboradores do Ministério da Saúde que aqui permaneceram. Nos quatro anos do último governo, houve uma política de verdadeira destruição da resposta nacional ao HIV/Aids, até a palavra “aids” desapareceu do Ministério da Saúde. O antigo Departamento de HIV/Aids, Hepatites Virais e IST tinha virado o “Departamento de Condições Crônicas e IST”. O que são “Condições Crônicas?! Pode ser qualquer coisa, só não lembra a infecção pelo HIV ou a doença aids, ou seja, houve uma política deliberada de apagamento da aids e das populações mais vulnerabilizadas acometidas pelo HIV/aids. Isso foi feito de forma deliberada. Até as compras de insumos de prevenção foram reduzidas ou totalmente abandonadas, como a compra de gel lubrificante, e mesmo medicamentos para a prevenção, como a PrEP, que a equipe técnica, comprometida com a luta contra a epidemia, conseguia comprar, alegava que seu uso destinava-se ao tratamento, mas não para a prevenção…

Nesse sentido, perdemos muito tempo, ficamos para trás e fomos ultrapassados por muitos países que não passaram pelo mesmo retrocesso político que tivemos. Nesta época, eu estava trabalhando na OMS e era constrangedor ver o então considerado o “melhor programa de aids do mundo” perder totalmente o protagonismo que tivemos no passado.

Hoje retomamos o diálogo com a sociedade civil, trabalhamos baseados em evidências científicas e incorporamos as melhores inovações em diagnóstico, prevenção e tratamento. E estamos caminhando para chegar às populações mais excluídas, é a questão do acesso a que ele se refere. Por isso passamos a enfrentar os determinantes sociais da doença e não apenas os determinantes biomédicos.

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O ex-diretor do Departamento trouxe para a entrevista uma análise de que “hoje quem mora em São Paulo tem tido uma redução do risco de se infectar, de adoecer e de morrer de forma expressiva”. A curto prazo, o que o governo pretende fazer para que populações vulneráveis que vivem em diferentes cidades e estados do Brasil corram menos risco de se infectar?

Draurio Barreira – O programa lançado pelo Governo Federal em fevereiro passado, o “Brasil Saudável”, tem como objetivo eliminar a aids e outras dez doenças determinadas socialmente ao enfrentar seus problemas de base, reduzir a desigualdade social e a maior vulnerabilidade das pessoas excluídas socialmente.

Este Programa criou uma enorme expectativa em todo o mundo. O próprio diretor-geral da OMS Tedros Adhanom, e o diretor da OPAS Jarbas Barbosa, vieram ao Brasil para o lançamento do Programa, pois a abordagem intersetorial é recomendada pelas Nações Unidas e pela OMS como a forma mais eficiente de enfrentamento das doenças determinadas socialmente. Há uma grande expectativa de que o Brasil consiga, efetivamente, virar um modelo na eliminação da aids, e estamos trabalhando, junto a 14 ministérios e à sociedade civil, para eliminar a aids, e outras dez doenças, até 2030.

Adotamos a agenda 2030 dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) como o nosso norteador das políticas públicas para eliminação dessas doenças como problemas de saúde pública, e vamos eliminá-las!

Outro ponto é ponderação que ele fez sobre a eliminação da aids como problema de saúde pública até 2030. Na opinião do pesquisador, a forma pela qual o Brasil tem feito ações de prevenção, o país não conseguirá alcançar as metas da ONU. Ele cita como um dos problemas a falta de financiamento. Como o governo brasileiro responde a este apontamento? Como o Brasil tem se organizado para acabar com a aids até 2030?

Draurio Barreira – Neste ponto discordo do colega. Das metas colocadas pela UNAIDS, o 95/95/95, fechamos 2022 com 90/81/95, ou seja, detectamos 90% dos casos estimados, pusemos 81% dessas pessoas em tratamento antirretroviral (TARV), e tornamos indetectável a carga viral de 95% das pessoas em tratamento. Portanto, já atingimos, em 2022, uma das três metas de 95%. Daquelas pessoas que estão em TARV, 95% não tem carga viral detectável e não transmitem mais o HIV, quebrando a cadeia de transmissão.

Precisamos, sim, melhorar a detecção, ampliar a testagem e colocar as pessoas vivendo com HIV/aids (PVHA) em TARV. Encontrar essas pessoas tem sido nossa prioridade absoluta, juntamente à expansão da prevenção combinada.

Novamente voltamos à questão do acesso, para isso começaremos a trabalhar em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, com o Ministério da Justiça, com o Ministério dos Direitos Humanos, com o Ministério da Igualdade Racial, com outros nove ministérios e a sociedade civil para encontrar essas pessoas em situação de vulnerabilidade social, como, por exemplo, pessoas em situação de rua, privadas de liberdade, profissionais do sexo, HSH, migrantes etc. e colocá-los em TARV.

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O ministro Alexandre Padilha, que atualmente ocupa a pasta das Relações Institucionais, foi ministro da Saúde quando Dilma Roussef esteve à frente da presidência do Brasil, entre 2011 e 2014. Ele lançou a ideia de regionalizar as campanhas de prevenção. Ideia que não saiu do papel e que é uma demanda da sociedade civil faz algum tempo. Existe alguma intenção de viabilizar este projeto de comunicação? Se sim, a partir de quando?

Draurio Barreira – As campanhas já foram regionalizadas. Desde a última campanha do carnaval, em fevereiro passado, já tivemos campanhas distintas, respeitadas às diferentes culturas regionais e vamos ampliar essa proposta. Em 4 de abril reinstalamos a Comissão Nacional de Aids; e como um dos encaminhamos decidimos recriar o GT Comunicação da CNAIDS, que vai colaborar conosco na formulação das próximas campanhas.

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Sociólogo Alexandre Grangeiro diz que as políticas brasileiras de resposta à aids estão obsoletas 

Redação da Agência de Notícias da Aids

 

Dica de entrevista

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