Nesta segunda-feira (25), a coluna “Senta aqui, com Marina Vergueiro” recebeu  a física médica e divulgadora científica, Janaína Dutra Silvestre Mendes.

“Ser mulher no Brasil já é difícil, ser cientista no Brasil já é difícil, ser mulher cientista é muito difícil. A gente tem todos os atravessamentos de ser mulher. A gente teve mais um corte na ciência este ano. Sempre que a gente tem cortes na ciência, sendo de um grupo que já é subvalorizado, descapitalizado, que é o grupo das mulheres, um grupo minorizado, acaba sendo especialmente difícil. Nós somos 30% dos cientistas no mundo inteiro. No Brasil esse número é ainda mais baixo”, disse a cientista.

Marina questionou se, na ciência, as mulheres têm menos crédito que os homens. Janaína relatou a existência de um fenômeno chamado “Efeito Matilda”, que acontece quando as mulheres são alijadas de suas conquistas científicas, essas conquistas são simplesmente passadas para um homem. “A gente tem exemplos muito conhecidos na ciência e exemplos que acontecem diariamente aos montes nos laboratórios e institutos e não foram visibilizados. Há o caso da Rosalind Franklin que descobriu a dupla hélice do DNA e nunca ganhou o prêmio Nobel. Quem ganhou foi Watson e Crick e não foram eles que descobriram”, contou.

Segundo Janaína, existem algumas supostas pesquisas onde as pessoas tentavam usar um discurso meio biologizante para ‘explicar’ que as mulheres tinham dificuldades em ter um raciocínio geométrico, espacial, matemático, que elas não seriam capazes de ser boas cientistas e que isso poderia ser comprovado cientificamente. “Isso não é verdade, são pesquisas que contêm muito o que as pessoas chamam de ‘vieses inconscientes’, dados pelos próprios cientistas. Isso também é cientificamente comprovado, porque todas as ciências são sociais, são feitas por pessoas e têm os vieses dos cientistas que conduzem essas pesquisas.”

Ela alertou para pesquisas com vieses que transpõem comportamentos do que se esperam de uma sociedade heteronormativa dos seres humanos para animais. “A gente escuta que determinadas espécies de pássaro são fiéis, cacatuas são fiéis, se o macho morre, a fêmea viúva fica sozinha para sempre, fica fiel àquele macho. Aí foram estudar o  DNA da prole e descobriram DNA de um monte de macho. Aí usam esse exemplo para contar historinha pra mulher, transpõe isso para o comportamento humano porque é bonitinha a história, da mulher passiva, bela e recatada do lar. Por isso a gente fala desses vieses inconscientes que permeiam a ciência. Infelizmente, isso é muito comum”, lamentou.

Janaína contou que foi casada e às vezes, quando ia a algum congresso, perguntavam se o marido dela tinha deixado. Uma vez ela foi selecionada para participar de um evento só de mulheres e nunca havia participado de algo parecido.  “Aquilo me tocou profundamente, eu vi que havia pessoas que só trabalhavam com isso e que era possível eu trabalhar na minha área me sentindo confortável, sem que aquilo fosse uma luta diária, que eu pudesse estar no meu trabalho e não sentir desconforto. Porque até então eu achava que era natural sentir um desconforto diário.”

Na pauta da conversa ainda foram abordados temas como a inclusão de corpos femininos nos estudos clínicos, pílula do dia seguinte e outros medicamentos que não funcionam com determinados índices de massa corpórea (IMC).

Assista a conversa na íntegra no Instagram da Agência Aids:

 

 

Redação Agência de Notícias da Aids