Desde o final de dezembro circula nas redes sociais o relato da dra. Marta Ramalho sobre a possibilidade de terceirização o Instituto de Infectologia Emílio Ribas. Isso porque desde o começo da pandemia do novo coronavírus uma parte do hospital vem sendo gerida por uma organização social. Outra preocupação é com o déficit no quadro de funcionários e a falta de concurso público. O assunto foi destaque nessa segunda-feira (4), na Agência Aids. A infectologista, que trabalha no hospital desde os anos 1990, quer o reconhecimento do Emílio Ribas enquanto instituto chave no combate e controle de doenças.

Em entrevista à Agência Aids, o diretor do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, dr. Luiz Carlos Pereira Júnior, rebateu a médica e garantiu que não existe a possibilidade de terceirização do Instituto. “Qual foi a maneira que todos os serviços do país conseguiram fazer para agilizar a contratação de profissionais? Foi através de contratação de serviços terceirizados. Essas contratações aconteceram em todos os serviços dos municípios, hospitais de campanha, e não seria diferente no Instituto Emílio Ribas. Nós tivemos que passar, em um mês, de 12 para 60 leitos de UTI. Como é que você faz isso fazendo concurso público?”.

O gestor confirmou que há possibilidade de ter um concurso público ainda este semestre. “O processo de contratação de profissionais efetivos para a instituição está na agenda deste ano. Nós já encaminhamos para a Secretaria a solicitação de todos os profissionais que nós precisamos ter contratados para o início deste ano agora, para o primeiro trimestre, talvez até a metade do ano. Vai depender do ritmo do comportamento da epidemia.”

Sobre o sucateamento, Dr. Luiz Carlos disse que é injusto falar de sucateamento. “Dizer que o hospital está sendo sucateado, é uma grande injustiça. O hospital recebeu setenta milhões de recursos para insumos, para medicamentos, para materiais, para EPIs, para diagnóstico. Não falta absolutamente nenhum material para fazer o trabalho que nós estamos fazendo de assistência. Então não é justo dizer que o hospital está sendo sucateado. Um hospital que está recebendo R$ 34 milhões para reforma, que recebeu uma segunda tomografia, que está em torno de dois milhões de reais, um hospital que entregou uma área completamente nova, que tem uma UTI que é modelo – são trinta leitos dentro de uma terapia intensiva com pressão negativa.”

Por fim, o médico reafirmou que sua gestão é pautada no diálogo com todos os profissionais de saúde e que as portas estarão sempre abertas para discutir os rumos técnicos do Emílio Ribas.

Confira a entrevista a seguir: 

Agência Aids: Recebemos na Agência Aids uma denúncia/desabafo da Dra. Marta Ramalho, do corpo clínico do Instituto Emílio Ribas. Ela cita, por exemplo, o medo da terceirização do hospital (leia mais). Gostaríamos de ouvir da direção do Emílio o que está acontecendo na Instituição neste momento de pandemia

Dr. Luiz Carlos: Eu recebi no outro final de semana essa manifestação. Nós fizemos uma nota para divulgar para a imprensa também. Eu me posiciono de uma maneira muito tranquila, simplesmente pelo fato de estar muito ciente da responsabilidade do Instituto nesse momento de pandemia. Esse é o nosso guia para o desenvolvimento do nosso trabalho. Então, em cima desse contexto, há várias decisões tomadas de uma maneira muito consciente e responsável para quem mais precisa do serviço do Emílio Ribas nesse momento de pandemia. Vários ajustes tiveram que ser feitos como nós vimos pelo Brasil afora. Nós não somos diferentes disto. Esta situação nos impõe várias acomodações, várias adequações, sem que isso determine, em nenhum momento, mudanças no futuro da instituição.

Em entrevista à Agência Aids, a dra. Marta disse que o hospital está sendo terceirizado. Isto é verdade? Sabemos que tem uma organização social gerindo alguns andares no Emílio Ribas. Existe uma previsão para a saída deles? Qual o plano do hospital?

O hospital encontra-se em reforma, está nesse momento na sua segunda fase de reforma e eu adianto aqui que esse tempo longo de reforma deveu-se ao pior período de recessão econômica da história deste país, que foram os anos de 2014, 15 e 16. Então, nós tivemos contingenciamento durante esses anos e obviamente este contingenciamento atingiu também o ritmo das reformas. Para nós é fácil entender isso, não tinha recurso no país para que a gente continuasse com esses compromissos. Outras prioridades se impuseram para que a Secretaria da Saúde mantivesse a assistência naquele momento no país. Eu lembro também que a assim que o Dr. Jean assumiu a Secretaria nesta gestão do governador Doria, no segundo mês de gestão dele como secretário, fomos chamados e a reforma foi retomada imediatamente. Uma segunda fase foi licitada e ela continua agora no ano de 2021. Estou falando isso, porque o hospital precisa terminar essa reforma, ninguém duvida disso, mas nesse contexto em que o hospital se encontra ainda com a reforma acelerada, nós tivemos que enfrentar a covid-19. E qual foi a maneira que todos os serviços do país conseguiram fazer para agilizar a contratação de profissionais? Foi através de contratação de serviços terceirizados. Então, essas contratações aconteceram em todos os serviços dos municípios, hospitais de campanha, e não seria diferente no Instituto Emílio Ribas. Nós tivemos que passar, em um mês, de 12 para 60 leitos de UTI. Como é que você faz isso fazendo concurso público? Não existe essa possibilidade. Foi essa a medida imediata que nós precisamos que tomar. Isto não significa a terceirização do hospital. Essa dinâmica, essa agilidade, essa rapidez, foi sempre comunicada para todo mundo no hospital. Nós fazemos reuniões quinzenais, não fizemos agora no mês de dezembro. A última reunião que nós fizemos com a associação dos médicos foi na primeira semana de dezembro, inclusive com a presença da Dra. Marta. Nós ouvimos o corpo clínico, a associação dos médicos é ativa. É muito saudável que as instituições tenham uma associação presente, ativa. Nós ouvimos a associação, dividimos os passos que tomamos, as decisões, com essa associação, todos os diretores das principais áreas, de enfermagem, de apoio técnico, da área médica, da área de diagnóstico, participam dessas reuniões com a associação dos médicos. Portanto, esses passos são feitos, eles são sinalizados com antecedência, e são decisões que nós temos que tomar de uma forma muito rápida. Estou falando deste momento que fez com que nós tivéssemos que fazer a contratação de empresa terceirizada, o processo é um processo regular, aprovado pela Procuradoria Geral do Estado e houve um vencedor nesse processo de licitação que assumiu esses leitos. Eu repito, passar de 12 para 60 leitos de UTI demandou do hospital um esforço muito grande de adequação, de treinamentos sucessivos, frequentes. Em abril, maio, foram três treinamentos de todas as equipes por dia. Houve um movimento muito intenso para que a gente pudesse dar assistência para a população que mais precisava de nós nesse momento.

Como tem sido o atendimento de infectologia com a chegada desses médicos uma vez que os profissionais da SPDM são todos médicos generalistas? Houve algum prejuízo na área de infectologia?

Nós estamos falando de uma doença que, a princípio, é uma doença sistêmica, com uma gravidade respiratória, é a justificativa da internação e da abertura dos leitos da UTI. Então, o que nós precisávamos era que tivéssemos médicos preparados para fazer essa assistência. Você não tem a quantidade de infectologistas suficiente para cobrir essa demanda de trabalho. Esta é uma situação muito clara. A empresa terceirizada assumiu um compromisso por contrato de que ela teria profissionais preparados para atender pacientes de terapia intensiva. Essa demanda foi cumprida, nenhum paciente deixou de ser atendido. Isso foi uma medida emergencial que não significa que esta seja a estratégia definitiva para o futuro da instituição. Isto tem sido repetido por mim diretamente em todas as reuniões. Então, eu reitero aqui, não existe a possibilidade da terceirização do hospital.

Existe a possibilidade de abertura de concurso público nos próximos meses?

Assim que o Dr. Jean, que é médico oriundo do Emílio Ribas, o que nós chamamos de Emiliano, assumiu a Secretaria da Saúde, uma das primeiras perguntas que ele me fez foi: qual é a vacância? Qual é o tamanho da perda de profissionais efetivos do hospital, não só corpo clínico, mas de todo o efetivo do hospital, quer seja por demissão, aposentadoria, restrições. Ele me perguntou lá no início, já entendendo que em algum momento precisaríamos fazer concurso público. Nós já estávamos com essa agenda no começo do ano quando fomos tomados de surpresa com a chegada da covid com a velocidade que ela veio. Aí essa agenda ficou postergada. Você imagina o hospital com dois movimentos acontecendo ao mesmo tempo, tendo que se adequar para atender covid, ao mesmo tempo que estava acelerando seu processo de reforma, duas situações extremamente desafiantes. E aí esse processo de contratação de profissionais efetivos para a instituição acabou sendo colocado para este ano agora. Ele está na agenda deste ano. Nós já encaminhamos a solicitação de todos os profissionais, com todas as suas justificativas, dos funcionários que nós precisamos ter contratados pela Secretaria para o início deste ano agora, para o primeiro trimestre, talvez até a metade do ano. Vai depender do ritmo do comportamento da epidemia. Esse também é um compromisso que nós também dividimos com todos os profissionais da saúde.

Então já existe a possibilidade de abertura de um concurso público?

Sim, contamos com isso, claro. Tanto que nós fizemos as justificativas e encaminhamos para a nossa coordenadoria de saúde e esse pedido, neste momento, está lá. Ele foi aceito no começo de dezembro pela coordenadoria. A realização de concursos públicos está na agenda da Secretaria.

Até quando a equipe da SPDM continua dentro do hospital?

Até quando a pandemia exigir que a gente faça esse atendimento. Você não consegue fazer a contratação de dezenas de profissionais de terapia intensiva neste momento. Nós precisamos desse apoio deles. Eu imagino que eles têm um contrato que a vigência é até março deste ano e um contrato menor, que foi o inicial, que vai até dezembro deste ano. Este contrato tem essa vigência mas pode ser encerrado a qualquer momento. Vai depender obviamente do motivo que provocou essa contratação emergencial que foi o número de casos da pandemia.

O Instituto de Infectologia Emílio Ribas está sucateado?

O esforço que eu estou descrevendo do que foi 2020, foi um esforço que valeu à pena, que teve uma resposta de sucesso, simplesmente porque todos os funcionários do hospital entenderam a dedicação e o profissionalismo com os quais eles tinham que enfrentar esta pandemia. Não adianta nós queremos fugir dessa discussão e dizer que nós precisamos ter outras doenças infecciosas, que nós precisamos ter a pediatria, que precisamos abrir outras áreas do hospital para o ensino do médico residente. Nós estamos tendo uma pandemia. O hospital historicamente se transforma para o enfrentamento das pandemias. O hospital que tem 140 anos tem vários exemplos na sua linha da história em que ele se transforma e, mais uma vez, ele mostrou a sua capacidade em se transformar para atender o grande desafio que está batendo à nossa porta. Essa adequação e essa resposta que todos os profissionais deram, é a resposta que nós esperávamos que eles dessem. Os profissionais arregaçando as mangas para enfrentar uma única doença traz obviamente um grande desconforto, mas isso vai passar. Esta situação tende a voltar à normalidade até o final do primeiro semestre deste ano. Então, eu queria só destacar que para isso, dizer que o hospital está sendo sucateado, é uma grande injustiça. O hospital recebeu setenta milhões de recursos para insumos, para medicamentos, para materiais, para EPIs, para diagnóstico. Não falta absolutamente nenhum material para fazer o trabalho que nós estamos fazendo de assistência. Então não é justo dizer que o hospital está sendo sucateado. Um hospital que está recebendo R$ 34 milhões para reforma, que recebeu uma segunda tomografia, que está em torno de dois milhões de reais, um hospital que entregou uma área completamente nova, que tem uma UTI que é modelo – são trinta leitos dentro de uma terapia intensiva com pressão negativa. É injusto dizer que o hospital está sendo sucateado. Além do que, dezenas e dezenas de profissionais foram contratados pela Secretaria da Saúde pelo modelo de contrato por tempo determinado que é um contrato que tem duração de um ano.

É um contrato temporário?

É um contrato temporário para uma situação que é temporária que nós desejamos muito e esperamos que ela vá acabar. Esta situação toda deu condições para o hospital exercer seu papel. É por isso que eu fico indignado com essa situação de dizer que o hospital está sendo sucateado. Não é justo com o secretário que tem liberado milhões e milhões de reais, com o apoio do Governo do Estado que nós estamos recebendo. Por exemplo, está programada para a semana que vem, no máximo na outra, a entrega de um laboratório completamente novo, extremamente moderno. Está prevista também para início de fevereiro a entrega de uma área enorme da nossa farmácia, uma farmácia moderna, com capelas de fluxo laminar, com área de preparo de medicamentos, com área específica de guarda de medicamentos de alto custo, uma área de coleta e serviço social, uma recepção para a área de raio x, que nós temos uma unidade de área de diagnóstico por imagem inteiramente nova. E vão chamar isso de sucateamento? Não é justo com o secretário, não é justo com o Governo do Estado e, eu posso dizer isso, não é justo com os funcionários, muito menos com aqueles que dependem da gente e que nós estamos atendendo plenamente.

O senhor falou há pouco sobre a área da pediatria. O fechamento desta ala foi um dos descontentamentos da Dra. Marta. Existe plano de retomada dessa área pós pandemia?

Quando nós falamos de pós pandemia, existe muita discussão acontecendo. Uma delas é nós fazermos um planejamento para retomar a nossa infectopediatria. A nossa infectopediatria não é simplesmente colocar pediatras para atender. Para você ter um paciente de um ano de idade com meningite, eu preciso de neuropediatria, de cirurgião-pediátrico, eu preciso de várias especialidades pediátricas, então não é fácil a gente fazer do atendimento da pediatria simplesmente fundamentado na presença do pediatra. Existem outras consequências em ter crianças com doenças infecciosas dentro da unidade. Nós estamos fazendo um planejamento para que tenhamos de fato uma infectopediatria da melhor qualidade, é disso que precisamos. Mas não neste momento em que precisamos do espaço para atender pacientes com covid. Fechamos os leitos de enfermaria de pediatria porque estávamos já com uma taxa de ocupação baixa. No entanto, mantivemos todo o atendimento ambulatorial e nós reabrimos agora, de setembro para outubro, os agendamentos do ambulatório, inclusive os agendamentos do ambulatório de pediatria. Então, esta é a situação que eu posso dizer de como nós consideramos a pediatria, uma pediatria mais bem preparada quando nós pudermos abrir novamente, inclusive com leitos de UTI pediátricos. Este pacote de abrir a pediatria não é uma falácia, não é uma coisa muito simples. Nós temos que pensar nele em toda a sua complexidade, é assim que nós estamos planejando.

Vocês estão preparados para a chegada da vacina?

Em relação à vacina, só para dar um exemplo para vocês, nós fomos convidados para participar do projeto da Coronavac  e, como todos os projetos, a gente começa de um jeito mais vagaroso, aprende-se muito, depois a gente abre oportunidade para todos os candidatos que são profissionais da saúde. De dezesseis centros, o Instituto, é o centro que mais voluntários para pesquisa contribuiu colaborando com a entrada de voluntários e correspondendo com a expectativa do Instituto Butantan em relação à finalização das análises para que a gente possa ter a vacina da forma mais rápida possível.

De quantas pessoas estamos falando?

Estamos falando em 1.430 voluntários. É o centro no Brasil com maior número de participantes, com maior número de pessoas acima de 60 anos ou mais participando do projeto. Isto você constrói com muita dedicação, com muito trabalho, com muita entrega. Contatos diários, cem, cento e cinquenta contatos diários para saber como está o estado de saúde de todos os voluntários. É esse o trabalho que o Emílio Ribas faz e que as pessoas não falam, não comentam.

O que a equipe do Emílio aprendeu nesta pandemia?

Eu queria finalizar dizendo da importância de nós trabalharmos juntos. Eu digo, trabalharmos juntos, a gestão que ocorre dentro do Emílio Ribas é uma gestão participativa. Temos espaço para todas as áreas. A gestão do hospital não é feita apenas para os médicos, obviamente é uma parte importante. Mas nós temos uma gestão que se preocupa com todos os funcionários. Nós temos uma medicina do trabalho que cuida muito bem da saúde de quem cuida. Esse trabalho, muitas vezes não aparece. Por que não falta insumo na farmácia, no almoxarifado? Porque tem toda uma equipe por trás, trabalhando, orquestrada, em busca da agilidade na aquisição. No momento em que nós tivemos muita dificuldade do fornecimento de vários insumos – voltando nos meses de maio, junho, julho, quando foi muito difícil – conseguimos manter todo esse esforço dentro do hospital, e a gente conseguiu manter o hospital para chegar neste momento agora, sem que as condições de trabalho sejam as ideais. Este trabalho é um trabalho que fazemos de porta aberta, a Dra. Marta poderia facilmente nos procurar para tirar todas as dúvidas. Nós nos comunicamos, são feitas postagens atualizando sempre os movimentos que nós fazemos. Então, eu só peço, aproveito agora este momento para dar oportunidade para essas pessoas. Nos procurem, é muito mais fácil vocês olharem de maneira crítica a instituição e vocês dividirem conosco a oportunidade de melhorias, do que nós termos que dar respostas desta maneira a essas questões como nós estamos fazendo agora. A gente trabalha de porta aberta o tempo todo. Eu sou remanescente da mesma equipe da Dra. Marta Ramalho. Eu sou residente assim como ela, eu fiz minha vida toda dentro do hospital. Então, nós queremos o futuro da instituição de maneira muito parecida. Por que a gente não pode construir isso juntos? Este é um apelo que eu faço: nos procure. Todos são ouvidos e serão ouvidos.

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Talita Martins (talita@agenciaaids.com.br)

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