“O fim da epidemia só viria com a existência de uma vacina ou com o fim do estigma e das desigualdades” defende o sociólogo e pesquisador da Faculdade de Medicina da USP, Alexandre Granjeiro. Durante o debate que aconteceu na última semana no 20º Encontro Nacional de ONGs, Redes e Movimentos de Luta Contra a Aids, ele falou sobre alternativas de prevenção e a importância de o movimento social não se contentar apenas com o que já é oferecido. 

“O HIV nos ensina que é raro diagnosticar no momento inicial da infecção, que altas taxas de cobertura não incluem, necessariamente, os mais vulneráveis para adquirir e transmitir o HIV, que novas geração mudam o comportamento sexual e que pessoas estão menos dispostas a abrirem mão da liberdade sexual em função de uma doença que é menos grave do que foi ontem”, afirma Granjeiro. 

Em complemento, a médica da Fiocruz, Beatriz Grinsztein defendeu que é preciso lutar para que o monitoramento da carga viral seja uma realidade no país. “Não basta ter a adesão, apenas com o acompanhamento será possível a gente ver falhas precoces, já que há outros antirretrovirais disponíveis no caso de falha.” 

Beatriz também lembrou a importância do Indetectável=Intransmissível e ressaltou a alta prevalência do HIV e sifilis entre pessoas transexuais. “As pessoas que têm mais dificuldade em aderir o tratamento também não têm uma cobertura imediata”

Os limites da tecnologia de saúde

Para Granjeiro, “o passado também nos ensinou que não acabamos com a gravidez não planejada por causa da pílula anticoncepcional, não acabamos com a tuberculose ou hanseníase porque surgiram medicamentos para tratamento e prevenção. Isso acontece porque o limite da tecnologia de saúde está nas questões estruturais, está em quanto a sociedade consegue lidar com seus estigmas e desigualdades sociais, ou mesmo em limites comportamentais como o desejo, prazer e confiança, que envolvem o acesso e a forma como são usados.”

Na opinião do sociólogo, para profissionais do sexo, por exemplo, redução da criminalização teria um impacto maior do que antirretrovirais. “Não podemos desprezar as tecnologias de saúde, mas só serão efetivas se esses pontos forem observados.” 

“Tirar o peso do HIV devolve às pessoas que vivem com o vírus o direito à vida e o direito à vida sexual. Além disso, pode-se lutar por menos estigma já que muito do preconceito que se cria deve-se ao medo de pessoas que vivem sem o vírus de se infectar”, disse Granjeiro. 

Ele ainda afirmou que a saúde pública tende a ser normativa e que, por isso, se utiliza de frases como “use sempre camisinha”. Gestores de saúde e a sociedade concordam em fornecer medicamentos para que as pessoas não morram, não se infectem, para reduzir custos, mas não para transarem ou terem liberdade sexual. Além disso profissionais de saúde receiam dar autonomia aos seus pacientes.”

Protesto e Machismo

“O machismo mata! A aids mata!”, gritaram as ativistas do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas, ao protestarem no fim da mesa. Elas levantaram cartazes denunciando a exclusão das mulheres no debate sobre prevenção e também fizeram referência à recente aquisição de preservativos internos fabricados em látex em substituição às camisinhas de borracha nitrílica.

As ativistas também reivindicaram respeito ao corpo feminino e mais estudos e pesquisas sobre prevenção e antirretrovirais em mulheres.

“O machismo mata. É inadmissível que a gente tenha uma mesa que fale de prevenção, que fale sobre PrEP, sendo que essa não é uma prevenção universal. Não podemos aceitar que a gente continue trabalhando na ótica de que as mulheres são excluídas das estratégias de prevenção, que nós não somos vulneráveis. Não vamos nos calar!”