Em outubro de 2022, uma ação coletiva foi movida pelo Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul para restabelecimento das aposentadorias de pessoas vivendo com HIV/Aids que haviam sido cortadas no ano de 2017, no chamado pente-fino deliberado no âmbito da Previdência Social por meio da lei nº 13.457/17.

Fazendo oposição, a juíza Ana Paula Medeiros da vara de justiça do RS, recomendou ao INSS que restabelecesse as aposentadorias e propôs ação civil pública, mas como a recomendação não tem força coercitiva, a ação foi perdida em primeiro grau, mas posteriormente foi viabilizada.

O juiz Francisco Donizete, parceiro da luta contra a aids, foi relator desta ação e ordenou restabelecimento em até 60 dias de todas as aposentadorias por invalidez das pessoas com HIV/aids. Os pagamentos voltaram a ser feitos em todo o país no dia 23 de setembro.

Os argumentos da defesa estão sendo fundamentados na lei Renato da Mata de nº 13.847/2019.

Em entrevista cedida à Agência Aids, Renato da Matta, consultor na gerência do departamento de Aids da Secretária Municipal do Rio de Janeiro, ativista da causa e precursor da lei que carrega seu nome, destaca que esta ação não tem caráter permanente, a mesma está em segundo grau de apelação, sendo assim, ainda cabe recurso por parte do INSS.

“Por isso, aconselhamos estas pessoas que peguem o dinheiro e guardem, pois temos que aguardar o trânsito em julgado, ou seja, quando realmente acabar o processo e o INSS não tiver mais como recorrer da sentença”, falou.

Também conversamos com a advogada Patrícia Diez Rios, do Grupo Pela Vidda Niterói. Ela faz parte do time de advogados que está acompanhando de perto a evolução dos processos.  Segundo contou Patrícia, existe neste momento uma mobilização para comunicar o maior número de pessoas que se enquadram nos requisitos para o restabelecimento, assim como para comunicar as coordenações estaduais, municipais e serviços sociais. “Em reunião listamos o número de pessoas que ainda não foram alcançadas”, disse.

Patrícia dividiu que nos casos onde não há mais o que fazer através da ação civil pública, pretende levar à corte americana de direitos humanos.

Relembre o caso

Em 2017, época do governo Michael Temer, deu-se início a portaria nº 13.457/17 que determinou realização de perícias de revisão do benefício previdenciário de pessoas aposentadas por invalidez ou recebedoras de auxílio-doença.

A lei foi aplicada pelo INSS rapidamente e através de carta os beneficiários foram convocados e as perícias foram agendadas em cinco dias.

A cassação afetou milhares de pessoas pelo Brasil, dentre elas pessoas vivendo com HIV/aids.
“Mas foi em 2018 que o pente fino pegou em cheio as pessoas vivendo com HIV”, disse Patrícia Diez.

Diante da medida, houve a necessidade de apresentação de uma lei que impedisse tais revisões das aposentadorias de pessoas soropositivas, a “lei Renato da Mata” nº 13.847, que tramitou, foi aprovada na câmara e no senado, porém quando foi para a sessão do presidente da república, foi vetada. Mas, houve reversão do veto “virada linda”, lembrou a advogada.

Após a vitória, a lei foi publicada em junho de 2019, todavia já haviam diversas ações judicias tramitando pois as revisões estavam em curso desde o ano anterior.

Muitas ações foram ganhas com base nas argumentações científicas, como: envelhecimento precoce; efeitos adversos; atividade viral, além de terem se baseado nos respectivos laudos médicos, mas muitas foram perdidas, e outras continuaram tramitando mesmo após a publicação da lei.

As questões de estigmas, discriminação e necessidade de avaliação psicossocial também foram argumentos utilizados pela defesa.

A advogada entende que as perícias são extremamente prejudiciais para as pessoas vivendo com HIV/aids, pois estamos tratando dos chamados sobreviventes da aids, que enfrentaram a fase mais cruel da doença. Muitos destes, inclusive, hoje estão vivendo em situação de rua.

Renato da Matta compartilha da mesma opinião “muitas destas pessoas, a grande maioria, iniciaram medicações muito fortes e não tem a mínima condição de retornar ao mercado de trabalho. Nós que estamos em atividade aos cinquenta anos já temos dificuldades de conseguir emprego, imagine quem está na casa dos cinquenta e há vinte anos fora do mercado de trabalho”, disse.

Renato interpreta, desde o início, que o pente-fino não se caracteriza por algo parcial, mas sim uma forma do governo tirar da população dinheiro para transferir à outras áreas.

Kéren Morais (keren@agenciaaids.com.br)

Dica de entrevista

Grupo Pela Vidda Niterói
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Renato da Matta
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