É falso que o número de mortes causadas por HIV em 2020 seja quatro vezes maior do que o número de mortes por covid-19. Essa comparação equivocada foi feita pelo neurologista Paulo Porto de Melo em uma entrevista ao programa Pânico, da Rádio Jovem Pan. Um vídeo com as declarações do médico viralizou no Facebook e recebeu 49 mil compartilhamentos.

A afirmação de Porto de Melo do médico é insustentável. Ainda não há dados consolidados sobre as mortes de HIV ocorridas em 2020. O Unaids, programa das Nações Unidas (ONU) que age no combate à aids, apresenta informações somente até 2019. A instituição estima que, no ano passado, tenham ocorrido 690 mil mortes relacionadas à doença. Esse número pode chegar até 970 mil óbitos, de acordo com a entidade.

A plataforma Worldometers calcula que até esta terça-feira, 27, mais de 1,3 milhão de pessoas tenham morrido em decorrência do HIV em 2020. O cálculo é baseado em dados disponíveis, tendências históricas e projeções da Organização Mundial da Saúde (OMS), da Unaids e da Avert.org. Mesmo que essa projeção se confirme, a afirmação de Paulo Porto ainda estaria equivocada. De acordo com dados da OMS, ao menos 1,15 milhão de pessoas morreram em decorrência da covid-19 em 218 países e territórios.

Em resposta à Agência Lupa, que também checou o vídeo analisado, o neurologista disse ter confundido os números de óbitos com os números de infectados. “O que deveria ter dito, e me confundi quando falei devido a muita informação e curto espaço de tempo, é que o número de infectados é quatro vezes maior, não o de óbitos”. disse Paulo Porto, em e-mail enviado ao veículo.

O Estadão Verifica também entrou em contato com o médico, mas ainda não recebeu resposta até a publicação desta checagem.

De qualquer forma, também não há dados consolidados sobre os números de novas infecções de HIV em 2020. A Unaids estima que até 2,2 milhões de pessoas tenham contraído a doença em 2019. O maior pico da série histórica de 1990 a 2019 ocorreu entre 1997 e 1998, com a estimativa máxima de até 3,7 milhões de novos casos, segundo o portal da entidade. O número de casos de coronavírus em todo o mundo ultrapassa a marca de 43,8 milhões.

O neurologista citou ainda que a quantidade de óbitos relacionados à fome no mundo é superior às mortes pela infecção do novo coronavírus. Em 2019, as mortes diárias associadas à crise alimentar contabilizavam 25 mil. Um relatório da Oxfam, com dados da ONU, publicado em julho, aponta que o impacto da pandemia do novo coronavírus pode agravar a situação e provocar mais 12 mil óbitos diários.

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Fonte: Estadão