A notícia de que uma mulher argentina controlou o HIV abaixo dos limites de detecção desde que interrompeu o tratamento antirretroviral, em 2007, devido a efeitos colaterais, está repercutindo entre especialistas brasileiros.

De acordo com pesquisadores de Buenos Aires e do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos, a mulher não tem mais anticorpos para o HIV. O grupo encontrou apenas um pequeno número de células contendo DNA do HIV quando fizeram testes intensivos em 2015 e 2017.

A portenha foi diagnosticada com HIV em 1996, aos 37 anos, e deu início ao tratamento. Em 1998, os exames comprovaram ela já tinha carga viral abaixo de 50 cópias. Ela mudou de tratamento várias vezes devido a dificuldades de adesão e perda de gordura, mas decidiu interromper a medicação definitivamente em 2007.

Sua última medição de carga viral indetectável foi relatada em fevereiro de 2020. Sua contagem de células CD4 permaneceu estável acima de 500 células.

“Este caso é inédito”, disse a infectologista Adele Benzaken, acrescentando que “ela não se submeteu a tratamentos de transplante de medula, que altera a resposta imunológica como o paciente de Berlim e de Londres. Entretanto, vi pouca divulgação do caso e a publicação não saiu em nenhuma revista de renome internacional como merecia.”

Dra Adele disse ainda que não encontrou explicações para o caso. Mas fez questão de enfatizar “que as pessoas vivendo com HIV não devem interromper seus tratamentos a luz desse caso específico que foi uma grande exceção, ainda sem explicações técnicas.”

Para a infectologista Zarifa Khoury, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, essa é uma paciente controladíssima. “O sistema imunológico dela conseguiu controlar o HIV. O que aconteceu com essa mulher é o que, nós médicos, queremos que aconteça com todos os pacientes com HIV. Ainda não temos todas as respostas, mas acredito que é possível comparar mais ou menos com o que acontece quando uma pessoa toma a vacina contra o vírus da hepatite B. Quando passa muito tempo e ela não tem uma reposta vacinal, a pessoa deve receber uma dose de reforço.”

A médica explicou que no caso da paciente de Buenos Aires, “a memória imunológica está esquecendo o HIV. Mas se ela tiver uma replicação viral, mesmo que pequena, imediatamente ela fica positiva. Ela não é considerada curada, é controlada.”

A infectologista Rosana Del Bianco, pioneira no acolhimento de pessoas com HIV/aids no Brasil, disse que o quadro da paciente de Buenos Aires a fez lembrar de uma pessoa com aids que ela atendeu no começo dos anos 1990, quando ainda não existia o coquetel antirretroviral. “Meu paciente desenvolveu muitas doenças oportunistas, como toxoplasmose e teve até paralisia. Ele tinha um acompanhamento persistente, tratávamos as infecções oportunistas e investíamos muito na profilaxia. Depois de um tempo ele começou a melhorar e ficou estável, foi até morar no interior de Pernambuco. Ficou por lá 5 ou 6 anos sem tomar nada. Depois voltou e teve uma reativação da toxoplasmose. Ele não está mais vivo, mas sobreviveu a aids por muito tempo sem medicação. Quando a gente vê essa paciente argentina, é impossível não lembrar da cura transitória. Existe alguma coisa, um equilíbrio imunológico, que para de agredir. Eu não sei explicar cientificamente, mas é algo que equilibra no organismo. No começo da epidemia, os pesquisadores diziam que 5% das pessoas com HIV não iriam desenvolver a aids, os chamados controladores de elite. Ainda temos muita coisa para descobrir”, relatou.

Assim como Dra. Adele, a especialista disse para as pessoas com HIV não abandonarem o tratamento. “As pessoas que tomam remédio têm uma sobrevida longa, meus pacientes estão comigo há mais de 30 anos. Estamos chegando a cura, mesmo que funcional”, finalizou Dra. Rosana Del Bianco.

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 Redação da Agência de Notícias da Aids

Dicas de entrevista

Dra. Adele Benzaken

E-mail: adele.benzaken@ahf.org

Dra. Zarifa Khouri

E-mail: zkhouri@prefeitura.sp.gov.br

Dra. Rosana Del Bianco

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