Na última sexta-feira, 13 de setembro, o Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP) promoveu a live “Direitos Humanos e Caminhos para a Cura do HIV”, transmitida pelo YouTube. O evento reuniu especialistas e ativistas em HIV/aids para explorar as recentes descobertas e desafios na busca pela cura do HIV. A discussão contou com a presença da infectologista Sandra Wagner Cardoso, da pesquisadora Luciana Kamel e do ativista e pesquisador Juan Carlos Raxach, que compartilharam suas perspectivas e conhecimentos sobre o tema. A mediação ficou a cargo da ativista Nair Brito, que conduziu as discussões e facilitou o diálogo entre os participantes.

A dra. Sandra Wagner Cardoso deu início à discussão com uma visão abrangente sobre o estado atual da pesquisa em HIV. Ela elucidou conceitos importantes como “controle pós-tratamento” e “cura funcional”. Embora a cura definitiva ainda seja um objetivo distante, a cura funcional é uma abordagem promissora que permite às pessoas com HIV controlar a infecção sem a necessidade contínua de terapia antirretroviral (TAR), ou seja, dos medicamentos, mesmo que o vírus permaneça no corpo.

Ela explicou também os conceitos de latência viral e rebote viral. “A latência viral ocorre quando o HIV se esconde e permanece inativo dentro das células do sistema imunológico. O rebote viral, por outro lado, refere-se ao aumento da quantidade de vírus no sangue após períodos de controle, geralmente resultante de uma interrupção ou falha na terapia antirretoviral.” Segundo a especialista, a compreensão desses fenômenos é crucial para o desenvolvimento de vacinas e terapias mais eficazes.

Durante sua apresentação, a infectologista citou exemplos recente de casos de cura, como o do “Paciente de Berlim”, que teve a infecção eliminada após um transplante de medula óssea. No entanto, ela enfatizou que esses casos são raros e que a maioria das pessoas ainda enfrenta desafios significativos, como a persistência do vírus em locais de difícil acesso e os efeitos colaterais dos medicamentos.

A médica também abordou a importância da participação ativa de todos, especialmente das comunidades afetadas, nos estudos sobre HIV. “Para que os estudos sobre HIV avancem de forma eficaz, é crucial que haja comprometimento e participação de todos”, afirmou a dra. Sandra Wagner. “O engajamento das pessoas, das comunidades, é essencial para o nosso progresso e para a conquista de avanços significativos na pesquisa.”

Ela concluiu sua fala enfatizando que “ser voluntário em estudos clínicos é muito mais do que uma experiência pessoal; é um caminho para transformar a vida das pessoas. O envolvimento e o comprometimento dos voluntários são fundamentais para alcançar novas soluções e melhorias no tratamento do HIV/aids.”

O papel da ativismo

A ativista e mediadora, Nair Brito, também destacou a importância da participação ativa da comunidade no processo de luta pela cura e contra o estigma associado ao HIV e à aids. “Até agora, discutimos muito sobre tratamentos e os efeitos colaterais tanto do vírus quanto dos medicamentos. No entanto, este é um momento crucial para ampliarmos nosso entendimento, não apenas para alimentar nossa esperança, mas também para fortalecer nosso ativismo. A aids representa e marca a parceria entre as pessoas vivendo com o HIV e a ciência”, ressaltou.

Participação comunitária em pesquisas clínicas

A pesquisadora Luciana Kamel, que estuda justamente a participação comunitária em pesquisas clínicas relacionadas ao HIV/aids, enfatizou a importância de adaptar as pesquisas às necessidades das comunidades. Kamel criticou a abordagem de “top-down” das pesquisas, onde decisões são tomadas sem considerar suficientemente as perspectivas das pessoas diretamente afetadas. Ela defendeu uma maior inclusão destas comunidades nos processos de pesquisa, especialmente de mulheres, desde o desenvolvimento dos protocolos até a execução dos estudos, para garantir que as soluções sejam relevantes e acessíveis. “Se a cura para o HIV for realmente aprovada, como será a demanda por ela? Quem vai se interessar em participar dos estudos e buscar a cura? Precisamos amadurecer essa discussão na comunidade, pois diferentes grupos terão reações variadas. Alguns podem estar ansiosos para obter a cura, outros podem ser aliados que apoiam a causa, enquanto alguns podem ser neutros ou céticos, duvidando da eficácia da cura. Entender essas diferentes perspectivas é importante para a gente orientar como abordamos e implementamos os avanços na pesquisa e no tratamento”, destacou a especialista.

Um ponto citado por ela, é a discrepância de acesso a medicamentos entre diferentes regiões do mundo, especialmente em países em desenvolvimento e menos favorecidos, como muitos na América Latina. “A maior parte dos estudos vem de cima para baixo, vem do norte para o sul, e às vezes a gente precisa estar adaptando às necessidades das comunidades.”

Desafios políticos e econômicos

Já o ativista Juan Carlos Raxach se concentrou em trazer à tona questões políticas e econômicas que permeiam a pesquisa e o tratamento do HIV. Raxach apontou que, apesar dos avanços significativos, ainda há um estigma social em massa atrelado ao HIV. Ele também criticou a falta de interesse político e econômico na cura universal, destacando o alto custo de novos medicamentos e a necessidade de uma abordagem mais equitativa.

“Quando discutimos a cura, é importante distinguir entre a cura funcional e a eliminação total do HIV. A cura funcional não remove o HIV do corpo nem elimina o estigma associado à condição. Mesmo com uma carga viral indetectável e zero risco de transmissão, o estigma persiste e continua a ser um problema. Isso não afeta apenas as pessoas que vivem com HIV, mas também os profissionais de saúde que muitas vezes não reconhecem ou não aceitam esses avanços”, comentou.

“Embora tenhamos feito muitos progressos desde os anos anteriores, o Brasil tem sido um exemplo positivo ao garantir acesso a medicamentos e diagnósticos para todos que vivem com o HIV desde 1996. No entanto, no cenário global, ainda enfrentamos uma batalha contra o estigma e a discriminação, que continuam a ser grandes desafios”, complementou e finalizou.

Assista a live na íntegra: 

Redação da Agência de Notícias da Aids

Dica de entrevista

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