No Dia Mundial da Saúde, Anaids sai em defesa do SUS e diz que “saúde não é comércio” – Agência AIDS

Foi ao ar nesta sexta-feira (7) uma reportagem do jornal O Estado de São Paulo que traz um levantamento sobre o corte de verbas do Ministério da Saúde, promovido pelo governo Jair Bolsonaro (PL) para reservar dinheiro ao orçamento secreto, em 2023.  A redução já atingiu 12 programas da pasta, entre eles o que distribui medicamentos para tratamento de aids, infecções sexualmente transmissíveis e hepatites virais. Somente nesta frente o ministério perdeu R$ 407 milhões, quando comparados os orçamentos propostos para 2022 e o ano que vem. Se somadas, as perdas de recursos nos 12 programas chegam a R$ 3,3 bilhões. (Leia mais)

Em entrevista a Agência Aids, representantes da sociedade civil disseram que o corte de verbas é inaceitável e representa o desmonte da política de aids no país.

A prática do orçamento secreto foi revelada pelo Estadão em uma série de reportagens. Com verbas distribuídas a redutos eleitorais de parlamentares, Bolsonaro espera agora o apoio de deputados e senadores na disputa do segundo turno contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O “Atendimento à População para Prevenção, Controle e Tratamento de HIV/aids, outras Infecções Sexualmente Transmissíveis e Hepatites Virais Total” faz parte da assistência farmacêutica no SUS. O dinheiro banca a compra, a produção e distribuição de medicamentos voltados para o tratamento de pessoas com HIV, como antirretrovirais, e demais doenças.

Desde os anos 1980, o País nunca conseguiu acabar com a epidemia causada pelo HIV. Houve registro de 1.045.355 casos de aids. Em 2020, 10.417 pessoas morreram da doença e o número total de vítimas chegou a 291.695. Os dados são do Boletim Epidemiológico Especial HIV/Aids de 2021, do governo federal.

Confira a seguir o que dizem os ativistas:

Alessandra Nilo, da ONG Gestos de Pernambuco: “Este corte é mais um absurdo do governo Bolsonaro. Ele tem feito cortes nas principais políticas, como para as mulheres, na assistência social, na educação e na saúde. São exatamente as áreas que mais deixa fragilizada a população brasileira. O governo está retirando recursos que são de promoção de direitos, recursos que são garantidos pela nossa Constituição Federal, para alimentar algo que é absolutamente inaceitável, o orçamento secreto. Se continuarmos com esse presidente no poder vamos seguir firmes e fortes para o caminho das trevas e do retrocesso. O que estamos vivendo no Brasil é um desmonte das políticas públicas, inclusive das políticas que foram referência e colocaram o país na ponta das respostas globais, como é o caso da política de HIV/aids. Total absurdo, nós precisamos reagir com muita força, isso não é aceitável.”

Eduardo Barbosa, coordenador do Mopaids (Movimento Paulistano de Luta Contra Aids): “O corte no orçamento para aquisição de medicações para o HIV representa para o enfrentamento desta epidemia que nos atinge a quase cinco décadas, um grande retrocesso. Depois de termos assegurado a garantia de melhor tratamento, através da Lei federal 9313, nos vemos ameaçados pela descontinuidade, pelo fracionamento e piora nos esquemas terapêuticos propostos. Bem como vemos cortes em investimentos em pesquisas que nos fez conquistar certa autonomia de fármacos internacionais. As conquistas que tivemos após 1996 estão ameaçadas por motivações político eleitoreiras, vinculadas a orçamento secreto e destinações duvidosas. Como pessoa vivendo com HIV, gestor público e ativista é inconcebível deixar isto passar. Já se mascarrou muito a situação de desmonte da política de aids no nosso país, seja por questões de fundamentalismo moral, religioso, seja por questões de ódio e repulsa ao diferente, ‘não sou despesa’ para o Estado, como disse o atual chefe da nação, contribuo, com trabalho e imposto.”

Fabiana Oliveira, do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas: “O que dizer mais de um governo que há quatro anos segue fazendo estragos? Indignação, tristeza, preocupação são sentimentos que tomaram conta de uma gigantesca parcela da população nos últimos anos. Vários setores importantes e necessários estão sendo atacados com cortes irresponsáveis e descompromissados – saúde, educação, habitação, assistência social, dentre outros.  Já posso vislumbrar o impacto desse corte na vida das pessoas com HIV/aids. Aliás, há muitos anos o HIV/aids vem sendo invisibilizado, medicamentos faltando nas prateleiras das farmácias, o estigma e discriminação que deveriam ter sido superados, têm sido reforçados e legitimado na sociedade por um governo que está na contramão da Constituição e dos Direitos Humanos. O movimento aids não pode se calar diante de mais essa barbárie. Precisamos voltar à luta nas ruas, resgatar nossa dignidade, liberdade, igualdade e justiça. Precisamos confrontar esse opressor. Precisamos lavar nossa alma e a esperança está nas urnas.”

Beto de Jesus, ativista pelos direitos humanos: “Estamos profundamente preocupados com o corte de mais de R$ 400 milhões no orçamento do Ministério da Saúde destinado ao tratamento de HIV/aids, hepatites virais e outras IST. Não é apenas uma simples perda de recursos, que pode, em tese, ser recuperada contando com a boa vontade de um Congresso Nacional que, no atual governo, acostumou-se com as verbas do orçamento secreto. Trata-se, a rigor, do risco iminente de prejuízos irreversíveis na saúde de milhares de pessoas. O Brasil, ou parte dele, ainda não se recuperou da perda de quase 700 mil pessoas para a covid-19, uma tragédia potencializada pela negligência e pelo negacionismo. Por isso, não deixa de ser chocante que estejamos lidando com mais uma ameaça concreta à saúde pública, pois o próprio governo sabe que 1 milhão de pessoas dependem do SUS para receberem os medicamentos antirretrovirais. É realmente estarrecedor. Só nos resta manter a esperança de que reste um fiapo de responsabilidade aos homens públicos deste país, principalmente aqueles que deveriam zelar não só pelos cofres públicos, mas pelo bem estar de toda a população.”

Márcia Leão, do Fórum de ONGs/Aids do Rio Grande do Sul: “Esses cortes na saúde só consolida o desmantelamento do SUS. O Governo Federal vêm reiteradamente sucateando o Sistema Único de Saúde e com isso os diversos programas. A aids que já passava por um processo de invisibilização, sendo apagada de diversas agendas, tanto de forma simbólica como efetiva, agora sofre de forma terrível. A possibilidade, hoje real, de faltar tratamento, quando a principal política adota é o testar e tratar, certamente causará prejuízos inenarráveis a resposta brasileira ao enfrentamento da aids e mais que isso, trará consequências diretas e dolorosas para as vidas das pessoas que vivem com o HIV e a aids. O governo Bolsonaro conseguiu, mais uma vez, mostrar como sempre se pode retroceder em uma política que já foi a melhor do mundo. Esperamos conseguir alterar esse cenário, pois pensar no que todos esses cortes na saúde, nas pesquisas e na educação representam é retirar a nossa esperança da construção de um País melhor. Esperamos que esse retrocesso acabe.”

Américo Nunes Neto, do Instituto Vida Nova: “Como se já não bastasse a Emenda Constitucional 95 (EC95) que congelou o recurso da saúde, nos deparamos agora com esse desmando ridículo de cortes de verbas na saúde e em outros programas. A aids sendo um dos pilares importantes do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo uma doença que requer uma política pública de saúde integral e que tem fortalecido o SUS, não escapou da insanidade avassaladora de Jair Bolsonaro, tendo como pano de fundo garantir o orçamento secreto. Outros programas também sofrerão com essa decisão que poderá acelerar agravos de saúde e mortes de brasileiros vulneráveis e pauperizados por falta investimentos em novas tecnologias de tratamento e prevenção. Enquanto outros países avançam no enfretamento da aids, o Brasil está na contramão das políticas sociais e de desenvolvimento em pesquisas. Estamos ficando distante cada vez mais para atingir as metas dos objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS). A implicação disso irá acarretar ainda mais na qualidade de vida das pessoas e nas despesas para o SUS, as pessoas com aids e outras comorbidades fatalmente vão superlotar o SUS a médio prazo com doenças oportunistas e outros agravos de saúde. Podemos mudar tudo isso, no dia 30 votando por uma política democrática que representa e que fortaleça o SUS, que fortalece. Por fim, espero que as pessoas com HIV/aids tomem consciência deste atual governo e votem 13.”

José Carlos Veloso, da Rede Paulista de Controle da Tuberculose: “Os constantes cortes de orçamentos no último ano do governo federal, evidencia o total descontrole da atual gestão, mais grave ainda quando os cortes estão diretamente relacionados a interesses eleitoreiros, ferindo todos os códigos de ética publica na gestão. Junta-se a isso a EC 95 com o teto de gastos, impedindo novos investimentos na saúde, educação e assistência social. Os programas de tuberculose, saúde mental, saúda da família, entre outros, já vêm sofrendo cortes anuais. O que está em jogo agora com o corte que vai atingir em cheio a compra de medicamentos para aids, é a qualidade de vida das pessoas vivendo com HIV/aids, é inadmissível esse retrocesso em todas as políticas públicas deste país. Se continuarmos com esse governo, corremos o risco de voltar a década de 70 em conceitos de saúde pública.”

Marta McBritton, presidente do Instituto Cultural Barong: “Esperar que o atual presidente tenha sensibilidade com as questões ligadas ao HIV para quem trabalha na área da saúde é como acreditar que a Covid-19 foi uma “gripezinha”. A questão é saber se a sociedade em geral sabe o que significa ser uma nação sem uma política de enfrentamento ao HIV robusta. Quantas gerações serão impactadas? OHIV se monitorado por meio de tratamento tende a se tornar indectável, permitindo que uma pessoa vivendo com HIV tenha qualidade de vida. Porém, qualidade de vida não passa somente pela administração de uma enfermidade crônica, ter qualidade de vida significa também viver sem medo de preconceitos, de julgamentos morais, sem receio que o medicamento X ou Y possa faltar e afins. Reduzir uma pessoa a um tratamento é uma política higienista. É aterrador pensar que estamos à beira de sacramentar o retrocesso. Precisamos de iluminar o orçamento secreto, antes que as pessoas deixem de brilhar. Esta força está em nossas mãos.”

 

Leia também: 

Estadão: Governo Bolsonaro reduz verba para tratamento de aids e protege orçamento secreto em 2023 

Em nota, Foaesp repudia cortes de verbas no Ministério da Saúde que atinge diretamente a política de enfrentamento ao HIV/aids

 

Redação da Agência de Notícias da Aids

Dicas de entrevista

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Tel.: (11) 2297-1516

Fórum de ONGs/Aids do Rio Grande do Sul

Tel.: (51) 3224-1516

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E-mail: redepaulistatb@yahoo.com.br

Instituto Cultural Barong

Tel.: (11) 94051-6448