Criado em 1986, o desenho virou um símbolo da importância da imunização e é aposta para melhorar a cobertura

Você conhece o Vacinildo? E o Defesinha? Mas é difícil encontrar um brasileiro que não conheça o Zé Gotinha, grande símbolo da vacinação e uma espécie de herói nacional.

Os nomes acima eram algumas das sugestões enviadas por cartinha para um concurso para batizar o mascote. Caminhonetes chegavam carregadas de envelopes ao Ministério da Saúde logo após a criação do desenho. Era mais uma prova de que ele havia conquistado corações em todo o país.

Zé Gotinha foi elaborado pelo artista plástico Darlan Rosa, em 1986, a pedido do ministério. O objetivo era dar cara à campanha de vacinação contra o vírus da poliomielite.

“Eu fui chamado para criar algo que convidasse os pais a levarem seus filhos para tomar vacina. Desde o começo pensei que queria algo com um design mais simples, para que fosse facilmente reproduzido por todos e que tivesse as crianças como protagonistas deste processo”, conta Rosa em comunicado do órgão. “Minha visão de fazer algo direcionado para as crianças ficou ainda mais forte quando fui para o Nordeste e percebi que as crianças tentavam fugir da vacina, além dos pais acharem que seria o imunizante que levaria a doença aos filhos. Havia uma série de desinformação a respeito.”

O desenho simples podia ser reproduzido não só pelos pequenos mas também pelos profissionais de Saúde dos postos de forma manual, numa época em que o material impresso não era tão acessível quanto hoje. No começo, Zé Gotinha não tinha detalhes no pezinho e na mão justamente para que fosse reproduzido por qualquer pessoa.

Inicialmente pensado para a campanha da pólio, passou a ser usado para conscientizar sobre a importância da prevenção pela vacinação de outras doenças, como, por exemplo, sarampo.

Akira Homma, assessor científico sênior de Bio-Manguinhos/Fiocruz, coordenador do Projeto Reconquista das Coberturas Vacinais e considerado um dos 50 nomes mais influentes do mundo na área de vacinas, lembra do impacto da chegada do Zé Gotinha.

— Nós temos uma cultura de vacinação no país que começou lá atrás, com Oswaldo Cruz. Mas o fato é que a vacinação de rotina não alcançava um patamar bom de cobertura até que, em 1979/80, teve epidemia de poliomielite. Então o governo criou os dias nacionais de vacinação. Mas havia uma falta de contato para levar as informações à população. Então veio o Zé Gotinha. Essa imagem facilitava o diálogo com as crianças, motivava as famílias, porque muitos pais, por falta de informação, tinham medo — conta.

Homma, de 83 anos, celebra o impacto de Zé Gotinha no passado e no presente:

— Era uma festa em todo lugar a que ele ia e isso está voltando. Estive no lançamento do Movimento Nacional pela Vacinação e ainda é uma festa. A presença do presidente Lula ajudou, mas a presença do Zé Gotinha ajudou muito mais. Ele realmente passa pro imaginário da população a importância da vacinação. É uma forma de transmitir a informação de forma lúdica e isso é necessário — defende.

Retorno triunfal

Após ter ficado um pouco escanteado nos últimos anos, o Zé Gotinha tem sido muito enaltecido pelo novo governo, como a face do Movimento Nacional pela Vacinação. Para a ministra da Saúde, Nísia Trindade, o desenho está enraizado no imaginário das famílias brasileiras e pode colaborar para a melhora da cobertura vacinal.

— O Zé Gotinha é o maior símbolo do nosso Movimento Nacional pela Vacinação. Meus filhos cresceram vendo o Zé Gotinha e meu neto agora também vê no Zé Gotinha um símbolo inspirador. Fazer o Zé Gotinha chegar a cada canto do Brasil é uma grande meta do Ministério da Saúde e prioridade da nossa gestão. Vamos levar esse grande movimento para todo o Brasil, para que o nosso país volte a ser referência mundial no tema — afirma a ministra.

A secretária de Vigilância Sanitária da pasta, Ethel Maciel, explica que o Brasil a chegou a ter mais de 90/95% de cobertura vacinal e, segundo ela, o país estava caindo para 50/60% de cobertura. A expectativa é que 2023 seja um ano de transição. Nesse sentido, a missão do Zé Gotinha é enorme:

— Ele éo símbolo da vitória da ciência. Nosso símbolo da vacinação no Brasil. Marcou muitas gerações que através do personagem se aproximaram do conceito da vacinação na luta contra as doenças e das tristes sequelas. Apesar de ter sido criado para a campanha contra a poliomielite, ele representa muito mais. Representa um dos maiores sucessos do Brasil no controle das doenças imunopreveníveis. O Zé gotinha é a vitória da vida! — diz Maciel.

Os especialistas reconhecem que há muito trabalho a ser feito para combater a desinformação, negacionismo e falsa sensação de segurança.

— Nos últimos anos, sem o Zé Gotinha, tivemos inúmeras campanhas, mas nenhuma atingiu a cobertura necessária. Não estou mais otimista, estou mais confiante. Mas ainda temos que trabalhar muito porque o Brasil é um continente e tem regiões com pouca estrutura de saúde. — afirma Akira Homma. — O Zé Gotinha é conhecido por todo o interior do país e leva a mensagem que vacinação evita doenças, problemas, sequelas e aumenta qualidade de vida, contribuindo para aumentar a expectativa de vida no país.

Fonte: O Globo