Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a saúde mental vai além do simples estado emocional de uma pessoa, abrangendo um amplo espectro de bem-estar que permite o desenvolvimento de habilidades individuais para enfrentar os desafios da vida e contribuir com a comunidade. Este conceito inclui não apenas aspectos psicológicos e emocionais, mas também fatores como saúde física, apoio social e condições de vida. A saúde mental é influenciada por diversos aspectos, desde individuais até sociais, ambientais e econômicos, destacando a interação complexa entre fatores biológicos, psicológicos e sociais. Portanto, compreender a saúde mental requer uma abordagem holística que leve em conta o contexto e os diversos aspectos que moldam a experiência humana. Segundo as Nações Unidas, uma saúde mental prejudicada aumenta o risco da pessoa se infectar com HIV, pois ela se coloca em situações de risco com muito mais frequência do que pessoas que não apresentam adoecimento psíquico.

Para as pessoas que já vivem com o vírus do HIV, uma boa saúde mental é crucial, pois contribui significativamente para sua qualidade de vida ao ajudar a lidar com o estigma, o estresse e os desafios emocionais associados à doença. Além disso, a saúde mental influencia diretamente na adesão ao tratamento antirretroviral, essencial para controlar a infecção a longo prazo, e melhora a capacidade de tomar decisões conscientes sobre a saúde, prevenção de infecções oportunistas e relacionamentos pessoais. É também imprescindível para a promoção do bem-estar emocional diante das adversidades e motiva a adoção de hábitos saudáveis e a busca por apoio, quando necessário, nos serviços de saúde.

Para a psiquiatra Dra. Valéria Antakly de Mello do Hospital Emílio Ribas de São Paulo, o maior desafio relacionado à saúde mental em pessoas que vivem com HIV, de fato, é evitar seu adoecimento psíquico. “A depressão e os trânsitos depressivos são bastante prevalentes na população em geral, mas principalmente em pessoas que vivem com doenças crônicas e com HIV, particularmente, a incidência aumenta muito, podendo chegar até a 50% de prevalência ao longo da vida das pessoas que vivem com HIV”, afirma.

O primeiro passo para evitar o adoecimento, segundo a médica, é reconhecer o estado de sofrimento psíquico e estar aberto para procurar ajuda, seja através da psicoterapia ou algum tipo de suporte social. Aliado a isso, “é importante manter uma boa alimentação, atividade física e práticas integrativas, como, por exemplo, meditação, yoga, Tai Chi Chuan e ou várias outras atividades que são consideradas práticas de redução de estresse” adiciona. “São exercícios que ajudam a lidar com situações de estresse do dia a dia e têm um fator protetor para o desenvolvimento de quadros de depressão e de ansiedade”.

Valéria Antakly de Mello, supervisora da equipe de psiquiatria do Instituto de Infectologia Emílio Ribas (Crédito: arquivo pessoal)

Grupos de acolhimento e ONGs de pessoas que vivem com HIV, além de uma boa rede de apoio, também são uma excelente maneira de colaborar para uma boa saúde mental. Segundo a Unaids, alguns princípios podem servir de inspiração para estabelecer diálogos positivos com pessoas vivendo com HIV que necessitam de cuidados mentais como encorajar a autoestima; estimular a autonomia das pessoas; respeitar as emoções e os sentimentos e promover o fortalecimento dos vínculos afetivos, sociais e comunitários.

Transtornos psiquiátricos, quadros depressivos e/ou dependência de substâncias psicoativas afetam drasticamente a adesão ao tratamento antiretroviral. Segundo a psiquiatra, para se ter uma boa adesão ao tratamento antiretroviral é necessário estar minimamente organizado mentalmente. “Sua saúde mental não pode estar muito comprometida, você não pode estar com um adoecimento psíquico mais intenso, porque se isso acontece você não consegue cuidar de si e, com certeza, você não consegue aderir ao tratamento para o HIV”, explica. Pessoas muito doentes mentalmente não têm condições psíquicas de ter uma boa adesão, pois esquecem de tomar os remédios, não têm ânimo para tomá-los ou, às vezes, até têm vontade de morrer e não tomam.

Entretanto, a Dra. Valéria Antakly de Mello faz um alerta existem algumas pessoas que são muito funcionais, que não têm um transtorno mental que comprometa o seu autocuidado e as suas atividades diárias, mas que não conseguem lidar com o diagnóstico. “Isso é um problema que a gente pode considerar de saúde mental, psicológico e emocional, pois pode comprometer a adesão aos antirretrovirais. A pessoa finge para ela mesma sobre o diagnóstico, não quer lidar com isso e, simplesmente, não faz o tratamento ou o abandona”.

Confira algumas dicas para manter uma saúde mental estável após o diagnóstico de HIV:

Busque apoio social: converse com amigos, familiares ou participe de grupos de apoio onde você possa compartilhar suas experiências com pessoas que entendem o que você está passando.

Fale com um profissional de Saúde Mental: terapia individual ou em grupo pode ser muito útil para lidar com os desafios emocionais associados ao HIV. Um profissional de saúde mental pode fornecer suporte e estratégias de enfrentamento.

Mantenha uma rede de apoio: cultive relacionamentos positivos com pessoas que o apoiem emocionalmente e estejam lá para você nos momentos difíceis.

Eduque-se sobre o HIV: quanto mais você souber sobre o HIV e seu tratamento, mais capacitado estará para gerenciar sua saúde mental. Isso pode ajudar a reduzir o medo e a ansiedade associados à condição.

Pratique autocuidado: faça atividades que promovam seu bem-estar, como exercícios físicos, meditação, hobbies que você goste, alimentação saudável e sono adequado.

Mantenha-se conectado com sua equipe de saúde: mantenha um relacionamento aberto e honesto com sua equipe de saúde, incluindo médicos, enfermeiros e conselheiros. Isso pode ajudar a garantir que você esteja recebendo o melhor tratamento possível.

Evite o isolamento: o isolamento pode piorar os sentimentos de solidão e depressão. Procure oportunidades para se envolver com outras pessoas e participe de atividades sociais que lhe tragam alegria.

Defina metas realistas: estabeleça metas realistas para si mesmo e celebre suas conquistas, por menores que sejam. Isso pode ajudar a manter uma atitude positiva e aumentar sua autoestima.

Evite o estigma: lembre-se de que o HIV é apenas uma parte de quem você é, não define sua identidade. Não deixe que o estigma associado ao HIV afete sua autoestima ou sua capacidade de buscar apoio.

Esteja atento aos sinais de alerta: esteja ciente dos sinais de alerta de problemas de saúde mental, como mudanças de humor, problemas de sono, isolamento social e dificuldade em cumprir o tratamento do HIV. Se você estiver enfrentando dificuldades, não hesite em procurar ajuda profissional.

Marina Vergueiro (marina@agenciaaids.com.br)

 

Dica de entrevista:

Dra. Valéria Antakly de Mello – valeriaantakly@uol.com.br