O produtor audiovisual, designer, escritor, desenhista, DJ, criador de conteúdo digital sobre HIV/aids e jovem vivendo com HIV, Rafael Roller, foi o convidado da coluna “Senta Aqui, com Marina Vergueiro”, da Agência Aids, nesta semana.

Nascido e crescido em Taubaté, interior de São Paulo, mudou-se para a capital paulista em 2012, aos 18 anos de idade. “Vim para São Paulo tentar novas coisas”, contou.

O diagnóstico de HIV de Rafael chegou em 2021; segundo ele, naquele contexto não tinha tanta consciência sobre a importância de se testar de forma regular para o HIV e outras ISTs. “Quando eu descobri, já estava com o CD4 bem baixo [que é a nossa imunidade] e carga viral alta.”

“Foi um baque muito grande […] eu estava com a saúde bem fragilizada e tive muito medo […] mas, o diagnóstico bateu de uma forma que queria falar sobre isso e estimular as pessoas a se testarem mais”, compartilhou.

Na live, ele acrescentou sua fala dizendo que esse trabalho de conscientização começou pelas pessoas mais próximas [família e amigos], posteriormente abriu então sua sorologia para as demais pessoas de seu convívio. “Eu queria escrever e usar de outros meios para falar sobre HIV.”

Ele ainda contou que essa exposição aconteceu logo que descobriu que vivia com o vírus e ficou indetectável (cerca de 3 meses após a descoberta do diagnóstico). “Era final da pandemia [de covid-19] e estava me sentindo sozinho […] meus amigos não deixaram de estar aqui e nessa época estava morando junto com uma namorada minha, ela foi a pessoa que me apoiou o tempo inteiro, mas o isolamento deixou tudo muito maior”, relembrou.

Foi então que Rafael soube da ONG GIV (Grupo de Incentivo à Vida), em São Paulo, e encontrou lá, segundo ele, um apoio valioso. Adentrar a instituição foi essencial, proporcionando-lhe suporte prático e emocional durante esse período desafiador de recém descoberta do HIV na sua vida.

“Me fortaleci conhecendo a história de outras pessoas vivendo com HIV […] e me senti forte pra jogar a conversa na roda. O GIV e as pessoas que conheci lá foram essenciais pra mim lidar com o diagnóstico.”

O convidado comentou que embora tenha recebido o apoio de todos, enfrentou o receio de compartilhar sua condição, principalmente com a família. A namorada, também solidária, descobriu o diagnóstico em casa ao lado dele. Apesar de que, segundo Rafael, contaria a sua companheira, não foi necessário, pois foi um momento compartilhado, recebendo a notícia juntos. Em seguida, o jovem escolheu reunir seus amigos em sua casa para contar a todos de uma vez. O apoio foi unânime, a maioria já estava informada sobre o assunto, tornando o impacto menos traumático, apesar de ainda estar emocionalmente abalado; mas, frisou que com o respaldo daqueles que ama, o processo tornou-se mais fácil. 

Rafael entende a dificuldade de se expor, compreendendo que esta não é uma decisão simples. Ele, que trabalha de forma autônoma, destacou que a sorofobia no mercado de trabalho formal não foi uma realidade para si. Destacou ainda que embora não tenha enfrentado discriminações mais diretas e violentas até aqui, alguns comentários de pessoas ignorantes já surgiram na internet, onde cria conteúdos sobre HIV/aids e divide um pouco de sua rotina e vivência positiva. Nesse sentido, reforçou a importância da educação e conscientização de forma contínua para combater o preconceito e estigmas.

Prevenção em relações não-monogâmicas

“Eu tento espalhar bastante a palavra da PrEP”, falou quando perguntado sobre prevenção no contexto do poliamor.

Rafael Roller se identifica como bissexual e não monogâmico, e é um incentivador da prevenção combinada, incentivando especialmente a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição ao HIV),  mas também reconhecendo a importância do preservativo, até mesmos para evitar outras ISTs (Infecções Sexualmente Transmíssiveis), em quaisquer arranjos relacionais.

“Eu gosto também de falar sempre que, se você vai se relacionar com uma pessoa com HIV é menos arriscado do que se relacionar com uma pessoa que não vive com HIV […] porque eu [por exemplo] vivo com HIV e estou sempre fazendo exames e no controle da minha saúde.”

“No passado, pra mim usar camisinha não era uma preocupação, mas hoje me preocupo muito em utilizar e as pessoas com quem me relaciono hoje se cuidam também.”

Nomadismo

O artista aproveitou a ocasião também para compartilhar sua fase nômade, que aconteceu no ano passado. Ele passou cerca de 6 meses se aventurando em conhecer diferentes destinos. A experiência foi possível por trabalhar remotamente; essa flexibilidade permitiu-lhe combinar sua paixão por viagens com a continuidade de suas responsabilidades profissionais. Entretanto, Rafael destacou que por ser muito apegado às pessoas que fazem parte de sua vida que estão em São Paulo, frequentemente retornava para casa. “Sou muito apegado às pessoas que estão aqui em São Paulo, então não consegui ficar os 6 meses direto viajando.”

Durante os trajetos, de acordo com ele, foi tranquilo dar continuidade ao tratamento de HIV – que deve ser diário -, justamente por dar pausas nas viagens não teve problemas com o seguimento de seu tratamento; apesar de que se fosse necessário, também poderia contar com o recurso de medicação em trânsito, retirando os medicamentos em qualquer lugar e à qualquer hora.

“Conheci muitas pessoas vivendo com HIV/aids nessas viagens, não sei se as atrai”, disse em torno descontraído.

Muitas delas moradoras de cidades pequenas, ele frisou que nestes locais a epidemia e a resposta são bem diferentes da realidade do cenário paulistano, mas destacou: “isso foi bom para perceber que, apesar de às vezes na cidade grande as coisas estarem mais pra frente, a gente precisa continuar lutando por condições melhores [para todos].”

Ao fazer o apontamento, o artista mencionou médicos preconceituosos que, por vezes, relutam em alterar o esquema de medicação, criando um ambiente de terrorismo psicológico. Ele destacou o preconceito ao afirmar que alguns profissionais insistem que o paciente não poderá mais ter relações sexuais sem preservativo, ignorando contextos individuais. “Às vezes a pessoa quer ter filhos”, exemplificou.

Histórias de amor

Em sua primeira passagem por Angra dos Reis, vivenciou uma história marcante de amor. Atualmente, mantém uma boa amizade com o ex-parceiro.

No mesmo período, Rafael também vivenciou outras histórias de amor casuais. “Sou um menino solto”, disse o sagitariano em tom descontraído.

Arte

Rafael trabalha em uma agência de publicidade, mas em paralelo toca uma carreira artística, escrevendo, ilustrando e se jogando em algumas produções audiovisuais. “Eu sempre gostei de arte e antes já trabalhava com isso, mas acho que o HIV me trouxe uma nova visão […] eu não tinha um propósito maior [na arte], até receber o diagnóstico de HIV.”

“Ainda estou me descobrindo artista, estou no começo da minha jornada.”

O artista, que também é escritor, participou da escrita conjunta do livro “Poéticas de Vida – Escritas de Si(da)”, um projeto do GIV. Também é autor colaborativo do segundo livro “Tudo que Deixei de Dizer em Voz Alta”. Além disso, tem um conto publicado no Kindle e atualmente, está em processo de escrita de mais uma obra, com previsão de lançamento em dezembro deste ano. 

Bisexualidade

Sobre sua orientação sexual, conta que o processo de se descobrir enquanto bissexual veio aos 15 anos. “Na época ainda morava no interior de São Paulo, mas quando me assumi lá, as pessoas passaram a me ler muito como gay, e isso é algo que acontece ainda hoje, inclusive.”

Ele continuou: “eu me questionava muito, as mulheres já não olhavam mais da mesma forma […] isso passou quando fui para a faculdade de humanas, porque lá ninguém se importa com isso.”

“Eu sofro invalidação até hoje por namorar uma mulher e um homem, falam que é como se eu  quisesse esconder alguma coisa ou que não quisesse me assumir gay […] bi vivendo com HIV é piada pronta para as pessoas, e não é isso, eu tenho uma vida. O fato de eu viver com HIV não tem nada a ver com o fato de eu ser bissexual, porque eu me cuido. Não sou vetor de IST!”, falou categoricamente.

Rafael está escalado para a próxima temporada da série televisiva Deu Positivo, que será lançada na emissora MTV, no próximo 1 de dezembro,  Dia Mundial de Luta Contra a Aids, e convidou todo mundo para acompanhar.

Assista o bate-papo na íntegra:

 Kéren Morais (keren@agenciaaids.com.br)

Dica de entrevista

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