A Frente Parlamentar de Controle de ISTs/HIV/Aids e Tuberculose da cidade de São Paulo, presidida pelo vereador Celso Giannazi (PSOL), realizou sua primeira reunião de 2023 na última quarta-feira (17). Organizações sociais e representantes de programas municipais de controle dessas doenças discutiram sobre as políticas públicas atuais e suas falhas.

Um dos problemas é a falta de notificação da população em situação de rua. “A gente não pode aceitar que a Prefeitura não tenha números sobre a saúde da população em situação de rua. Como vamos desenvolver uma política séria e eficaz? É muito preocupante”, criticou o parlamentar.

O coordenador-adjunto de IST/Aids da Secretaria Municipal de Saúde, Robinson Fernandes de Camargo, apresentou um panorama sobre a situação dos casos na cidade. De acordo com ele, o boletim de 2021 mostra que, no geral, desde 2017 houve queda sustentada na taxa de detecção por HIV de pessoas acima de 15 anos.

O maior número de pessoas infectadas na capital se concentra em HSH (homens que mantêm frequentemente ou esporadicamente relações sexuais com outros homens, independente de terem identidade sexual homossexual) e homens na faixa etária entre 20 e 29 anos de idade.

Robinson também mostrou as taxas de infecção por supervisão técnica. De 2012 a 2021, Sé e Santa Cecília concentraram mais notificações de casos de HIV, seguidas pelas regiões de Vila Mariana, Jabaquara, Casa Verde e Cachoeirinha. De 2014 a 2021, a proporção de gênero foi de cinco homens infectados para uma mulher.

Sobre a população em situação de rua, o coordenador municipal de IST/Aids afirmou que há uma parceria com o Consultório na Rua, instituído pela Política Nacional de Atenção Básica em 2011 para ampliar o acesso deste grupo populacional aos serviços de saúde. Ele apontou que este atendimento é importante para quem não consegue acessar o SAE (Serviço de Assistência Especializada em HIV/Aids), mas que mesmo assim parte desta população abandona o tratamento.

“As equipes do Consultório na Rua têm autonomia para manejar o paciente e suas medicações, sendo aptas para levar o paciente a unidade de saúde ou prestar o atendimento ali na rua. Esses profissionais podem fazer acompanhamentos de medicações e tratamentos.  A equipe realiza coletas de exames de carga viral, que são direcionados para o laboratório. Em casos de perda ou roubo da medicação, o paciente consegue retirar novos medicamentos através da equipe do consultório na rua ou dos polos de atendimento. Infelizmente, ainda não temos números exatos de pacientes em situação de rua que são assistidos pelos serviços de saúde, é uma discussão que precisa ser feita com o Ministério da Saúde”, lamentou Robinson.

O consultório na rua

Em São Paulo, o programa Consultório na Rua, uma parceria entre a prefeitura e o Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto (BomPar), atende a população em situação de rua na cidade, considerando as características de cada pessoa, sua vulnerabilidade social e de saúde. São 26 equipes do Programa, distribuídas nas seis Coordenadorias Regionais de Saúde do município.

As equipes fazem abordagens, trabalho de desenvolvimento de vínculos, cadastramento, consultas, curativos, medicações e outros procedimentos. O Consultório na Rua realiza também ações exclusivas para vacinação.

Cada equipe é formada por médico, enfermeiro, assistente social, psicólogo, auxiliar de enfermagem, agentes de saúde, agentes sociais, um administrativo e um motorista. Os agentes de saúde atuam de forma diferenciada, já que todos são regressos da situação de rua.

O trabalho é realizado em três turnos, de manhã, à tarde e à noite. Os problemas mais comuns detectados na população de rua são tuberculose, hipertensão, diabetes, infecções sexualmente transmissíveis, dependência química e transtornos mentais.

A coordenadora do Mopaids (Movimento Paulistano de Luta Contra a Aids), Patrícia Perez, criticou a invisibilidade da população em situação de rua para o Poder Público. “Não acredito que as pessoas deixem de se tratar por vontade e sim por não ter alimentação, moradia, trabalho, não ter dinheiro para pegar ônibus e acessar o serviço. Então são questões sociais que impõem barreiras de acesso ao tratamento”, explicou.

População LGBTQIA+

Thais de Azevedo, presidente do Grupo Pela Vidda São Paulo, de assistência a pessoas LGBT e vivendo com HIV, aproveitou a audiência pública para chamar atenção para a importância do cuidado em saúde integral para a população LGBTQIAP+.

“As pessoas trans têm uma dificuldade muito grande de representatividade, ninguém quer aparecer quando o tema é aids, precisamos entender que o HIV é uma infecção sexualmente transmissível. Muitas pessoas trans são profissionais do sexo e estão nas ruas, mas estão lá para trabalhar.”

Ela acredita que é preciso reforçar a educação sexual em casa e nas escolas para que a sociedade aprenda a respeitar as pessoas trans. “As pessoas trans se afastam do sistema de saúde por falta de respeito das pessoas, desde a pessoa da faxina, ao enfermeiro e médico que não nos reconhece acintosamente, impedindo um tratamento adequado que poderia dar qualidade de vida e reduzir a contaminação”, explicou.

A co-deputada estadual pela Bancada Feminista do PSOL, Carolina Iara, participou da discussão e acrescentou na fala da Thaís que a população LGBTQIA+ é vulnerável e precisa de atenção. “Enquanto a gente não tiver uma política afirmativa para as populações mais vulneráveis da nossa sociedade não vamos conseguir avançar, se nós não conseguimos colocar nas pastas e nem nos orçamentos a população LGBTQIA+, como vamos adicionar a população de rua? Como avançamos se nem o básico conseguimos fazer?”

O conselheiro municipal de Saúde, Walter Mastelaro, coordenador da Comissão de Aids e ISTs e da População em Situação de Rua, ressalta que é imprescindível tratar da saúde dessa parte da população de forma integral. “A política de saúde acaba não sendo efetiva na prática porque não consegue coletar dados e sem os dados não há aprimoramento das políticas e também porque não garante a saúde integral, que seria garantir moradia, alimentação e qualidade de vida”.

Representando a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, Luiza Murakami disse na reunião que em São Paulo o poder público tem apostado no acordo entre o SUS (Sistema Único de Saúde) e o SUAS (Sistema Único da Assistência Social) para acolher e atender a população em situação de rua.

“Junto com a saúde e outras secretarias estamos criando um plano de trabalho, as reuniões já têm acontecido. No próximo mês, estamos pensando na criação de uma oficina onde chamaremos a sociedade civil e o movimento social para debatermos a temática, contamos muito com a experiência de todos para subsidiar a construção dessa política pública de uma forma integrada, garantindo que a população em situação de rua seja contemplada”, enfatizou.

Tuberculose é prevalente na população de rua

A coordenadora do Programa Municipal de Controle da Tuberculose, Rachel Russo Leite, mostrou a situação da doença na capital e a rede de atendimento especializada. Segundo ela, o boletim lançado em março de 2023 mostra o aumento de pessoas doentes com tuberculose na região central da cidade e a prevalência na população em situação de rua, em especial pretos e pardos. “Há um tratamento supervisionado com medicamente para este grupo populacional no Consultório na Rua”.

“Na população em situação de rua, 15% das pessoas que vivem com TB têm HIV, esta população tem 56x mais chances de ter um AVC, conseguimos classificar assim porque usamos um sistema próprio do Estado e não o sistema nacional. Para os pacientes que querem fazer o acompanhamento diário durante a medicação de TB, é só se dirigir à equipe do consultório na rua. Aqueles que não querem, a equipe disponibiliza a medicação semanalmente. As principais ações dentro dessa população é a busca de sintomáticos respiratórios, pela vulnerabilidade em que eles vivem, precisamos agir com rapidez. Tossiu, já colhemos o exame de escarro”, contou.

Até o final de abril de 2023, houve o registro de 2.182 casos da doença. “A população economicamente ativa, de 20 até 60 anos é a mais afetada, com maior prevalência em pardos e pretos. Ao longo do tempo houve redução de casos em brancos”, destacou.

“Interessante que com a TB conseguimos ter esse mapeamento, será que é porque a tuberculose é uma doença milenar? Vamos ter que esperar que a aids dure mil anos para conseguir mapear?”, questionou a ativista Patrícia Peres.

Brasil integra ação da OMS contra hepatites virais

A coordenadora do Programa Municipal de Hepatites Virais, Celia Regina Cicolo da Silva, informou que o Brasil é signatário da proposta da OMS (Organização Mundial da Saúde) de eliminação das Hepatites Virais B e C como problema de saúde pública até 2030, reduzindo as novas infecções em 90% e mortalidade em 65%. “Como a doença é assintomática, só detectamos por meio de exame sorológico”, esclareceu.

Como estratégia de enfrentamento, a coordenadora afirmou que no caso da Hepatite B não há cura, é preciso baixar a carga viral, mas existe prevenção com uma vacina eficaz. Já a hepatite C não tem vacina, mas tem tratamento eficaz que leva à cura em mais de 95% dos doentes.

Para assistir a reunião completa acesse o vídeo abaixo:

Gisele Souza com informações (gisele@agenciaaids.com.br)

Dica de entrevista

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Tel.: (11)  3396-4305

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