É impossível ver os dois primeiros desse pódio e não se lembrar da lista de países com o maior número de mortes por covid-19 ao longo dos últimos dois anos. No entanto, é preciso pontuar que o surto de monkeypox Vírus se iniciou há apenas cerca de 5 meses.

No mundo todo, já foram registrados em torno de 65.000 casos e 19 mortes causadas pela doença. No Brasil, quase metade dos casos foram notificados no estado de São Paulo, mas já é possível visualizar tanto uma redução das infecções na capital paulista, quanto o aumento no interior do estado e nas demais unidades da federação.

Será esse fenômeno um prenúncio de que o fim do surto de monkeypox está próximo? Ninguém pode prever os caminhos evolutivos que esse vírus vai tomar, mas em uma coisa todos os virologistas concordam: nunca antes na história o monkeypox vírus circulou tanto e interagiu com tantos e diferentes seres humanos.

Circulação viral, pensando do ponto de vista da evolução virológica, pode ser ruim para nós humanos. Um vírus que se replica muito é aquele que mais tem mais chances de alterar seu genoma. Isso pode ocorrer, por exemplo, por meio de mutações ou por perdas genéticas. Essas modificações são formas de adaptação viral ao ser vivo que está infectando, e o impacto dessas alterações na sua transmissibilidade ou na gravidade da doença que causa é sempre uma incógnita.

Um exemplo que certamente está fresquinho na memória de quem leu até aqui é a variante ômicron do SARS-CoV-2. Foi só depois de algum tempo e do surgimento de algumas variantes virais que ocorreu o acúmulo de mutações específicas, capazes de melhorar, e muito, a transmissão da covid-19. Com a chegada da variante ômicron, a pandemia de covid-19 teve sua onda com o maior número de casos.

Ninguém, no entanto, precisa agora se desesperar pensando que com a chegada da variante X do monkeypox vírus o planeta inteiro ficará doente. Os próprios virologistas nos tranquilizam lembrando que os vírus com DNA no seu material genético, como o monkeypox, têm um genoma muito mais estável e menos propenso a alterações genéticas do que os vírus com RNA, tais como o SARS-CoV-2 ou o HIV.

Por outro lado, mesmo os fenômenos menos prováveis ainda podem acontecer. Virologistas estudiosos de poxvírus acreditam, por exemplo, que o vírus causador da varíola humana (smallpox) circulou por muito tempo entre os seres humanos de forma inofensiva, mas foi modificando aos poucos seu genoma, perdendo entre os séculos 5 e 17 uma série de genes, e se tornando enfim o vírus mais agressivo transmissível que conhecemos no final do século 20.

Da mesma forma, o monkeypox também já começou a mudar seu genoma. Em estudo recente, pesquisadores reportaram ter identificado no surto atual cepas europeias de monkeypox vírus com genes ausentes ou duplicados, em comparação com o genoma do monkeypox original, isolado em 1958.

Se essa variação genética é responsável por alguma alteração no ciclo replicativo do monkeypox, na sua infectividade ou na gravidade da doença que causa, ainda é cedo para concluir.

Uma coisa é inegável: a evolução genética dos vírus acontece querendo nós humanos ou não, principalmente quando eles estão se replicando intensamente numa população sem qualquer tipo de imunidade protetora.

Tudo indica que esse vírus ainda vai passar muito tempo entre nós. Deixar uma epidemia rolar livremente para ver o que acontece, pode não terminar bem. Assim, enquanto no mundo não houver amplo acesso à vacinação contra o monkeypox, nos restará torcer pelas boas mutações genéticas.

Fonte: Viva Bem (UOL) / Coluna Rico Vasconcelos