Se você acha que com a chegada do surto mundial de monkeypox —também chamada de varíola dos macacos— ao Brasil teremos que percorrer todas as etapas de enfrentamento de uma nova pandemia, igual ao que vivemos com a covid-19, você está muito enganado.

No início da pandemia de covid-19, dispúnhamos, como medidas de prevenção, apenas de estratégias comportamentais, tais como isolamento social e uso de máscaras. No entanto, foi somente com a chegada das vacinas contra o coronavírus que vimos os números começarem a melhorar.

No caso do monkeypox, estamos entrando nessa corrida muitas voltas à frente e não precisaremos recorrer apenas às limitadas medidas comportamentais. Já existem não só uma, mas duas vacinas que se mostraram eficazes em induzir proteção contra esse vírus.

Na verdade, as duas são vacinas que miraram a varíola humana (smallpox), doença considerada erradicada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) em 1980. Mas, felizmente, entre os vacinados ocorre a produção de anticorpos neutralizantes capazes de proteger também contra o monkeypox.

A primeira das vacinas, conhecida como ACAM2000, é uma versão moderna da vacina que ajudou na erradicação da varíola humana no passado. Trata-se de uma vacina que contém um vírus vivo chamado vaccinia, do mesmo gênero que o smallpox e o monkeypox. Depois de aplicado em uma pessoa, o vaccinia vírus vai se replicar sem causar doença, mas induzindo a produção de uma resposta imune protetora contra os três vírus.

Diferente das vacinas a que estamos acostumados, que utilizam seringas e agulhas na sua aplicação, a ACAM2000 é administrada com a utilização de um dispositivo com múltiplas agulhas que perfuram a pele do braço diversas vezes para inocular o vírus. De forma mais ou menos semelhante à vacina BCG, aplicada em todos os recém-nascidos do Brasil deixando aquela cicatriz característica no braço direito por toda a vida.

Por ser uma vacina de vírus vivo, a ACAM2000 é contraindicada para indivíduos imunossuprimidos devido ao risco de provocar quadros clínicos mais graves.

A outra vacina, conhecida como vaccinia ankara modificada (MVA – Modified Vaccinia Ankara, em inglês), contém o mesmo vírus vaccinia, mas aqui depois de ser enfraquecido em laboratório para deixá-lo incapaz de causar doença grave, mesmo em imunodeprimidos. Além disso, sua aplicação é feita da forma habitual.

Além de ser mais segura, a MVA tem mais doses disponíveis no mundo, ainda que não sejam muitas. Até agora, apenas países como os Estados Unidos, Reino Unido, Canadá e Alemanha iniciaram a aplicação de doses da MVA com o objetivo de conter o surto atual de monkeypox.

No início do surto, os Estados Unidos estavam recomendando a imunização com a MVA somente para quem tinha exposição ocupacional ao vírus, como profissionais da saúde ou do laboratório envolvidos no atendimento de pacientes com monkeypox.

A partir do final de junho, passaram a indicar a vacina também para os homens gays e bissexuais moradores das localidades com maior circulação do vírus e que tivessem critérios de maior vulnerabilidade a ISTs (infecções sexualmente transmissíveis), tais como maior número de parcerias sexuais e antecedente de ISTs.

Essas vacinas, em geral, são aplicadas antes de uma infecção por monkeypox vírus para proteger o vacinado. Mas podem também ser utilizadas como Profilaxia Pós-Exposição para proteger as pessoas que tiveram contato próximo com uma pessoa diagnosticada com a doença.

A OMS não recomenda, até o momento, a vacinação em massa da população contra o monkeypox vírus. Na verdade, nem haveria doses suficientes dessas vacinas no mundo para tal.

Diferente disso, usar as poucas doses que temos disponíveis de forma racional para priorizar a imunização dos grupos mais vulneráveis e dos contatos próximos de casos confirmados, pode ser uma maneira de, com poucas doses da vacina, conseguir um controle eficiente do surto.

No Brasil, ainda não temos nem mesmo um fluxo inteligente de notificação e diagnóstico dos casos suspeitos. A página criada pelo Ministério da Saúde para divulgar dados do surto no Brasil não é atualizada há mais de uma semana e, ainda por cima, nenhuma das duas vacinas contra monkeypox tem registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Quando vemos a situação do monkeypox no Brasil, infelizmente a única coisa que vai bem é a disseminação do vírus na população.

Fonte: Viva Bem (UOL) / Coluna Rico Vasconcelos