Com 139 anos de história e um ícone no combate às epidemias que já afetaram e ainda atingem o Brasil, o Instituto de Infectologia Emílio Ribas pede socorro. Cansada de ver a falta de recursos mínimos para atender seus pacientes com dignidade, como luvas e antissépticos, a médica Marianna Lago criou uma mobilização para salvar o hospital: coletou 226 mil assinaturas em uma petição para salvar o instituto. Na última quarta-feira, 5, a infectologista entregou os apoios do abaixo-assinado à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
“Estamos trabalhando em condições desumanas, na sujeira, com papelão nos pisos, sem remédios essenciais, como: dipirona, sulfa e até antissépticos!”, desabafa a médica no texto da petição criada por ela. “Leitos de internação foram fechados e o setor de patologia (essencial para diagnósticos) está em processo de fechamento por falta de funcionários. Estamos sendo ignorados pela Secretaria da Saúde do Estado e precisamos de ajuda!”, completa Marianna.
Há oito anos trabalhando no instituto, onde foi residente, a infectologista diz que a situação nunca esteve pior. “A gente não vem tendo leitos, faltam muitos medicamentos, tem vezes que a gente não tem nem antisséptico, nem luva para poder atender os pacientes”, detalha a médica, contando que criou o abaixo-assinado com o objetivo de chamar atenção do Governo Estadual para as péssimas condições que o hospital se encontra e para conseguir recursos.
Marianna entregou as assinaturas da petição ao deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL), durante uma audiência pública solicitada pelo parlamentar para cobrar do Governo do Estado respostas quanto ao futuro do Emílio Ribas. “A gente está aqui na Assembleia Legislativa para discutir qual vai ser o futuro e o que o Governo do Estado quer para o nosso hospital, se será terceirizado ou se vai continuar um ícone como sempre foi no combate às epidemias”, enfatiza a médica.
Reforma em atraso e problemas
A infectologista, que é médica há 10 anos e sempre sonhou em atuar no Emílio Ribas, explica que os problemas se acumularam devido a uma obra de ampliação e reforma iniciada em 2014 e adiada diversas vezes. “A gente passa por uma reforma que já vem em atraso, que está danificando o hospital. Ela é importante, mas também é importante a gente ter leitos e ter recursos para poder atender os pacientes e combater as principais epidemias que o Brasil vem passando, como, por exemplo, a febre amarela nos últimos anos e a dengue”, destaca.
Com previsão inicial de término para 2016, a reforma aumentou em valores e se arrasta sem conclusão até hoje, com novo prazo de finalização para 2022. Por conta das obras, leitos regulares e de UTI foram reduzidos, levando os médicos a atenderem pacientes nos corredores do instituto. Durante a audiência pública, profissionais que integram o Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp) falaram sobre esses problemas. A reforma já consumiu R$ 160 milhões de reais e está com gasto estimado de mais R$ 40 milhões até o fim.
Outro ponto que preocupa os funcionários do hospital é que, apesar de a obra prever o aumento do número de leitos de 120 para 250, concursos públicos não são abertos para atender a demanda, é o que explica a médica Luciana Marques, presidente da Associação dos Médicos do Instituto de Infectologia Emílio Ribas (AMIIER). “A gente vive uma crise de saúde pública no Estado. Não tem contratações, não há concursos públicos. Houve decretos do [ex-governador Geraldo] Alckmin proibindo concursos e a gestão atual também não é a favor de concursos públicos. Quem vai trabalhar nesse hospital?”, questiona.
Luciana ressalta que os profissionais do instituto estão aposentando e saindo. Comenta, ainda, que as carreiras dos médicos não evoluem, já que, segundo ela, os salários continuam os mesmos há mais de 6 anos. “A gente não consegue saber o que vai acontecer no futuro”, diz.
Os médicos participaram da audiência com o objetivo de buscar apoio para que as obras e a administração do hospital sejam fiscalizadas. O deputado Carlos Gianazzi informou que ouvirá servidores públicos, pacientes e médicos, para depois levar a questão às instâncias cabíveis, como Tribunal de Contas, Ministério Público e à Comissão de Saúde da Alesp.
Profissionais que ainda trabalham ou já atuaram no hospital se juntaram à mobilização e assinaram a petição, deixando comentários que ressaltam a importância do Emílio Ribas, como Elisabete Inglesi, que foi assistente social no local. “No Ribas aprendi a não parar de me indignar com o descaso e a lutar pela saúde de todos por igual. Não só referência para o Brasil, o Ribas foi a vanguarda e sempre será referência para o mundo no tratamento das pessoas portadoras do HIV ou já com aids”, postou na página do abaixo-assinado.
Em abril, médicos e funcionários fizeram um protesto em frente ao instituto de infectologia contra o “sucateamento” do hospital.
Fonte: Catraca Livre