Dando início à série de lives especiais sobre os 40 anos de HIV, a diretora da Agência Aids Roseli Tardelli recebeu nessa terça-feira (2) Beto de Jesus, country manager da AHF Brasil; Jair Brandão, assessor de projetos da ONG Gestos; e Veriano Terto, vice-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA).

Como tantos outros nomes importantes que já passaram pela Live  às Terças, os três são veteranos e pioneiros do movimento social de aids, e abriram caminho para muitos outros que vieram depois. Na pauta do bate-papo, o impacto da aids na comunidade LGBTQIA+, uma vez que, além de ativistas, eles são homens gays.

Roseli abriu a conversa comentando que o primeiro de dezembro, Dia Mundial de Luta contra a Aids, se aproxima e que, “apesar de falarmos de HIV/aids o ano inteiro, a mídia só descobre que a gente existe no primeiro de dezembro”.

“E um dos efeitos negativos do primeiro de dezembro, mas é um efeito adverso pequeno. De qualquer maneira, essa época tem efeitos mais interessantes da gente pensar e discutir. Acho que, de qualquer maneira, o estímulo à solidariedade nesse período, talvez a gente não conheça depois do dia primeiro, mas a gente espera que fiquem alguns estímulos, alguns exemplos, que a gente possa falar mais do nosso trabalho e que ele possa ser replicado, referenciado”, complementou Veriano.

Foram exibidas algumas imagens de notícias antigas do início da pandemia de aids que falavam de “doença nova” e “câncer raro” que atacava homossexuais. Roseli ressaltou que essas notícias vieram a construir um imaginário equivocado de aids. “Faltou pergunta, como assim um câncer que só dá em gay, uma doença que só dá em grupo de risco? Eram o que traziam as evidências científicas naquele momento. Faltou perguntar mais. Por que que a gente errou tanto?”, questionou a jornalista.

“A gente ainda está desconstruindo isso, mas não tem jeito. A sociedade ocidental é paranoica e essa paranoia envolve a homossexualidade. Ela é paranoica com tudo que foge do padrão heterossexual dominante. Quando a aids surge, a gente revê isso. Por que a gente errou? Porque a gente está dentro dessa cultura, que é paranoica em relação a sexo, à homossexualidade especificamente. Acho que na cabeça de algumas pessoas, até as mais progressistas, finalmente chegou um castigo, algo pra deter essas bichas tresloucadas que vinham desde os anos 70 na revolução sexual mostrando que era possível existir de outro jeito,” respondeu Veriano.

Para Beto de Jesus, existe uma questão importante que é o juízo de valores e a moral que se estabelece em relação às práticas sexuais. “Eu ser um homem gay não me faz pior que o meu irmão que é um homem heterossexual e um homem heterossexual não é melhor do que eu. Tem essa questão do pecado de como as igrejas utilizaram e ainda hoje utilizam  isso, É de uma perversidade muito grande, um peso que fica muito forte para as pessoas. Para além da questão da doença, do HIV, os homossexuais vêm sofrendo ao longo da história situações muito complicadas, seja por parte das próprias famílias, seja por parte dos espaços onde trabalham, estudam…As travestis não conseguem estudar, são expulsas de casa. Você já tem aí situações bastante complicadas de outros estigmas , de culpas que se colocam sobre essas pessoas que querem viver uma sexualidade não normativa. A medicina é uma área que deveria ajudar muito a gente, mas quando ela se apossa da nossa sexualidade,  começa a fazer horrores também, a agir de uma fora que não é correta, buscando causas de uma homossexualidade biológica. Não é uma patologia, a patologia é você ter preconceito contra essas pessoas, querer matar essas pessoas, não querer que essas pessoas sejam felizes, é você querer determinar como vai viver essas pessoas. Isso é patológico,” pontuou.

Jair relatou que conheceu o HIV no final da primeira década da pandemia e para ele a questão da sexualidade pesou muito para ele, depois que descobriu. “Do início da segunda década pra hoje, a imagem que eu tenho é aquela revisa Veja, que eu nunca esqueço: ‘Cazuza agoniza em praça pública’. Aquilo ali me marcou muito, porque não tínhamos campanhas ainda, não tínhamos insumos de prevenção, não tínhamos antirretrovirais também nesse momento, O que tínhamos era só a informação, pegou aids vai morrer no outro dia. Ali eu iniciei a minha sexualidade e ao mesmo tempo eu tive que parar ela também. Isso também foi uma questão complicada pra mim como jovem, com dezoito anos de idade naquele momento. Hoje, a gente tem uma gama de insumos, de tecnologia de prevenção e a gente está tendo que voltar no tempo para dizer o que eu não tinha e o que vocês têm hoje e por que não aproveitam tudo isso”, concluiu.

Assista abaixo a live na íntegra.

Redação Agência de Notícias da Aids

 

Dica de Entrevista:

Beto de Jesus

E-mail:  beto.jesus@aidshealth.org

Veriano Terto Jr.

E-mail: verterto@abiaids.org.br

Jair Brandão

Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero

Tel.: (81) 3421-7670