Enfrentamento ao estigma e preconceito contra as pessoas vivendo com HIV/aids, à desigualdade racial, de classe e gênero foram questões amplamente discutidas pela médica sanitarista Maria Clara Gianna na 16º edição do Hepatoaids, que chegou ao fim nesse sábado, em São Paulo.

Depois de mais de 30 anos à frente do Programa Estadual de DST/Aids e do Centro de Referência e Treinamento em IST/Aids de Santa Cruz, atualmente a profissional compõe a equipe do Departamento de HIV/Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis, do Ministério da Saúde. Coube a convidada representar e dividir os esforços do governo federal para o alcance da meta do Unaids que prevê até 2030 erradicar a aids, a tuberculose, as hepatites virais, a malária, doenças tropicais negligenciadas e outras ISTs (Infecções sexualmente transmissíveis) enquanto ameaças à saúde pública global.

Dra. Maria Clara iniciou sua contribuição destacando que o fim da epidemia de aids no Brasil requer uma resposta multisetorial. E para isso, a gestora reforçou a importância da estratégia I=I (Indetectável é igual a Intransmissível), mas frisou que garantir a qualidade de vida às pessoas vivendo com HIV se sobrepõe à supressão viral destas pessoas.

Segundo ela, a cascata do cuidado precisa ser olhada com seriedade de acordo com as respectivas demandas de cada indivíduo e seu contexto de vida.

“Estou há apenas dois meses no Departamento, mas vi que cada estado vive uma realidade diferente quando o assunto é HIV/aids. Precisamos considerar isso para que a gente não deixe, de fato, ninguém para trás”, disse.

“Qualidade de vida é a nossa busca e queremos falar cada vez mais disso. Reduzir a mortalidade das pessoas vivendo com HIV/aids e com a coinfecção, ampliar, fortalecer diagnóstico, tratamento, a vigilância do HIV, das hepatites virais, das ISTs e micoses endêmicas, essas são prioridades do Departamento”, destacou.

Segundo a gestora, as prevalências já conhecidas que acometem a população de travestis e transexuais necessitam de um trabalho mais integrado e efetivo. De igual forma, esse trabalho deve atingir as mulheres profissionais do sexo, gays e homens que fazem sexo com homens, usuarios de drogas injetáveis e pessoas privadas de liberdade.

“Essas populações prioritárias exigem trabalho, diálogo e verificação especial, considerando sua maior vulnerabilidade e exposição ao HIV”.

O Brasil nas estatísticas

Dra. Maria Clara ainda lembrou que hoje as estatísticas oficiais apontam para mais de 1 milhão de pessoas vivendo com HIV/aids no país, destas 700 mil estão em tratamento com terapia antirretroviral, mas por outro lado, mais de 100 mil vivem com o vírus e não sabem.

De acordo com a palestrante, ainda existe no país um número considerável de pessoas diagnosticadas com HIV, mas que não estão em tratamento. “Precisamos melhorar, precisamos incluí-las imediatamente”, alertou.

Também fez questão de relembrar que quando falamos de gênero, isso se potencializa. “As mulheres apresentam piores desfechos em todas as etapas do cuidado”.

A médica trouxe os seguintes dados: Mulheres vivendo com HIV com o devido diagnóstico, alcançam a casa dos 86%, em comparação com 92% entre homens; 80% das mulheres são vinculadas aos serviços de saúde, mas os homens chegam a 86%; retidas em tratamento são 72%, contra 68% no público masculino.

“Isso não significa que estamos aqui apontando a feminização da epidemia, estamos falando da falha no cuidado com as mulheres vivendo com HIV, estamos falando que é necessária inclusão e trabalho mais sistemático para com essas mulheres que já estão no serviço de saúde”, disse.

Ainda abordou que as dificuldades são muitas das pessoas com menor taxa de escolaridade, bem como das pessoas em situação de rua, pessoas negras, usuários de drogas injetáveis e pessoas privadas de liberdade.

“A população negra tem piores informações no que diz respeito à vinculação, retenção em TARV, entre outros”, exemplificou.  complementando que “a eliminação da transmissão do HIV como problema pública, exige que comecemos a lidar com questões relacionadas à estrutura social do nosso país. Precisamos falar disto e dar uma resposta a essa estrutura considerando seus diferentes aspectos, inclusive territoriais”.

“Precisamos olhar com mais carinho os estados do norte e nordeste do nosso país e dar aporte maior. Temos programas bem estruturados na região sul e sudeste que podem, inclusive, compartilhar suas experiências trabalhando de forma mais articulada com diferentes estados.”

Ela considera que a promoção de direitos sociais foi o maior desafio dos últimos anos, bem como a redução do estigma e discriminação contra quem vive com HIV e/ou aids, a luta contra a homofobia e a violência de gênero.

A reconstrução das políticas públicas, para ela, necessita de parceria contínua junto às ONGs e profissionais da comunicação, que tragam de volta à aids e demais ISTs para o centro do debate público.

O SUS (Sistema Único de Saúde) precisa estar alinhado com o SUAS (Sistema Único da Assistência Social) para a promoção da educação, inclusive educação sexual, e sobretudo nas escolas.

Ampliar a distribuição de preservativos e gel lubrificante em espaços públicos, da PrEP, da PEP, e de autotestes também são estratégias fundamentais apontadas pela gestora.

“É possível a gente garantir acesso para todos e nossa intenção é essa”, finalizou.

Kéren Morais (keren@agenciaaids.com.br)

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