Laboratório PCS LAB Saleme, em Nova Iguaçu

Walter Vieira, o responsável técnico do PCS Lab Saleme, laboratório interditado cujos laudos levaram à infecção por HIV de seis transplantados no Rio de Janeiro, é um ginecologista. A atuação do médico em análises clínicas contratadas pelo governo fluminense pode ser considerada irregular devido a uma espécie de “desvio de função”. Isso porque, para atuar na função, Vieira precisaria, conforme manda o Conselho Federal de Medicina (CFM) ser formado em outra especialidade: a de patologista.

Normas estabelecidas pelo colegiado desde a década de 1950 e atualizadas pela última vez sete anos atrás dizem que “o laboratório de patologia deve ter, investido na função de diretor técnico, um médico portador de título de especialista em patologia (…). Elas também indicam que “o controle e monitoramento interno e/ou externo da qualidade dos laudos citopatológicos emitidos por médicos deverão ser realizados somente por médicos citopatologistas, devidamente registrados (…)”.

Caso o laboratório seja “multidisciplinar” e produza análises de diversas especialidades, diz o CFM, o diretor técnico pode ser de outra especialidade que não o patologista, desde que haja “correspondência entre a titulação e os serviços assistenciais oferecidos”.

Walter está inscrito no Conselho Regional de Medicina do Rio, o Cremerj, desde 1996. A listagem de profissionais do órgão indica a especialidade dele como “ginecologia e obstetrícia”. Num site para a marcação de consultas, ele informa ainda que trabalha focado em temas como menopausa, reposição hormonal e cirurgia ginecológica — nenhuma menção à patologia, portanto.

É a assinatura de Walter, enquanto responsável técnico, que consta no primeiro caso de doador de órgãos com HIV cujos testes supostamente feitos pelo PCS Lab Saleme não indicaram a presença do vírus. Três transplantados foram infectados somente neste caso, em janeiro. Outros três, em maio.

Ontem, o Cremerj abriu uma sindicância para apurar a atuação de médicos em toda a cadeia de possíveis equívocos que levaram à falha gravíssima nos transplantes. Walter e sua atuação no laboratório estão na mira da análise que começará a ser feita nos próximos dias. Ele também é sócio do PCS Lab Saleme, o único médico no grupo de três pessoas oficialmente por trás da empresa.

Entre outros aspectos mais grave, o Cremerj deve analisar por qual motivo um ginecologista comandava o PCS Lab Saleme. O “desvio de função”, em meio a erros ou falseamentos de exames (a Anvisa não encontrou testes no local), seria como um “delito menor”, mas ainda passível de punição por parte da entidade de classe.

Pesaria a favor de Walter se, no endereço do laboratório, em Nova Iguaçu (RJ), ele também fizesse atendimentos como ginecologista — o que, talvez, fosse uma justificativa para a atuação dele no estabelecimento. Só que o site da firma não faz qualquer menção à ginecologia em seus serviços. E, numa outra página, dedicada à própria atividade direcionada a mulheres, Walter informa que atende em dois interesses. Nenhum deles é o do laboratório.

Fonte: O Globo