Thais de Azevedo fez do seu corpo uma bandeira contra a rejeição. A ativista transexual dedicou boa parte da vida à busca por dignidade e saúde à comunidade LGBTQIA+.
Nascida no interior de Minas Gerais, em 1949, mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro em 1964, ano do golpe militar. Foi lá onde desabrochou como mulher, sendo reprimida por familiares e policiais.
Em entrevistas, ela relatou frequentes prisões, destacando os abusos sexuais sofridos nas delegacias. Thais, porém, encontrou forças para desafiar as normas e trilhar uma jornada de resistência.
“As mulheres transexuais da minha época não tinham visibilidade social nem reconhecimento. Éramos submetidas a todos os tipos de violência. Até esqueço das violências psicológicas porque as físicas eram tão assustadoras. Às vezes, fico perguntando: ‘Nossa, sobrevivi?'”, disse à Folha em 2016.
Após anos trabalhando no mundo da moda como manequim de prova, com temporadas em Paris, Roma e São Paulo, escolheu a capital paulista para morar. Em 1986, auge da epidemia de Aids, descobriu estar infectada. Recebeu ajuda na Casa de Apoio de Brenda Lee, local histórico de acolhimento aos portadores do vírus, e passou a atuar também com ativismo.
Essa jornada, porém, quase foi interrompida abruptamente. Em 27 de fevereiro de 1987 teve início uma ação da polícia conhecida com Operação Tarântula, que tinha como alvo pessoas trans e travestis. Thais foi presa e agredida e, mais uma vez, resistiu.
Nas décadas seguintes, foi um dos rostos do ativismo LGBTQIA+ em São Paulo. Com o assassinato de Brenda Lee, em 1996, assumiu o protagonismo na causa do HIV, presidindo o Grupo Pela Vidda/SP, instituição dedicada ao apoio, prevenção e assistência às pessoas convivendo com o vírus.
Para ela, existir como mulher trans era um ato de rebeldia. “Transito e sou transgressora das regras”, dizia, e com esse mantra viveu por 75 anos, num país no qual a expectativa de vida para a população transexual é de 35 anos.
Thais de Azevedo morreu na manhã da última segunda-feira (19).
“Thais é a travesti negra que certa vez me disse: ‘Você é luz Carolina, e vai envelhecer com HIV e sendo travesti, sim. É possível passar dos 70 anos”, relata Carolina Iara, membro da bancada feminista do PSOL na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo).
Fonte: Folha de S.Paulo