Os candidatos precisam deixar claro que estão ao lado das imunizações e contra o negacionismo

Algo parecido aconteceu após a pandemia de gripe espanhola, no início do século passado. A população, enfraquecida pela tragédia causada por uma das epidemias mais mortais da história, saiu a comemorar com a energia que lhe restava. O desejo de esquecer repercutiu na escassez de registros sobre o impacto da gripe espanhola, motivo de debate por historiadores.

Um dos pontos importantes relacionados ao cenário atual diz respeito à implementação das imunizações. É reconhecido o impacto extraordinário das diferentes vacinas na infecção pelo Sars-CoV-2, bem como na queda de mortes pela Covid-19.

Ainda assim, observa-se o surgimento de nova onda de negacionismo às evidências científicas, como em outros momentos na história. A população que ofereceu grande resistência em vacinar-se contra a varíola, no início do século 20, também custou a convencer-se que o fumo era responsável por causar câncer e mortes, inundada por falsos dados alardeados pela indústria do tabaco. Repetem-se as cenas.

Temos assistido a postura de gestores, até mesmo de saúde, questionando a implementação ou adesão a programas de vacinação. Foram as vacinas que permitiram o melhor enfrentamento da pandemia, aliviando o impacto ao frágil sistema brasileiro de saúde, que esteve à beira de um completo colapso nacional.

Todavia, há um número considerável de pessoas que propaga teorias conspiratórias e flagrantemente falsas. Chips que modificam o comportamento, malformações e esterilização para controle da população são algumas das alegações absurdas, mas capazes de promover danos aos incautos.

Causa maior espanto quando estas teorias encontram voz na figura de médicos, que deveriam orientar e resguardar a integridade da população, independentemente de suas próprias ideologias religiosas ou políticas.

Uma resposta tão enérgica quanto a agressividade usada por propagadores de notícias falsas é mais que necessária. Caso contrário, os impactos negativos em saúde coletiva serão sentidos por muitas gerações.

A luta para consolidar a ideia dos malefícios do uso do tabaco, promovendo a queda acentuada da porcentagem de fumantes no país, levou décadas de esforço e investimento.

Não podemos nos dar ao luxo de esperar tanto tempo com as vacinas. A desinformação já se reflete em queda de adesão às vacinas básicas, inclusive contra a poliomielite, com acentuada diminuição na cobertura de proteção às crianças, especialmente. Devemos esperar a ocorrência de um caso de paralisia infantil para que todos se mobilizem?

Embora seja desejável o engajamento de toda a sociedade e associações profissionais, a reação principal deve partir do Ministério da Saúde, responsável por ditar as políticas públicas de imunizações.

Embora haja muitas questões importantes a serem tratadas, o próximo presidente da República precisa estar bastante comprometido com a pasta da saúde, combatendo o negacionismo e assumindo posição contundente ao lado das evidências científicas.

Reconhecer o papel protetor das vacinas, especialmente para as crianças, bem como sua importância em situações de emergência de saúde coletiva, como ocorreu na pandemia de Covid-19, é imprescindível.

Do contrário, voltaremos a conviver com o sofrimento e as mortes causadas pelo sarampo, pela poliomielite e outras viroses preveníveis, como num passado que queremos mas não podemos esquecer.

Cobre isso de todos os seus candidatos.

Fonte: Folha de S. Paulo