Ao cruzar dados de várias fontes, UNFPA identifica desafios e conquistas e aponta recomendações para que o Brasil avance na proteção deste segmento

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A saúde da população LGBTQIA+ no Brasil apresenta uma vinculação histórica com a chegada da epidemia de HIV/Aids, a partir dos anos de 1980. Desde então, políticas de saúde resultaram em avanços significativos na qualidade e expectativa de vida da população que vive com o vírus, incluindo do segmento LGBTQIA+. De acordo com o Ministério da Saúde, entre 2012 e 2022, o Brasil registrou uma queda de 25,5% no coeficiente de mortalidade por aids, que passou de 5,5 para 4,1 óbitos por 100 mil habitantes.

Nesta segunda-feira, 14 de outubro, o Fundo de População da ONU (UNFPA) lança, em parceria com o Instituto Matizes e com apoio da Organon, o estudo População LGBTQIA+: diversidade, direitos e acesso a serviços de saúde no Brasil, que mapeia as mobilizações e esforços governamentais que levaram a marcos importantes, como a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, em 2011.

A Política considerou a orientação sexual e a identidade de gênero como determinantes sociais da saúde, promoveu questões práticas como a inclusão dos campos “nome social”, “orientação sexual” e “identidade de gênero” em notificações e trouxe diretrizes para uma atenção em saúde sensível e respeitosa. A partir dela, o Ministério atualizou os protocolos de atenção a pessoas LGBTQIA+, ampliando a rede de ambulatórios e serviços especializados em pessoas trans, incluindo procedimentos com hormonioterapia e cirurgias de afirmação de gênero.

Contudo, uma leitura mais ampla das necessidades da população LGBTQIA+ indica que desafios persistem em áreas como a saúde reprodutiva e a saúde mental, entre outras.

Não é raro que o atendimento em saúde acessado por homens trans que buscam orientações sobre planejamento reprodutivo e métodos contraceptivos ocorra com profissionais pouco preparados para atender às suas particularidades. Além disso, o acesso a técnicas de reprodução assistida, bastante limitado para a população de maneira geral, se torna ainda mais desafiador quando o público é a população LGBTQIA+. As dificuldades persistem depois do início da gravidez. Um levantamento do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT) publicado em 2023 indica que 28,12% das pessoas ouvidas tiveram sua identidade de gênero desrespeitada durante a gestação.

Até mesmo o acesso a consultas cotidianas tende a ser mais difícil para perfis não-heteronormativos. O estudo 1º Lesbocenso Nacional: Mapeamento de Vivências Lésbicas no Brasil, publicado em 2023, revelou que 24,98% das lésbicas reportaram já terem sofrido algum tipo de violência ou discriminação em atendimentos ginecológicos; 72,94% delas apontaram ter receio ou constrangimento em revelar sua orientação sexual em um atendimento de saúde.

“Os exemplos estão relacionados à necessidade de qualificação de profissionais e serviços para responder às necessidades e expectativas da população LGBTQIA+ e à recorrência de abordagens pouco acolhedoras ou sensíveis a seus direitos, havendo relatos de desrespeito às identidades de gênero e suas corporalidades”, afirma Anna Cunha, Oficial de Programa para Saúde Sexual e Reprodutiva e Direitos do UNFPA.

A saúde mental também é um ponto de atenção. Dados de 2019 da Pesquisa Nacional de Saúde, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelaram que a prevalência de depressão já diagnosticada por profissionais foi superior em pessoas bissexuais (20,1%) e em lésbicas e gays (13,2%), se comparada aos diagnósticos para pessoas heterossexuais (10,1%).

“A saúde reprodutiva da população LGBTQIA+ é uma questão que merece atenção e respeito. Na Organon, acreditamos que é fundamental garantir que todas as pessoas, independentemente de sua identidade de gênero, tenham acesso a informações, serviços e apoio adequados para atender às suas necessidades reprodutivas. É essencial capacitar os profissionais de saúde para que possam oferecer um atendimento acolhedor e livre de preconceitos, promovendo o direito à saúde e ao planejamento familiar de forma inclusiva e respeitosa”, afirma Tassia Ginciene, Diretora de relações institucionais da Organon Brasil.

Assim como ocorre em outros segmentos sociais, a questão étnico-racial também é determinante para a compreensão da violência contra a população LGBTQIA+. De acordo com o Atlas da Violência 2023, travestis negras totalizam 65% do total de vítimas, diante de 31% das travestis brancas; mulheres trans negras são 58% das vítimas, contra 35% das brancas; homens trans negros concentram 56% das ocorrências, contra 40% dos brancos; são negras 55,3% das vítimas homossexuais (homens gays e mulheres lésbicas) e 52,2% das ocorrências entre bissexuais (homens e mulheres).

Sobre o estudo

A pesquisa População LGBTQIA+: diversidade, direitos e acesso a serviços de saúde no Brasil mapeou e analisou dados governamentais, quando disponíveis, publicações oficiais e documentos técnicos, dados e informações produzidos por organizações da sociedade civil que atuam no campo dos direitos LGBTQIA+, bem como materiais provenientes do campo jornalístico. A pesquisa se valeu, ainda, de entrevistas com especialistas, ativistas e profissionais.

O estudo recomenda o fortalecimento dos compromissos brasileiros com pessoas LGBTQIA+, bem como a ampliação de esforços no sentido de políticas públicas mais eficazes, intersetoriais, abrangentes e capazes de promover autonomia e dignidade para esta população, contemplando também suas intersecções de raça/cor, renda, origem, idade e outras.

Confira o estudo aqui.

Fonte: UNFPA