A sífilis congênita continua sendo um desafio de saúde pública. O Centro de Referência e Treinamento DST/Aids de São Paulo, reuniu diferentes mulheres que estão na linha de frente do enfrentamento à sífilis. As especialistas discutiram sobre os impactos da sífilis congênita nas vidas das gestantes e de seus bebês.
O diálogo fez parte da 9ª Semana Paulista de Combate à Sífilis e à Sífilis Congênita. Durante o painel, as convidadas abordaram estratégias para melhorar o diagnóstico e tratamento da sífilis, com foco na prevenção da transmissão vertical – infecção da mãe para o bebê durante a gestação.
Carmen Domingues, do CRT DST/Aids, responsável pela vigilância de transmissão vertical, destacou a necessidade de os médicos realizarem de forma sistemática e contínua, testes de sífilis durante o pré-natal. Segundo a Carmen, a infecção, muitas vezes negligenciada, pode ser evitada com um diagnóstico precoce. Por isso, propôs uma parceria com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para que operadoras de planos de saúde incentivem médicos a realizar esses testes de rotina, sem deixar esse papel restrito ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Segundo ela, além de oferecer maior cuidado e acolhimento às mulheres, a prevenção é mais barata do que o custo de manter um bebê internado em uma UTI, que pode ser necessário se a sífilis congênita não for detectada e tratada oportunamente. “É mais barato prevenir do que manter um bebê internado 10 dias numa UTI. Precisamos que os médicos solicitem os exames”, destacou.
Além disso, enfatizou a importância de campanhas conjuntas para promover o diagnóstico e tratamento adequado da sífilis, destacando a importância de erradicar não só a sífilis congênita, mas também a transmissão vertical do HIV e HTLV.
Na sequência, Vanessa Marrone, representando o Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (COREN-SP), enfatizou a importância de capacitar profissionais enfermeiros para lidar com a sífilis, já que os enfermeiros são os primeiros a ter contato com as gestantes durante o pré-natal. Segundo Vanessa, a formação inadequada nas instituições de ensino é uma das barreiras para o tratamento eficaz da sífilis. “Muitas vezes, os profissionais chegam aos serviços de saúde sem a experiência prática necessária para tratar a sífilis corretamente”, disse.
Ela destacou que “O COREN-SP tem trabalhado para criar cursos de capacitação que sejam acessíveis a todos os profissionais da saúde, visando melhorar o acolhimento e o tratamento das gestantes diagnosticadas com sífilis.”
O papel da saúde suplementar
Já para falar do papel da saúde suplementar, estava a médica infectologista Rosana Richtmann, do Grupo de Saúde e Maternidade Santa Joana, que destacou ser fundamental incluir a saúde suplementar na luta contra a sífilis congênita. Ela ressaltou que, em 2023, cerca de 25 mil nascimentos ocorreram nas maternidades do Grupo Santa Joana, o que representa uma proporção grande do número total de nascimentos em São Paulo. “Não podemos ignorar o papel da saúde suplementar nesse processo. A colaboração entre os sistemas público e privado é essencial para eliminar a sífilis congênita”.
No entanto, fez questão de ressaltar a atenção que o SUS oferece, onde os testes rápidos, por exemplo, são preconizados e oferecidos a custo do próprio sistema de saúde pública, sem custos adicionais. Já nos convênios, esse serviço é um dos principais desafios, pois muitas vezes a conta acaba difícil de fechar e o custo acaba caindo no bolso do próprio hospital privado. Ela reafirmou que a saúde complementar tem se esforçado para fazer o melhor pelas gestantes e bebês.
O papel da sociedade civil
Fabiana Oliveira, do Movimento Nacional das Cidadãs Positivas (MNCP), abordou o papel da sociedade civil no enfrentamento das ISTs, particularmente da sífilis. A ativista falou sobre a necessidade de um diálogo mais profundo entre os profissionais de saúde, serviços e as organizações da sociedade civil, considerando os setores públicos e privados. O MNCP, que reúne mulheres vivendo com HIV e aids, tem trabalhado para aumentar a conscientização sobre a importância do diagnóstico e da informação, buscando a eliminação da aids até 2030 e rumo à cura. No seminário, Fabiana compartilhou mais sobre como o MNCP tem incidido social e politicamente em prol das mulheres. “Estamos produzindo vídeos educativos curtos nas salas de espera de unidades de saúde, como UBS e SAES. Esses vídeos, com duração de três minutos, abordam temas como o autocuidado, o estigma relacionado à sífilis e HIV, e a importância do acolhimento e da imunização.”
“A ideia é que as gestantes, muitas vezes ansiosas e sem ocupação durante a espera, possam acessar essas informações educativas e se sentir mais empoderadas a buscar o diagnóstico e tratamento”, destacou a ativista.
O trabalho de conscientização realizado pelo MNCP e outras ONGs continua a ser uma ferramenta de mobilização social. Fabiana mencionou ainda o fato de que muitas mulheres, sobretudo aquelas que vivem nas regiões rurais, não têm o mínimo acesso à informações de prevenção ou tratamento, no caso das que já vivem com HIV/aids. Nesse sentido, falou que o movimento tem levado informações qualificadas sobre HIV/aids, ativismo, empoderamento feminino e luta contra o machismo através da rádio, meio de comunicação predominante nessas regiões do país.
Kéren Morais (keren@agenciaaids.com.br)
Dica de entrevista
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