A disputa ao Palácio do Planalto mais longa e polarizada da história chega finalmente à reta final. Às vésperas do primeiro turno, no domingo 2, a Agência Aids traz um raio-x da aids no Brasil. Quais são os desafios da política de aids e saúde para o próximo presidente eleito?

No país, a cada hora, ao menos cinco pessoas foram infectadas pelo HIV em 2021. Segundo estimativa da ONU, ao longo do ano passado o Brasil teve 50 mil novos casos, o que fez o país chegar à marca de 960 mil pessoas vivendo com HIV. A aids hoje afeta desproporcionalmente pessoas negras, homens que fazem sexo com homens, usuários de drogas e mulheres trans, como mostra o relatório anual do Unaids. Ou seja, qualquer pessoa pode se infectar, mas o HIV impacta de maneira desproporcional certos grupos sociais, num cálculo atravessado por desigualdades e vulnerabilidades sociais.

Em 2021, foram 650 mil mortos em decorrência da aids no mundo, 13 mil deles no Brasil. No Brasil, 694 mil pessoas estão em tratamento contra o HIV. No ano passado, 45 mil novos pacientes iniciaram a chamada terapia antirretroviral. De acordo com o Ministério da Saúde, os números representam cobertura de 81% das pessoas diagnosticadas com HIV no país. Do total de pacientes em tratamento, 95% já não transmitem o vírus por via sexual por terem atingido carga viral suprimida.

Dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação, divulgados pelo Boletim Epidemiológico de HIV/Aids de 2021, mostram que, em 2020, foram notificados 29.917 casos de aids no Brasil contra 37.731 em 2019 – uma queda de 20,7%.

Segundo especialistas, ainda que se observe um arrefecimento, a situação preocupa, visto que os registros de óbitos pela doença continuam.

“Temos uma pandemia estável com um número de mortes anuais muito elevado porque existe uma desigualdade muito grande no país que faz com que o acesso ao tratamento e a medidas de prevenção e diagnóstico sejam desiguais”, explica o médico infectologista Esper Kallás.

Desigualdades e vulnerabilidades

Entre 2010 e 2020, enquanto a proporção de casos de aids entre pessoas brancas no Brasil caiu 9,8%, entre pessoas negras houve aumento de 12,9%, segundo dados do Ministério da Saúde. Entre as mortes por aids, o período registra o mesmo movimento em direções opostas: queda de 10% entre pessoas brancas e crescimento de 10% entre pessoas negras.

“A desigualdade impacta diretamente na resposta ao HIV no mundo, afetando populações mais vulneráveis, que têm seu risco de infecção aumentado”, explicou Ariadne Ribeiro, do Unaids Brasil, em entrevista à Folha de S. Paulo. “Uma mulher trans no Brasil, por exemplo, tem 40 vezes mais risco de ser infectada do que a população em geral”, ilustra.

Segundo ela, essa vulnerabilidade não se explica apenas por fatores biológicos. “O preconceito cria barreiras que prejudicam o acesso às tecnologias biomédicas de prevenção, diagnóstico e tratamento capazes de interromper a cadeia de transmissão, ainda que todos estejam disponíveis por meio do Sistema Único de Saúde”, afirma ela.

40 anos depois

Por muito tempo o Brasil foi tido como referência global no enfrentamento ao HIV/aids, mas os programas de HIV e aids foram enfraquecidos e as campanhas de prevenção foram reduzidas consideravelmente no atual governo.

De maciças campanhas promovidas por iniciativas do governo ao longo dos anos, por exemplo, na TV; rádios e também in loco, hoje vemos apenas campanhas pontuais, muitas são realizadas sem vínculo com órgãos governamentais.

Desafios

Especialistas dizem que entre os desafios para erradicação da doença no território nacional é preciso vontade política, fortalecimento da sociedade civil; pensar a política de aids com base nos direitos humanos; prevenção para todos; testar em massa; ampliar acesso à PrEP (Profilaxia Pré-Exposição) e PEP (Profilaxia Pós-Exposição); voltar a fortalecer os serviços de aids; combater as desigualdades e o preconceito; retomar as campanhas nacionais de prevenção, entre outros.

Segundo o ex-coordenador do antigo Programa de Aids, Alexandre Grangeiro, “as respostas por meio de políticas públicas desenvolvidas nesses últimos 40 anos não são mais adequadas. Só a disponibilidade de novos métodos preventivos não é a garantia de uso deles. Temos que motivar os mais jovens ao uso da PrEP. A resposta ao HIV envelheceu junto com a epidemia. Essas novas gerações têm menor peso nos movimentos sociais e também nos serviços de saúde. É preciso rejuvenescer as respostas, já que as novas gerações estão acumulando casos.”

Acabar com a aids até 2030 é um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. Fatores como a pandemia de Covid-19 e a guerra na Ucrânia, no entanto, também afetaram essa meta. Segundo o relatório da ONU, essas emergências sufocaram as capacidades dos países de responder à aids.

Redação da Agência de Notícias da Aids com informações