Em alusão ao Dia das Mães, comemorado no próximo domingo (10), a Agência de Notícias da Aids relembra histórias de mulheres que, para além da maternidade, se dedicam à luta contra a aids e o preconceito. Muitas delas, justamente por viverem com HIV ou a hepatite C, chegaram a acreditar que não poderiam ter filhos e precisaram enfrentar o estigma para construir suas famílias.

Por meio das histórias de vida aqui retratadas, homenageamos as mães pela coragem ao lidar com os desafios na busca por autonomia, direitos, acesso à tratamento e tantos outros desafios presentes na vida daquelas que vivem e convivem com o HIV e hepatite C.

Relembre a seguir as histórias das ativistas Magna Celi e Silvia Almeida.

 

Magna Celi

Magna Celi, 56, é daquelas profissionais que são apaixonadas pelo que faz. Trabalhando na área de infectologia na cidade de Natal, ela nunca pensou que seria uma paciente no hospital em que ela mesma fazia plantões quase todos os dias.  

No ano de 2004, Magna planejava o terceiro filho. “Era meu sonho”. Acelerada por natureza, fez exames antes mesmo de engravidar e, então, veio a surpresa. Era preciso fazer o exame confirmatório para a hepatite C. “Era uma hepatite nova pra gente, não sabia como funcionava direito”, explica. Para receber o veredito, foram 20 dias de angústia até que o teste fizesse uma viagem de ida e volta até Belo Horizonte, já que no Rio Grande do Norte ainda não havia recursos para fazer a confirmação. “Chorei todo dia até receber o resultado. Eu sabia que, naquela época, a doença não tinha cura.”

“Quando você não entende, tudo bem, mas quando você é da área, complica. Pirei porque eu queria engravidar. Um dos meus sonhos foi abaixo.” Apesar de saber que não poderia ser curada, Magna, inquieta e questionadora por natureza, não sossegou até descobrir a origem de sua infecção. “Queria saber se foi em manicure, se foi no casamento, mas por fim foi dito que aconteceu em acidente de trabalho. Serve até de alerta, porque se foi acidente profissional, não me recordo de jeito nenhum”, conta ela ao denunciar uma das principais armadilhas da hepatite C, o silêncio. 

Nos cinco anos em que esperou pelo tratamento, a enfermeira mudou de planos, desistiu de engravidar pelo medo de infectar aquele que seria o terceiro filho. “Já tinha dois filhos, hoje uma com 32 e outro com 23. Pra eles foi uma barra pesada, porque ficaram com medo de eu morrer.” 

“Quando eu passava mal, meu marido disse que um dia me olhou e pensou que eu não ia escapar. Tinha uma escala entre eles pra eu não ficar sozinha. Aí quando eu ficava bem, eles iam fazer as coisas deles. Por isso é que tenho que agradecer muito. Sou super elétrica, minha família é uma festa e ter que mudar isso tudo depois do diagnóstico também foi difícil”, disse ao confessar que adora “uma cervejinha”.

“Aí você começa a se desesperar, começa a ler, eu chegava com uma lista de questionamentos para o médico. Só faltava enlouquecer! Por isso que é preciso muito investir em pesquisas, em informação porque a gente sofria muito.”

Hoje, ela também promove cursos, treinamentos e capacitações técnicas para estudantes de medicina na Universidade Federal do Rio Grande do Norte e na Universidade Potiguar. “Todo profissional tem que colocar a testagem em sua conduta. Não fazer só essas ações pulverizadas. Nem gosto disso de julho amarelo. Aí testa, testa… e depois passa o resto do ano sem testar? Não pode ser assim, tem que ser rotina. Controle social é fundamental para diminuir as infeções.” 

 

Silvia Almeida

“A maternidade me fez lutar, querer viver e me tornou mais forte do que o vírus HIV.” É o que diz a extrovertida ativista Silvia Almeida, hoje consultora do Unaids Brasil (Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids). Ela tinha uma menina de 14 anos e um menino de 1 ano em 1994, quando soube que fora infectada pelo HIV. Na época, o marido e primeiro namorado, com quem mantinha um relacionamento havia dez anos, fora hospitalizado por causa de uma tuberculose. “Ele estava muito mal e foi diagnosticado com aids. Foi quando eu soube que também estava infectada”, conta ela.

A descoberta da sorologia foi um choque. Seus maiores medos eram de morrer, deixar os filhos e que seu bebê fosse portador do vírus por transmissão vertical. “Quando testamos meu filho, senti um alívio pelo resultado negativo. Mas, logo em seguida o medo de morrer e não poder cuidar deles foi muito grande.”

O marido de Silvinha morreu logo. Viúva, mãe e soropositiva, em um período de muito preconceito e pouca informação, ela precisava de forças para continuar. “Eu não tinha noção de como seria a minha vida, mas eu tinha certeza de que precisava viver, mesmo com o HIV.”

Uma grata surpresa aconteceu ao revelar sua sorologia ao RH da empresa em que trabalhava como telefonista, a Anglo American. Ela recebeu todo o amparo que precisava para enfrentar a doença.

Dois anos após receber seu diagnóstico, em um posto de saúde, Silvinha viu um cartaz que convidava as mulheres para um encontro que aconteceria no GIV (Grupo de Incentivo à Vida) sobre nutrição e aids. “O palestrante não pôde ir. Então, nós que estávamos ali batemos um papo. Mas saindo de lá, eu estava assustada, pois percebi que eu não tinha noção do que era ativismo. Saí achando que não era pra mim”.

Pouco tempo depois, numa das sessões de terapia que fazia, Silvinha foi aconselhada a conhecer o MNCP (Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas). O 1º Encontro Regional de Mulheres com HIV e Aids de São Paulo estava prestes a acontecer. Ela foi e conheceu Nair Brito, uma das fundadoras do grupo. Segundo conta, foi a partir desse encontro que sua vida começou a mudar, pois o medo se transformou em vontade de batalhar e trabalhar para que as pessoas tivessem mais informação.

25 anos após o diagnóstico, avó de dois netos, Silvinha divide seu tempo entre a família, o atual marido, o combate às ISTs/aids e a difundir informação sobre sexualidade.  Há 23 anos, integra o GIV, com atuação no grupo Toque de Mulher.

Silvinha também já foi uma das facilitadoras do projeto Lá Em Casa – Saúde, Arte, Bem-Estar e Cidadania, centro de reabilitação física para pessoas carentes vivendo com HIV/aids.