O epidemiologista Gerson Pereira ficará à frente do Departamento de Infecções Sexualmente Transmissíveis, HIV/Aids e Hepatites Virais. Atualmente diretor substituto, ele vai ocupar o posto de Adele Benzaken, que foi exonerada do cargo nesta semana. Pereira é apresentado como um profissional que dará continuidade às políticas públicas conduzidas no departamento, sobretudo para populações vulneráveis.

Ativistas falaram à Agência de Notícias quais sugestões e demandas são mais pertinentes para a próxima gestão. Como principais pontos, ressaltaram a manutenção das políticas de prevenção, incluindo a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição), além da atenção às pessoas que vivem em maior vulnerabilidade social. Confira os depoimentos na íntegra:

Carlos Henrique de Oliveira, ativista do coletivo Loka de Efavirenz, da Rede de Jovens São Paulo Positivo : “Espero primeiro que o governo mantenha o Gerson Pereira na direção do departamento, para que haja continuidade ao que já estava sendo implementado de políticas públicas. Esse é o primeiro ponto, para que o Departamento não se transforme negativamente com uma nova indicação de diretor. Em seguida, penso que o novo departamento precisa lutar com unhas e dentes dentro do Ministério da Saúde para manter orçamento, a universalidade da entrega de medicações para as pessoas vivendo com HIV/aids , manter e expandir a PREP, ter uma política de equidade para a população negra, pobre e LGBTI devido às vulnerabilidades e opressões que essas populações sofrem. E o que mais tem me preocupado: a apresentação de um plano de metas para redução da mortalidade, principalmente na população pobre e negra — isso é urgente. Ademais, penso que a luta principal tanto pro Deparatamento como pro movimento social será impedir que o conservadorismo atrapalhe as políticas de resposta à aids.”

Américo Nunes Neto, Movimento Paulistano de Luta Contra a Aids (Mopaids) e Instituto Vida Nova Integração Social Educação e Cidadania: “Reavaliar e qualificar a abertura e transparência do diálogo com as instancias legítimas do Movimento Nacional de Luta Contra a Aids são premissas que não devem ser desconsideradas. Manter os programas e ações exitosas, como a PrEP ampliando o acesso e monitorando a oferta; a Campanha Indetectável igual Intransmissível (I=I) com novas estratégias de difusão para além das mídias sociais, bem como ampliar o acesso ao diagnóstico com teste rápido e fluido oral para HIV. Ampliar a articulação com a pasta da educação com vistas ao fomento de ações preventivas nas escolas; ampliar o quadro técnico do Departamento renovando ideias e fazendo um trabalho na revisão das comissões e novas estratégias. Os Boletins epidemiológicos apresentam dados alarmantes de coinfecção HIV/tuberculose, hepatite e sífilis, portanto pensar em ações conjuntas e efetivas nas três esferas de governo é salutar. Está mais do que na hora de promover discussões e reflexões junto a IAS e outras agências internacionais para a realização da 1ª Conferência Internacional de Aids no Brasil. Isto trará luz e maior visibilidade da resposta brasileira e quem sabe recuperar o “status” de melhor programa de aids do mundo.”

Beto de Jesus, diretor de Aids Healthcare Foundation (AHF – Brasil) – “É imprescindível manter o compromisso com a principal característica da epidemia no Brasil, que é a concentração de casos em populações chave, como gays, homens que fazem sexo com homens, travestis, transexuais e pessoas que usam drogas. À parte qualquer moralismo, ideologia ou crença religiosa, a ciência tem demonstrado, desde o surgimento do HIV, na década de 1980, que uma resposta efetiva precisa estar em sintonia com o comportamento da epidemia. Também é fundamental que o Brasil mantenha políticas públicas que possam garantir avanços no combate à aids, como a redução no número de mortes, nos casos de HIV em mulheres e na transmissão do vírus da mãe para o bebê, observadas nos últimos anos. Para isso, o país não pode abrir mão da prevenção combinada, aliando métodos clássicos, como a camisinha, com as novas tecnologias, como a PrEP e a PEP.”

 José Araújo de Lima, Espaço de Prevenção e Atenção Humanizada (Epah) – “Que a nova Coordenação do Departamento democratize a distribuição da PrEP em todo o Brasil, e não somente nos cetros das grandes cidades, mas periferia de São Paulo, bem como outros regiões do Brasil onde as populações podem ter conhecimento e não acesso. A democratização do tratamento está relacionada aos direitos humanos e deve ser uma das missões da nova direção.”

 

Veriano Terto, vice-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids – ABIA: “Nós esperamos que a nova direção escute e leve em consideração os recentes documentos divulgados pelas redes de movimentos sociais, gestores e pesquisadores envolvidos com a aids pela manutenção da politica de enfrentamento ao HIV/Aids no país. Com relação à prevenção, desejamos que ela seja direcionada a todos os públicos, em especial às pessoas em maior condição de vulnerabilidade, sendo respeitadas a sua diversidade dentro do marco dos direitos humanos e que a PrEP seja mantida e ampliada de modo a atender o maior público possível, alcançando a sua universalidade.  Dentro do campo do tratamento que sejam feitos esforços para reduzir o tempo entre o diagnostico e o acompanhamento médico e que a incorporação de inovações nesse campo, como os novos medicamentos, sejam mantidas como uma parte fundamental nessa politica.”

Rodrigo Pinheiro, Fórum de ONGs Aids de São Paulo (Foaesp): “Uma notícia excelente é que talvez possamos controlar a epidemia de HIV, pois o Brasil comprometeu-se com as metas de eliminação do HIV da Organização Mundial da Saúde até 2030. Para isso, será necessário tratar muitas pessoas com HIV, mas também oferecer e informar sobre as opções de prevenção para a população em todos os âmbitos, como nas escolas para as pessoas que estão iniciando sua vida sexual, nos locais sociais frequentados pelas populações mais afetadas e também pelas populações menos afetadas. As prioridades de acesso não podem resultar em exclusões! Por isso, a ampliação da PrEP para todas as pessoas que dela necessitam é fundamental para a continuidade da resposta brasileira à contenção do HIV. É necessário enfrentar o preconceito e a discriminação que sofrem as PVHA e as populações mais vulneráveis ao HIV, entre as quais estão gays e homens que fazem sexo com homens, mulheres trans (travestis e transexuais), população privada de liberdade, usuários de substâncias ilícitas e trabalhadores e trabalhadoras do sexo.”

Salvador Correa, coordenador executivo adjunto da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids –  Abia :É fundamental que a nova gestão do Departamento defenda os direitos das pessoas com HIV e grupos vulnerabilizados. Para que não haja retrocesso, é preciso amplie o debate sobre a prevenção para além dos espaços que se tem feito, resgatando as históricas e exitosas ações apoiadas pelo governo, empresas e sociedade civil, incorporando novas estratégias com a sociedade civil. O Departamento, apesar dos embalos conservadores, tem sido um espaço de referência no debate sobre os direitos humanos de grupos vulnerabilizados, em que há grande prevalência de HIV – como gays, trabalhadoras sexuais, usuários de drogas, pessoas trans. É necessária a manutenção desse espaço como co-criador de políticas públicas incluindo perspectiva da sociedade civil, academia, trabalhadores do SUS e o amplo diálogo. É preciso debater sobre a ameaça de ondas conservadoras no campo da prevenção, resgatando na memória social exemplos globais. No caminho para a quinta década de epidemia, só podemos dar passos para frente, inovar e resgatar o que deu certo.”

Silvia Aloia, Secretaria Executiva do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas: “Nós mulheres (cis e trans), vivendo com HIV/aids (MVHA) recomendamos que a nova direção do Departamento dê continuidade as ações já pactuadas e ainda a elaboração de novas que contemplem as necessidades das mulheres, como a disseminação de informação adequada para o direito e acesso aos insumos de prevenção e contracepção, a interlocução com as diversas áreas que envolvem o atendimento integral das MVHA, como a assistência psicossocial. Realização de campanhas efetivas e capacitação dos profissionais que nos atendem, buscando a redução do estigma e do preconceito do racismo, do sexismo e todas as formas de discriminação, incluindo o direito e a autonomia de terem ou não filhos, por exemplo. A ampliação do olhar dos corpos femininos e da dinâmica cotidiana das mulheres no que se refere aos efeitos do HIV e dos antirretrovirais, assim como a garantia de acesso aos exames específicos como: densitometria óssea, controle de dosagem hormonal, dentre outros, propiciando o melhoramento da qualidade de vida e desfrutando-a em todos os ciclos de vida. Recomendamos também a valorização e o diálogo contínuo com o Movimento Social.”

Vando de Oliveira, da Rede de Pessoas Vivendo com HIV/Aids Ceará: “Espero que não ocorram mudanças na parceria entre o governo e a sociedade civil, temos claro que cada um tem o seu papel, mas a defesa do SUS, da política pública de aids e dos direitos das pessoas que vivem com HIV/aids devem ser um ponto comum. Por isso, vamos continuar fazendo controle social e cobrando do poder público a continuidade e os avanços na luta contra a aids.”

 

Redação da Agência de Notícias da Aids