A minha análise sobre a 25ª Conferência é mais sobre a questão do movimento social e da participação comunitária do que sobre aspectos científicos, que já são comentados por especialistas em outras áreas. Minha percepção, depois de mais de 40 anos de ativismo, é que, a cada dia que passa, é mais difícil manter as “chamas do ativismo” por vários motivos: econômicos, discriminação e estigma, acesso à informação e insumos, entre outros. Coube à Motirô BA a responsabilidade de ter um estande na Vila Global, chamado HUB Latino, que teve o intuito de conectar e estreitar laços com ativistas e instituições da América Latina. Nesse espaço, conseguimos ouvir muitas vozes de diferentes países da região e de outras áreas, sobretudo da África Subsaariana, evidenciando as diferenças regionais e locais.

Nesta edição da Conferência, a Vila Global teve um espaço confortável, bem localizado e que funcionou durante todos os dias do evento, o que possibilitou muita interação com os companheiros de outros países. As preocupações comuns a todos incluem o avanço da extrema direita, o fundamentalismo religioso e as políticas restritivas de direitos, preocupação que foi também ressaltada pela diretora executiva do Unaids, Winnie Byanyima, que, em seu discurso de abertura da Conferência, fez um chamamento para que estejamos alertas a essas questões.

A situação diante do avanço de governos reacionários na América é muito preocupante, já que as políticas públicas podem ser afetadas tanto por cortes de recursos quanto por leis restritivas de direitos para as populações mais afetadas pelo HIV. O sentimento é paradoxal, pois estamos comemorando o avanço científico com novos medicamentos de longa duração para PrEP e tratamentos, mas permanecem muitas dúvidas sobre como será o acesso a esses tratamentos e qual será a vontade política dos governos em adquiri-los, já que são bastante onerosos.

Outra diferença que percebemos in loco foi a avidez por preservativos no estande, já que éramos um dos poucos que os tinham disponíveis. Os participantes, sobretudo africanos, pegavam grandes quantidades, já que esse é um insumo caro em seus países e não está disponível nos sistemas públicos. Isso evidencia a dificuldade de acesso, em alguns países, a um insumo básico de prevenção, que há 40 anos se mostra efetivo e de baixo custo.

Diante desses desafios, o importante é impulsionar novamente o ativismo — um ativismo em rede, articulado, transnacional, que mostre força e permita que se mantenham as conquistas e que se lute por avanços. Percebemos também a escassa participação de ativistas da América Latina na Conferência (por diversos motivos, entre eles o alto custo na Europa) e o enfraquecimento de importantes redes latino-americanas. Nesse sentido, o HUB Latino foi um espaço onde se articularam propostas, como o fortalecimento de uma rede latino-americana de organizações e ativistas.

Outra proposta foi a criação de uma rede de ativistas e organizações lusófonas, que está sendo articulada e terá sua primeira reunião fundacional ainda em agosto. Portanto, a 26ª Conferência é mais um ponto de partida para renovar forças, fortalecer as redes existentes e criar novas, se necessário.

Aproveito o espaço da Agência de Notícias da Aids, que desempenhou um papel ímpar na divulgação da Conferência, para informar que a Motirô BA, em parceria com o projeto PrEPara Salvador, realizará um evento presencial intitulado “Ecos de Munique 2024” no dia 29 de agosto, em Salvador. O evento será direcionado a ativistas, profissionais e gestores de saúde, para discutirmos com nossos “patrícios” os avanços e desafios apresentados na Aids 2024.

* Javier Angonoa é diretor da ONG Motirô Bahia.