Não foi fácil para nenhum de nós que trabalhamos com o tema HIV/Aids acompanhar esta 23ª Conferência Internacional em meio a pandemia da Covid-19. Evidente que a solução proposta pela IAS era a única possível neste momento: primeiro congresso inteiramente virtual depois que o mundo registrou o primeiro caso de infecção pelo HIV, há 40 anos. Plataforma não muito fácil de navegar. Caiu muitas vezes interrompendo aulas e informações importantes. Todos nós insistimos porque é sempre importante acompanhar o que profissionais ao redor do planeta têm a dizer para caminharmos e conquistarmos melhores resultados até que o objetivo seja alcançado: a cura da aids!

Para você que lê meu texto ter uma ideia, fiquei 8 horas por dia, durante 5 dias acompanhando a Conferência. Especificamente em meu campo de especialidade, tratamento para crianças e adolescentes, as discussões giraram em torno das dificuldades na manutenção e continuidade da adesão ao tratamento antirretroviral. Situação recorrente em diferentes países do mundo, segundo apanhado feito pela Organização Mundial de Saúde.

A dra. Martina Panazzato, representante da OMS, informou que apesar de ter diminuído a transmissão vertical do HIV, ainda em países não desenvolvidos, muitas crianças têm diagnóstico tardio e consequente tratamento tardio. Muitas vezes levando a morte que poderia ser evitada.

Outro ponto que ela trouxe para reflexão é a demora para estudos e liberação de novas drogas especialmente para crianças menores, ou seja, as crianças continuam a receber novas drogas muitas vezes muitos anos depois da liberação para adultos. Em relação às crianças e adolescentes, quarenta anos depois do diagnóstico do primeiro caso de infecção pelo vírus que causa a aids, essas questões apresentadas na 23ª Conferência, já deveriam ter tido uma atenção maior e ouso dizer, inclusive condições de terem sido resolvidas. Temos protocolos. Temos condições de melhorar a vida de quem ainda por transmissão vertical contraí o vírus.

Temos o dever de cuidar dessas crianças para colaborar com o processo de cura e esperança, com o processo de construção e finalidade de um mundo mais acolhedor, carinhoso, inclusivo e melhor!

De acordo com dados do Unaids, 1,7 milhão de crianças menores de 15 anos vivem com HIV/aids no mundo. Apenas 54% têm acesso a terapia antirretroviral. Eis, em números, o tamanho de nosso desafio!

 

* Dra. Marinella Della Negra é infectologista, referência no tratamento de crianças com HIV/aids e presidente da Associação de Auxílio à Criança e Adolescente Portador de HIV.