A sede da Fundação Saúde, no Rio Comprido

Dez dias após a revelação dos casos de transplantes de órgãos infectados pelo HIV que resultaram na infecção de pacientes, o governo do Estado do Rio anunciou a mudança de toda a diretoria da Fundação Saúde. A decisão foi anunciada pelo governador Cláudio Castro nesta segunda-feira, e ainda não há o nome do substituto do diretor-geral João Ricardo da Silva Pilotto.

Nos próximos dias, os atuais ocupantes dos cargos deixarão as seis diretorias da Fundação: executiva, administrativa e financeira, recursos humanos, planejamento e gestão, técnico-assistencial e jurídica.

João Ricardo da Silva Pilotto foi nomeado para o cargo em janeiro de 2016, na primeira passagem do deputado Doutor Luizinho como secretário estadual de Saúde. Pilotto dirigiu, por dois anos, o Hospital Geral de Nova Iguaçu (HGNI), na Baixada Fluminense, que também teve à frente o ex-secretário. Nova Iguaçu é a principal base eleitoral de Doutor Luizinho.

Neste domingo, O GLOBO revelou que, na Fundação Saúde, o que era para ser exceção virou regra: desde 2021, contratações consideradas emergenciais — feitas pela instituição com dispensa de licitação e que deveriam, pela lei, ser realizadas somente em caráter excepcional — superam as realizadas com concorrências públicas. Neste ano, a soma do valor dos contratos assinados sem licitação pelo órgão é três vezes maior do que a decorrente de pregões eletrônicos.

De acordo com dados do Sistema Integrado de Gestão de Aquisições (Siga) compilados pelo GLOBO, até outubro a fundação assinou 292 contratos emergenciais com valores somados que ultrapassam R$ 911 milhões; já as 60 contratações com pregão eletrônico totalizam R$ 302 milhões. No ano passado, a discrepância foi ainda maior: 618 contratos com valor global de R$ 1,6 bilhão foram assinados sem licitação, ante apenas 139 decorrentes de concorrências, no valor de R$ 372 milhões.

Ainda como mostrou O GLOBO no domingo, a política de contratações da Fundação Saúde é alvo tanto de auditorias do Tribunal de Contas do Estado (TCE) quanto de críticas de especialistas. Um relatório produzido pelo órgão em abril deste ano aponta que o volume de contratos sem licitação é “consequência da falta de planejamento, desídia ou má gestão”. O texto observa que “o ato de dispensa de licitação se trata de um recurso alternativo à disposição do gestor público para manejar excepcionalidades. No entanto, o administrador da Fundação Saúde utilizou-o como regra a ser aplicada para efetuar as contratações”, afirmam os auditores do TCE no documento.

Criada em 2007 como alternativa para contratar profissionais e comprar insumos de forma mais rápida do que na administração direta, a Fundação Saúde ganhou estatura a partir de 2020, durante a pandemia de Covid-19, em meio a uma crise provocada por denúncias sobre irregularidades na construção de hospitais de campanha pela OS Iabas. O episódio culminou com o impeachment do então governador Wilson Witzel e a aprovação de uma lei que obriga o estado a assumir todas as unidades de saúde que eram administradas por OSs — assim, a fundação acabou absorvendo, gradativamente, a gestão de UPAs, hospitais e institutos.

Em nota, o Governo do Estado informou que o governador Cláudio Castro aceitou a renúncia da diretoria da Fundação Saúde, apresentada na manhã desta segunda-feira. O comunicado diz que “a medida amplia a transparência e assegura que não haja interferências nas apurações já determinadas pelo Governo do Estado”, e que a “Secretaria de Estado de Saúde está empenhada em preservar a prestação dos serviços à população e, em breve, será anunciada a nova diretoria”.

Fonte: Folha de S. Paulo