Após 4 décadas do surgimento do HIV, o cardápio da prevenção cresceu consideravelmente. A mandala da prevenção permite afirmar que a melhor prevenção é a que o indivíduo elege. Já para as pessoas vivendo com HIV ou aids, a prevenção positiva a plena vivência da sexualidade.
Porém, para que todes possam desfrutar de uma sexualidade emancipada, isto é, na qual o individuo decide seus caminhos, é fundamental que a população tenha conhecimento de seus direitos sexuais e reprodutivos e acesso aos serviços de saúde.
Algumas reflexões para esta época de Carnaval, momento em que relações afetivas/casuais acontecem, “digamos” com mais frequência, tendo como pano de fundo tudo junto e misturado: blocos, festas, fantasias, cervejas, suor, verão, música, marketing de produtos, feriado prolongado e cultura popular. Há um mantra de alegria coletiva, um balsamo para iniciar o ano de verdade.
Nós educadores sociais afirmamos sem medo de errar que a população em geral desconhece as tecnologias de prevenção. As campanhas educativas, com raras exceções, desapareceram da mídia nacional e local, das escolas, empresas, estabelecimentos comerciais e pontos estratégicos há mais de uma década, tendo como consequência toda uma geração que simplesmente desconhece conceitos básicos de prevenção.
Estive na Fast Track Cities 2023, em Amsterdam (Holanda), e assisti diversas apresentações nas quais autoridade locais apresentavam os dados das suas cidades. Amsterdam por exemplo está próxima a alcançar a meta de zero transmissão, em 2022 ocorreram apenas 8 casos de HIV e nem por isso as campanhas cessaram. Paris, Londres também estão próximas de zerar a rede de transmissão de HIV. Comentando estes números com algumas pessoas, ouvi …” ah, mas é outra cultura”.! Claro que é!!!! E talvez a virada de chave esteja aí. A sexualidade é tratada como um tema do cotidiano e não há interrupção de programas educacionais. Quais são os nossos valores que nos impedem de discutir a educação sexual nas escolas, empresas, mídia, lares e outros espaços?
Pesquisa do IBGE aponta que o Brasil tem mais estabelecimentos religiosos do que de saúde e educação somados. Nada contra aqueles que tem o privilégio da fé, mas com certeza estes números revelam um país cujo seus cidadãos contam mais com templos, igrejas, terreiros e afins do que com serviços públicos de saúde e educação.
Morando na Baixada Santista há quase um ano, região que voltou a ocupar números alarmantes no Estado de SP em casos de HIV/aids e sífilis, não vi em todo o verão uma ação educativa de prevenção. A Baixada Santista, com seus 9 municípios, recebeu 8 milhões de turistas em 2023, este número deve ter crescido em 2024 com a alta das passagens aéreas.
Não há preservativos na rodoviárias (externos e/ou internos), nos bares, nos shows de verão, nem divulgação dos endereços para a retirada de PEP e PrEP, PrEP sob demanda (que tal uma edição especial de verão?). Por outro lado, há uma gama de possibilidades, caso houvessem, obviamente, recursos e vontade política. Parcerias com barracas de praia, bares para a disponibilização de preservativos, divulgação da mandala em estabelecimentos comerciais (banheiros são excelentes locais para tal, inclusive os banheiros químicos). E por que não ressuscitar, a estratégia do marketing social do preservativo? Há uma lei que permite desde 2002 a venda de preservativos em qualquer estabelecimento comercial. Inúmeras parcerias com a iniciativa privada são perdidas com o apagamento deste método de prevenção.
Sem dúvida, que há exceções, como o município de São Paulo e Sergipe, dentre outras cidades que incorporam o Carnaval como uma das datas chave para ações de prevenção ao mesmo tempo que combatem o estigma.
A sociedade civil, sempre citada e pouco valorizada na vida real, possui expertise, capilaridade e recursos humanos. Por que continuamos excluídos desta grande festa? Bastava um edital ali e acolá e a iniciativa privada buscando aliar-se a causas para que diversas ONGs do Brasil colocassem seus blocos de saúde, prevenção e cidadania na rua.
* Marta McBritton é presidente do Instituto Cultural Barong.
** O título deste artigo é uma referência a música “Amor e Sexo”, um dos maiores sucessos de Rita Lee.