Brasil registra cerca de 78 mil novos casos ao ano, mas tratamento segue modelos dos anos 1990. Novidades pretendem ajudar a zerar casos

Embora seja conhecida pelos impactos que teve no Brasil nos séculos 19 e 20, a tuberculose segue fazendo vítimas a cada ano no país: são 78 mil novos casos por ano e 4,5 mil mortes em decorrência da enfermidade.

Apesar de representar um desafio persistente para a saúde pública brasileira, a tuberculose ainda tem modelos de tratamento e testagem muito defasados no Brasil. Um dos principais gargalos é a transmissão da bactéria causadora da condição: se estima que cada paciente infectado transmita a bactéria a uma média de 15 pessoas.

Em 2022, o governo criou um plano de metas para eliminar a doença até 2035 — um dos principais desafios é atualizar o sistema e conter o avanço da doença. Para isso, o Sistema Único de Saúde (SUS) mudou a sua forma de testagem para tornar o diagnóstico mais preciso e tem incentivado a pesquisa de novos remédios no Brasil.

Mudanças no teste de tuberculose
A tuberculose é uma doença bacteriana causada pelo bacilo de Koch e que afeta os pulmões do hospedeiro. Em geral, por demorar anos para causar os primeiros sintomas, só é tratada quando já está em estágio avançado. Por isso, o diagnóstico precoce é tão importante.

Em julho passado, um novo exame entrou na lista da saúde pública brasileira para agilizar esse processo. No InterferonGamma Release Assays (Igra), o sangue do paciente é coletado em quatro tubos e levado para análises laboratoriais que levam até 24h para dar o resultado.

Anteriormente, o SUS oferecia apenas a prova tuberculínica: o exame é recomendado para saber se pessoas têm a bactéria causadora da tuberculose, mas ainda não manifestaram os seus sintomas, o que pode levar anos.

Neste tipo de teste, se aplica na veia do indivíduo uma substância que reage até 72h depois, formando uma espécie de caroço que deve ser medido na régua. Se for formada qualquer bolota superior a 5 mm, o exame é considerado positivo — mas o paciente precisa voltar ao hospital para as medições.

“O Igra oferece um diagnóstico mais rápido e consegue identificar a tuberculose em sua fase latente, ou seja, quando a contaminação já existe, mas ainda não apresenta sintomas e não é transmissível”, explica Raphael Oliveira, gerente regional da América Latina da QIAGEN, a multinacional fornecedora dos insumos para a realização do teste.

No SUS, o novo exame é indicado para pessoas que vivem com o HIV (que costumam ser gravemente afetadas pela tuberculose); crianças maiores de 2 anos e menores de 10 que estiveram em contato com pacientes com tuberculose ativa; candidatos a transplante de órgãos e indivíduos com doenças inflamatórias imunomediadas, como a psoríase e a doença de Crohn.

Por enquanto, outros pacientes com suspeita de tuberculose continuarão fazendo a prova tuberculínica.

Mudanças no tratamento no futuro
O tratamento de tuberculose também é um grande desafio: apesar de ser oferecido gratuitamente pelo SUS, ele dura no mínimo seis meses e, por isso, muitas pessoas acabam abandonando a terapia antes da conclusão. Nas primeiras semanas, já se observa a melhora dos sintomas, mas a bactéria permanece inoculada e, se a medicação for interrompida, existe a possibilidade de desenvolvimento de infecções mais resistentes.

São utilizados quatro medicamentos para o tratamento da tuberculose no Brasil: rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol. Porém, conforme o paciente interrompe o uso dos remédios, a bactéria vai ganhando resistência às opções disponíveis. Por isso, o país tem investido também na busca de novos fármacos.

O Instituto de Química da Universidade Federal Fluminense (UFF), por exemplo, tem se debruçado sobre o assunto para propor novas alternativas.

A professora Vanessa do Nascimento, responsável pela pesquisa, aponta que falta interesse e investimento das indústrias, uma vez que grande parte da população acometida pela tuberculose atualmente é a de baixa renda.

Vanessa explica que o principal medicamento utilizado, a isoniazida, além de gerar efeitos colaterais pesados para o fígado, não possui mais grande eficácia no Brasil. As cepas que seguem circulando no país já criaram resistência ao fármaco.

“Por isso, é necessário ingerir mais remédio, o que leva a uma demora maior para matar a bactéria e ela cria mais resistência, além de gerar ainda mais efeitos colaterais”, diz a professora.

O grupo de Vanessa tem trabalhado no desenvolvimento de versões melhoradas do tratamento atualmente disponível, com a inclusão de novos compostos para tentar quebrar a resistência das bactérias que circulam no Brasil.

Os resultados da combinação química proposta pela UFF devem ser publicados ainda em agosto.