Ao longo dos anos as hepatites virais vem sendo consideradas um grave problema de saúde pública global, embora no Brasil e no mundo tenhamos avançado consideravelmente no enfrentamento delas, especialistas continuam alertando sobre a doença e incentivando testagem em massa, prevenção e tratamento das mesmas.

“A gente tem um cenário bastante razoável. No Brasil, nos últimos anos, temos realmente incorporado as novidades de tratamento no SUS. Tratamos todos os pacientes com hepatite C, temos medicações para tratamento da Hepatite B, também temos vacina para as infecções do tipo A e B no Programa Nacional de Imunizações”, explicou o dr. Álvaro Furtado, infectologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e do Centro de Referência e Treinamento em IST/Aids de São Paulo.

Mas apesar de celebrar o atual cenário brasileiro e global no controle das hepatites e enxergar os próximos passos com bastante otimismo, o médico diz que a luta frente à essas infecções podem não recuar.

“Claro que existem outros desafios, mas não podemos dizer que não avançamos, avançamos sim no tratamento e na incorporação de novas tecnologias. No entanto, as hepatites virais ainda são um grande problema de saúde pública, pois elas ainda causam morbidade e internação, principalmente as hepatites crônicas que são as do tipo B e C, com risco associado de cirrose e câncer de fígado. O médico explica que algumas complicações causam até mesmo hepatite fulminante e em alguns casos é necessário transplante hepático.”

Casos

De 2000 a 2021, foram notificados 718.651 casos confirmados de hepatites virais no Brasil. Destes, 168.175 (23,4%) são referentes aos casos de hepatite A, 264.640 (36,8%) aos de hepatite B, 279.872 (38,9%) aos de hepatite C e 4.259 (0,6%) aos de hepatite D. E segundo dados da OMS (Organização Mundial da Saúde) todos os anos a doença ainda mata quase 1 milhão e meio de pessoas em todo o mundo. Além disso, é estimado que sozinhas as hepatites são responsáveis por 57% do total de casos de cirrose e por 78% dos diagnósticos de câncer hepático.

No território nacional as hepatites A, B e C são as mais comuns, entre elas, a do tipo A é a mais recorrente. Somando mais da metade de todos os casos, ela se concentra nas regiões norte e nordeste do país. Já as demais (D e E), estão mais presentes na Ásia e no continente Africano, de acordo com o Ministério da Saúde.

“Então a gente tem sim um problema de saúde pública, os desafios ainda são enormes do ponto de vista global, e não só do ponto de vista nacional’’, explanou Álvaro. “Especialmente desafios para aumentar a cobertura vacinal, tratar um número maior de pessoas fazendo diagnósticos mais precoces, testando as populações mais vulneráveis…’’, concluiu.

Segundo o médico hepatologista do Hospital Santa Catarina – Paulista, Dr. Isaac Altikes, a fase mais aguda acomete 10% dos pacientes e os sintomas quando apresentados geralmente se caracterizam por cansaço, febre, enjoo, vômitos, dor abdominal, urina escura, mal-estar e a icterícia, que são os olhos e pele amarelados.

Por isso, os especialistas garantem que a ação mais importante hoje segue sendo a testagem contínua. Eles defendem a amplificação da testagem por ser uma doença majoritariamente assintomática, ou seja, que raramente manifesta sintomas, por isso, a testagem em massa torna-se ainda mais crucial. Quanto mais rápida é a descoberta acerca da condição patológica do paciente, mais êxitos os resultados de tratamento podem ter.

Autoteste

O infectologista Álvaro Furtado enxerga o autoteste também como um aliado para que essa realização de diagnóstico precoce dos pacientes seja viabilizada, especialmente encontrando os pacientes que tem hepatite silenciosa (Hepatite C). Segundo ele, dessa forma a gente consegue tratar essas pessoas e evitar todos os problemas relacionados a evolução da hepatite B e da hepatite C.

O hepatologista Altikes compartilha da mesma ideia, mas recomenda para detectar a doença, que o diagnóstico seja feito de preferência através de exames de sangue e enfatiza “É importante que a coleta sanguínea seja realizada ao menos uma vez na vida, principalmente por aquelas pessoas que têm uma vida sexual ativa desprotegida e com diferentes parceiros, assim como pessoas que realizam tatuagens e aquelas que se submetem também a outros tipos de procedimentos que se utilizam de acessórios cortantes ou perfurantes como, por exemplo, agulhas, seringas e alicates.”

Os usuários de drogas injetáveis podem se tornar um dos grupos capazes de apresentar maior prevalência, por exemplo, das hepatites tipo B e C, já que sua contaminação pode acontecer por meio de contato com sangue contaminado.

Atualmente, cerca de 11 milhões de pessoas no mundo injetam drogas no corpo, metade delas estão vivendo com hepatite C, aponta o Relatório Mundial de Drogas realizado no último ano.

Também é importante vacinar! As vacinas são outra forma eficaz e efetiva de combate as infecções. Atualmente existe imunização para as hepatites A e B, estão disponíveis gratuitamente no SUS (Sistema Único de Saúde) e a aplicação pode ser feita desde o nascimento.

“São vacinas extremamente seguras, sem ambientes adversos, e com alto potencial de eficácia de proteção’’, garante o infectologista.

No tocante a hepatite do tipo C, ainda não existe vacina, mas há medicamentos com até 95% de chances de cura para os casos.

E mesmo com vacinas, as hepatites A e B também possuem medicamentos à disposição, todos são distribuídos pelo SUS.

Para os tipos D e E, na ausência de imunizantes, medicamentos são utilizados a fim de diminuir o dano hepático. E a prevenção consiste em: evitar compartilhar materiais que entraram em contato com sangue e utilizar preservativos. É uma doença transmitida pelo sexo, então devemos falar sobre prevenção sexual.

Recomenda-se evitar banhos em lugares próximos ao esgoto, sempre limpar a mão, e manter a higiene pessoal em dia.

Mas dr. Álvaro também cobra das autoridades públicas melhoramento do saneamento básico no Brasil nas áreas que estão em maiores condições de insalubridade.

O médico propõe implementação de estratégias para atrair essas pessoas às campanhas de detecção de diagnóstico.

E para além disso, é fundamental empoderar e ensinar os clínicos, e todos os profissionais que atendem essas pessoas na atenção primária a solicitarem esses exames, promover fluxo de tratamento…“Precisamos empoderar esses profissionais para que eles também tratem esses pacientes, e não só nós os infectologistas”, opinou.

Dr. Altikes, considera que quando detectadas, o tratamento para as hepatites deve ser feito considerando cada uma na sua especificidade, já que elas variam entre si ‘’O tratamento de cada tipo vai depender de sua característica, deve ser realizado de forma diferente a depender do estágio da doença’’, concluiu o hepatologista.

Kéren Morais (keren@agenciaaids.com.br)

Dica de entrevista:

Associação Brasileira dos Portadores de Hepatite (ABPH)

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