Estamos há 11 dias da 25ª edição da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, que neste ano traz como tema central HIV/Aids: Ame + Cuide + Viva +. O evento será realizado no dia 6 de junho, totalmente online e vai reunir artistas, influenciadores digitais e convidados. Serão oito horas de transmissão ao vivo com shows e muita informação em torno da temática. Para saber como é construída e realizada a maior Parada do Orgulho LGBT do Mundo, a Agência Aids conversou, na live dessa terça-feira (25), com integrantes da organização saber mais sobre os bastidores do evento.

Em bate-papo com a jornalista Roseli Tardelli, o vice presidente da Associação da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, ONG responsável pela realização da Parada, Renato Viterbo, e o secretário Diego Oliveira falaram sobre os desafios de abordar o tema HIV/aids na Parada, revelaram que essa edição terá muitas novidades, elegeram a Parada de 2018 como a mais difícil em termos de organização e contaram que no ano passado, por conta da pandemia, tiveram muitas dificuldades para conseguir patrocínio para o evento.

Renato frequenta a Parada desde 1999, ele era uma das pessoas que carregava a extensa bandeira LGBT na Av. Paulista. Diego começou a frequentar o evento anos mais tarde e foi pela primeira vez escondido, ainda quando se apresentava com heterossexual.

Inspirada nas gay pride parades realizadas desde 1969 nos Estados Unidos, a primeira Parada do Orgulho Gay reuniu em São Paulo cerca de 2 mil pessoas que protestaram contra a discriminação e a violência sofridas por gays, lésbicas e travestis, em 1997. Nos anos 2000, a parada de São Paulo cresceu e o número de paradas semelhantes no país também. A edição com maior número de participantes seria a de 2012, com 4,5 milhões de pessoas, segundo organizadores.  Apesar de ser uma grande festa, com música e diversão, também é um movimento com importância histórica, sempre pautando temas atuais, políticos e pertinentes.

“A Parada foi crescendo, em 2006 levamos 3 milhões de pessoas para Av. Paulista. A parada de São Paulo se tornou a maior do mundo por conta da escolha de calendários. Muito sabiamente os primeiros diretores da Associação da Parada escolheram realizar o evento sempre depois do feriado de Corpos Christi. É um feriado prolongado, as pessoas poderiam viajar para São Paulo para conhecer a Parada”, contou Renato, acrescento que “a igreja achava que era uma afronta, mas era algo estratégico no sentido de juntar gente.”

Diego, que também é ator, modelo, drag queen e maratonista, disse que o atletismo sempre o ajudou muito com o trabalho que ele realizada na Parada o ano todo. “É uma ultramaratona correr atrás recursos, parceiros, organização. Precisa de fôlego.”

Ele continua: “Quando me assumi LGBT descobri que a corrida é algo que me dá muito prazer. Hoje, eu consigo incentivar as pessoas a praticarem esportes. Muitos LGBTs não praticam esportes por serem LGBTs. Muitos meninos deixaram de jogar futebol por serem afeminados. Há muitas pessoas trans que querem jogar vôlei e são discriminadas. Correr também é uma forma de ativismo.”

Roseli quis saber dos organizadores se a Parada ajuda as pessoas a se empoderar e ser o que são.

Renato garantiu que sim. “a pessoa que vai pela primeira vez na Parada, é LGBT e teve suas crises de identidade, quando chega ao evento e encontra pessoas iguais a ela, se sente empoderada. Você vê na Parada milhões de semelhantes na mesma luta, batalhando por espaços e pelo direito de existir. De ser livre, ter uma família. De conquistar o seu lugar ao sol.”

Diego também acredita que a parada tem o poder de transformar em todos os sentidos, quebrar barreiras, e diminuir o preconceito. “Quando estive na Parada pela primeira vez me senti fortalecido para assumir ser quem eu sou. Nunca mais perdi uma noite de sono”.

Escolha do tema

Até 2014, o tema da Parada era escolhido pela diretoria e seus associados. “Em 2015, abrimos o Fórum ‘Que Parada nós Queremos’. E a partir começamos a chamar todos os ativistas para compor na escolha do tema.  Isso acontece por volta de setembro, quando encerramos a temática anterior. Temos em média duas reuniões por mês, as pessoas escolhem aproximadamente 10 temas, depois fazemos uma votação, reduzimos para cinco, tiramos três e ai sim temos a votação final”, descreveu Renato.

Mas nem sempre a escolha do tema é fácil. Segundo Diego, “pensar de forma coletiva é algo complicado, principalmente quando as pessoas têm interesses pessoais. Nos últimos cinco anos, vimos no Fórum pessoas que participam da escolha do tema e depois some. Todas as demandas e causas são necessárias e importantes. A gente tenta de forma equilibrada e com diálogo articular e decidir o que vamos dar visibilidade no próximo ano.

Ame+, Viva+, Cuide+

O tema deste ano, que é HIV/aids, começou a ser discutido em 2019. “A Associação da Parada sempre trabalhou com essa temática, várias campanhas eram feitas, as paradas recebiam fomento do Ministério da Saúde e das secretarias. “O tema HIV/Aids: Ame + Cuide + Viva + é um alerta para a sociedade combater os estigmas e preconceitos que cercam o vírus, mas também é um convite para celebrar a vida, a alegria e a união das pessoas LGBT+ e de toda a sociedade”, disse Diego.

Roseli afirmou na live que vai a Parada desde a primeira edição, em 1997. “A Parada é um momento único. É uma grande rede de amor.”

Desafios e polêmicas

Uma das maiores polêmicas da Parada nos últimos anos foi em 2015, na 19ª edição,  quando a atriz transexual Viviany Beleboni, se prendeu à cruz, encenando o sofrimento de Jesus, para “representar a agressão e a dor que a comunidade LGBT tem passado”.

“Fomos pegos de surpresa, não sabíamos que teria essa ação. A iniciativa foi de uma ONG e a gente reconhece essa ação artística como muito forte, impactante e necessária. Não estávamos preparados. A Associação, enquanto organizadora e detentora da marca, acabou respondendo processos durante um ano, recebemos várias intimações de atentados de violência ao pudor”, relembrou Diego.

“Os processos correram e findaram. Ações como a da Viviany, o próprio Neymar já tinha feito, a Madonna. Não teve tanta repercussão porque não era uma mulher trans, um LGBTQIA+”, acrescentou Renato.

Renato disse ainda que a Associação da Parada  poderia ter sido punida com essa ação porque assinou, em 2007, um termo de ajustamento de conduta. “Poderíamos ter sido punidos com a não realização da Parada por qualquer ato de vandalismo ou brigas que tivesse naquele local. Mas foi legitimo e lindo a Viviany estar ali. Tudo que mexe com fé e dogmas causa polêmica.”

Roseli quis saber qual foi a edição da parada que mais deu dor de cabeça. Renato garantiu que foi a de 2018, com a greve dos caminhoneiros. “A Parada quase ficou sem palco e sem Trio Elétrico. Estávamos com a feira da diversidade montada e não tinha palco. Nós da organização ficamos até meia noite tentado resolver. Conseguimos um palco menor, deu tudo certo e a feira foi um sucesso.”

Diego contou ainda que neste ano “a programação estava pronta. Os trios estavam todos parados na estrada. O que acalmou os organizadores é que a Marcha para Jesus ia acontecer na quinta. Usamos os mesmos trios na Parada. A questão do palco era muito importante. A feira é um momento de socialização, onde os artistas estão presentes.”

Sobre a Parada mais fácil, os dois garantiram que todas são difíceis. “Os problemas começam a aparecer em cima da Parada. Temos que resolver tudo, inclusive a infraestrutura. A gente nunca sabe que surpresa teremos, mas sempre esperamos que dê tudo certo. Não aceitamos falhas. É uma cobrança muito grande entre nós. Queremos sempre superar a parada anterior”, disse Renato

Parada na pandemia

Outra curiosidade da Roseli foi sobre a primeira edição totalmente online da Parada do Orgulho LGBT. Devido as necessidades de distanciamento social impostas pela chegada do novo coronavírus, não estava permitido aglomerações. “Quando vocês disseram que a parada não ia para rua o ano passado?

“Pensamos em realizar o evento no final do ano. Logo o Diego deu a ideia de fazermos uma Parada Virtual. Não tínhamos ideia de como seria, fomos atrás dos nossos parceiros e construímos. O nosso projeto saiu do papel em um mês, tivemos uma maratona de reuniões. Estávamos fazendo algo novo e foi um sucesso. Tivemos 97,5% de acertos”, revelou Renato.

Segundo Roseli, “a pandemia tem sido um aprendizado global. É claro que queríamos estar na rua, embaixo da bandeira, mas temos que fazer o que é possível neste momento.”

Divulgação

O ator Drew Persi, que vive com HIV e tem um canal no youtube especializado no tema, quis saber porque a edição que vai tratar o tema aids está sendo menos divulgada.

Diego garantiu que o calendário está seguindo o calendário das edições anteriores. “A divulgação de artistas sempre acontece na semana da Parada. Não é a ONG que paga cache de artista, são os nossos patrocinadores, então a gente depende disso. Um ou outro artista que a gente consegue fechar antes. Nestes 25 anos, muitas vezes o tema era divulgado no mês da Parada.”

Em relação a construção do tema deste ano, “começamos com o Fórum.  O Matheus Emílio e o Luis França acompanharam 70 horas de escuta de pessoas que vivem, convivem e trabalham com a pauta aids desde dezembro, isso inclui Mopaids, Fórum de ONG/Aids, Rede de Jovens, AHF, Secretarias Estadual e Municipal de Saúde, Ministério da Saúde, ativistas independentes. A Parada não acontece só em junho, é o ano todo. Em janeiro, o nosso grupo de jovens começou o ano falando da questão da saúde sexual. O lançamento do tema da Parada foi em março, tivemos uma programação no Encontro virtual de Organizadores de Paradas. Há uma comunicação que estamos fazendo ao longo do ano, sempre com muito cuidado. O tema HIV/aids é muito sensível e delicado, fomos em busca de fontes e referências.”

Renato acrescentou que a Associação “não está empoderada para se apropriar de uma pauta que já existe. O movimento aids existe há mais de 40 anos, são essas pessoas que estarão na live. Este é o tema central, vamos promover várias discussões, vamos deixar que essas pessoas sejam as protagonistas. A Associação da Parada abre as portas para que o Movimento de Aids mostre o que está acontecendo. Este tema foi construído também em parceria com o Unaids.

Questionados sobre o número de pessoas que estão diretamente ligados a organização da Parada, Diego revelou que 21 pessoas formam a diretoria da Associação da Parada e são justamente essas pessoas que trabalham de forma voluntária para a realização do evento.

“Existe o mito de que a Parada tem muito dinheiro, não é verdade. Começamos o evento sem dinheiro e terminamos sem. Pagamos todos os nossos fornecedores, o que sobra é para a manutenção da Associação até o ano seguinte”, afirmou Renato.

“Nos últimos 5 anos temos tido uma credibilidade maior com as marcas e empresas. A Parada de São Paulo não recebe dinheiro público, o que temos é um aporte em prestação de serviços da Prefeitura de São Paulo. A Parada traz quase 300 milhões em impostos para a cidade. Todo dinheiro é com prestação de contas.”

Se reinventar na pandemia

“A gente está sempre se reinventando, mesmo com a pandemia, construímos uma parada virtual em 30 dias, com 11 milhões de acesso.  A parada física, com a mesma transmissão, chegou a 6 milhões. Recebemos vários comentários de pessoas dizendo que estavam se sentindo como se estivessem na Paulista.”

Roseli quis saber o que o pessoal da aids pode esperar da edição deste ano.

“Os pilares do tema deste ano que é Ame +, Cuide + e Viva +  é o que está orientando a live do dia 6. A questão do HIV/aids e os desdobramentos serão colocados nesta live. Vamos celebrar a vida, a prevenção, a esperança da vacina. Esperamos que a gente consiga trazer este sentimento”, disse Diego.

O maratonista aproveitou para relembrar que a Associação da Parada trabalha a questão do HIV/Aids há muitos anos e as pessoas não sabem. Desde 2017, temos o trio da AHF e eles levam de forma escancarada a questão do HIV/aids.  Tivemos uma certa resistência das próprias pessoas que vivem e convivem com HIV/aids. Estamos tendo muito cuidado na nossa comunicação, vamos abordar o tema de forma leve, a ideia é atrair mais pessoas para essa discussão.”

Renato também acredita que a Parada de 2021 será um sucesso, “as discussões sobre HIV/aids vão acontecer de forma leve, vamos levar profissionais para desmistificar as informações. O próprio Camarote é uma ação que acontece na Parada e existe para acolher as pessoas com HIV/aids. A aids ainda mata muita gente no Brasil, mas há também muita gente vivendo, com boas condições de saúde. É essa informação que queremos levar. Vamos falar de prevenção combinada, das outras ISTs. Este tema veio muito oportunamente. Precisamos falar de HIV/aids de forma natural, com respeito e sem preconceito.”

A live chegou ao fim com o desafio de resumir em uma palavra a 25ª edição da Parada LGBT. Para Diego, essa será a Parada será marcada pelo amor, Renato acredita que será a Parada da esperança.

Você pode rever a live nas redes oficiais da Agência Aids.

Para os amantes do áudio, a conversa também está disponível em podcast:

 

Talita Martins (talita@agenciaaids.com.br)

 

Serviço:

25ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (2021)

Data: 6 de junho, a partir das 14h

Tema: HIV/Aids: Ame + Cuide + Viva +

Onde: No YouTube, nos canais da APOLGBT-SP, Dia Estúdio e dos apresentadores

Mais informações sobre o tema, acesse o Manifesto oficial da 25ª edição da Parada.

http://www.paradasp.org.br

 

Dica de entrevista

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