Em recente entrevista publicada no Estadão, nossa sempre guerreira na luta contra o HIV, Lucinha Araújo, registrou: “A aids foi esquecida porque saiu de moda falar sobre o assunto”. Absolutamente correta em sua pertinente e adequada assertiva. Foi esquecida pela grande mídia e meios de comunicação em geral; foi esquecida pelo Poder Público: Executivo, Legislativo, Judiciário, pela Federação, Estados e Municípios.
São raras as exceções e os momentos em que essas instâncias, que um dia foram o carro chefe da promoção do conhecimento e disseminação dos recursos disponíveis para a prevenção, têm estado presentes.
O Dia Mundial deixou de ser motivo de apreciação e difusão pela grande mídia, possivelmente por ter sido sua existência banalizada e relegada uma agenda minúscula. Difundir o quê, se o que se tem implementado é uma proposta acanhada, talvez até mesmo envergonhada? Não se pode ferir ouvidos susceptíveis do moralismo fariseu e referencia de sustentação política de agendas nem sempre as mais republicanas.
Onde tem estado o lançamento e divulgação dos boletins nacionais, fruto de discussão de debates pela sociedade como um todo e particularmente pelos segmentos mais envolvidos? Sempre uma oportunidade para mobilização de atores essenciais na sustentação política de uma agenda cuja visibilidade se traduz em garantia de mais recursos para a ampliação das ações desenvolvidas.
E as campanhas nacionais de prevenção? Há um bom tempo praticamente desapareceram dos meios de comunicação. Lembro-me de nosso saudoso e querido Betinho na década de 80: As campanhas da aids se limitam ao carnaval e finados (referindo-se ao Dia Mundial de Combate a Aids). Houve momentos de até 5 campanhas anuais nacionais sob o comando do Ministério da Saúde e ultimamente, o Betinho teria saudades daquelas de apenas carnaval e finados…
A mobilização e envolvimento do setor empresarial desapareceram há quase uma década ou mais. A agenda de prevenção da infecção pelo HIV e antidiscriminação no local do trabalho passou a ser secundaria e mais secundário ainda o envolvimento das empresas e do Ministério do Trabalho.
Não pretendemos ser exaustivos, apenas alguns exemplos para corroborar aquilo que foi afirmado pela Lucinha…
O advento de novas tecnologias de prevenção não reduz a importância ou mesmo elimina a necessidade de uma permanente mobilização da sociedade, pelo contrario, representa mais uma oportunidade de se ampliar o leque das ações.
O grande avanço no tratamento antirretroviral com drogas mais eficazes e de menos efeitos colaterais, o sucesso obtido na utilização de medicamentos na prevenção, representam um grande logro, mas não significam a solução definitiva do problema.
Vale registrar, que apesar do hercúleo esforço com vistas à obtenção da vacina, ainda não dispomos de um produto cuja eficácia possa vir a superar a existência do HIV como um problema de saúde publica.
Nossas esperanças, todavia, se concentram na nova gestão do Ministério da Saúde, comprometida com a fundamentação cientifica das ações. Que a agenda retrograda e conservadora de atores externos, politicamente influentes, não sejam obstáculo para que possamos retomar a necessária agenda de prevenção-sem-preconceitos, sem o constrangimento de difundir de modo explicito aquilo que é pertinente, reposicionando assim a necessária ação programática.
* Pedro Chequer é médico epidemiologista e ex-diretor do antigo Programa Nacional de Aids.
Contato: pchequer11@gmail.com