Ausência brasileira no evento e desaceleração da resposta ao HIV do país foram duramente criticadas

Na noite dessa terça-feira (8), a infectologista Adele Benzaken e os ativistas Toni Reis e Javier Angonoa participaram da live “Ecos de Montreal”, organizada pela Agência Aids. Em um bate-papo descontraído com mediação da jornalista Roseli Tardelli, diretora desta Agência, os três compartilharam suas experiências e relembraram os principais momentos da 24ª Conferência Internacional de Aids (Aids 2022), que aconteceu no final de junho, no Canadá.

Os brasileiros se queixaram sobre a ausência de um estande do Brasil no principal evento de aids do mundo. Dra. Adele, que já esteve à frente do Departamento de Aids no Brasil, lembrou que o estande era uma marca registrada do país em todas as edições da Conferência. “Na Conferência de Amsterdã, em 2018, última edição antes da pandemia, nosso espaço foi visitado por praticamente todas grandes personalidades da luta contra aids, tínhamos uma agenda pesada’’, comentou.

A médica não sentiu falta somente do estande, mas também da participação e representação brasileira como um todo nas diferentes mesas. “Em Amsterdã, o Brasil foi convidado para doze mesas, e era tido como campeão. A quantidade de trabalhos apresentados pelos próprios técnicos do Ministério e pela delegação do Brasil era bastante representativa. Foi muito triste ver essa baixa representatividade’’, lamentou, completando que ouviu na Aids 2022 duras críticas feitas ao Brasil acerca da desaceleração do país no enfrentamento e na resposta ao HIV.

I=I

Questionado por uma internauta sobre quais foram os destaques da Aids 2022, Javier, que é ativista independente e consultor, destacou os debates sobre a estratégia I=I (Indetectável é igual a intransmissível). “Estamos no caminho certo, o caminho para o final da epidemia é quebrar as barreiras de transmissão do vírus, e uma delas é que as pessoas soropositivas não tenham mais em si essa carga de viver com HIV.”

Segundo o educador, o I=I permite que a discriminação e o peso da culpa imposta sob essas pessoas sejam retirados, diante de uma doença que é absolutamente passível de ser controlada. Consequentemente, uma melhor qualidade de vida também é proporcionada a estas pessoas.

Adele puxou o gancho no assunto e completou o comentário feito por Javier dizendo que houveram diversas manifestações no evento em relação a campanha I=I com narrativas de esperança, mas que também se apresentou uma demanda e uma cobrança muito marcante aos profissionais de saúde exigindo melhor capacitação médica na abordagem do tema. “A demanda era muito maciça”, lembrou.

Javier concordou com dra. Adele, mas levantou um ponto que considera importante: para que a estratégia I=I seja de fato efetivada, é preciso acesso a diagnóstico e tratamento.

Novas formas de ativismo

Já o ativista Toni Reis, da Aliança Nacional LGBT, falou sobre as novas formas de ativismo. Ele exemplificou que o ativismo online, a mobilização em prol do combate a monkeypox, levantamento de dados robustos e, em especial, o engajamento da juventude foram os pontos altos.

“A juventude estava extremamente mobilizada e não só a juventude gay, a juventude trans. Estava todo mundo junto e misturado trabalhando. Eles estão unificados e interseccional, e eu gostei muito”, completou.

Toni também comentou que a população africana estava em peso na conferência e comparou com os países da América Latina. “Temos muito a aprender com os africanos e africanas, precisamos nos mobilizar mais. Para isso, precisamos voltar à base, com oficinas, capacitações e formações para o advocacy junto a juventude que tem muito potencial. Precisamos convencer os jovens que vale a pena lutar, seja através da internet, das marchas ou das novas tecnologias.”

Ucrânia

Outro internauta questionou a situação de pessoas vivendo com HIV/Aids na Ucrânia, já que o país atualmente está em guerra.

Javier acredita que este problema se sobressai as outros. Omissão da imprensa sobre a Conferência, a população refugiada, os povos indígenas, a preservação do ambiente, os métodos contraceptivos femininos, educação sexual nos ambientes escolares, inacessibilidade financeira aos novos medicamentos para HIV/aids e o desgaste dos movimentos sociais foram também temáticas exploradas.

Ao final da discussão, Roseli perguntou aos convidados se o Brasil tem condições de receber uma conferência como essa. Em unanimidade, todos eles disseram que o país possui todas as condições de sediar um evento deste porte, e o fato de ser um país extremamente hospitaleiro é um facilitador.

A conversa foi finalizada com um jogo de palavras onde cada um resumiu em uma palavra o que a Aids 2022 significou para si. Roseli falou em esperança, dra. Adele disse forças para continuar, para Toni Reis a palavra é energia e Javier finalizou com conhecimento.

Confira a seguir o bate-papo na íntegra: 

Dica de entrevista:

International AIDS Society

E-mail: info@iasociety.org / @iasociety

Kéren Morais (keren@agenciaaids.com.br)