O envelhecimento da população é um dos maiores triunfos da humanidade e também um grande desafio. Para quem se preocupa com a saúde e quer ter uma velhice com mais qualidade de vida, alguns hábitos, como boa alimentação e atividade física, podem ajudar. O tema foi debatido na noite dessa terça-feira (29) na live: ‘Os desafios, conquistas e cuidados ao envelhecer com HIV’, da Agência Aids. A jornalista Roseli Tardelli reuniu um time especialistas e pessoas vivendo com HIV na terceira idade para um bate-papo em homenagem ao Dia Internacional do Idoso, comemorado sempre em 1º de outubro. Essa também foi uma oportunidade para lembrar que a idade chega para todos, e que, com ela, novas dificuldades devem surgir, mas que é possível envelhecer com qualidade de vida.

Roseli começou o bate-papo perguntando a Maria Elisa, do Movimento Nacional das Cidadãs Positivas, o que significa para ela envelheCEr. “É um acumulo de experiências, uma dádiva divina. Fiz 67 anos e vivo com HIV há 31. Ter chegado a essa idade vivendo com HIV é um presente de Deus, pude fazer tanta coisa, aprendi muito e tive a oportunidade de conhecer muita gente.”

Na visão do seu José Armando, de 74 anos, “envelhecer é uma saúde que Deus dá para gente. Depois dos 50 anos você volta a ficar mais forte psicologicamente pelo que aprendeu, viveu e sofreu. Chegar a idade que eu cheguei, com saúde, é um poder da natureza.” Viúvo, ele vive com HIV há mais de uma década e garantiu que faz de tudo para se manter ativo, inclusive cozinhar, lavar roupas, passear com o cachorro, ir aoS jogos de futebol aos domingos e tomar até uma ‘cervejinha gelada’.

A infectologista Gisele Cristina Gosuen, responsável pelo Ambulatório de “HIV e o Envelhecer”, na Unifesp, também acredita que envelhecer é um privilégio. “Sempre digo aos meus pacientes que a muitas pessoas vivendo com HIV foi negada essa oportunidade no mundo. No começo da epidemia não tínhamos medicamentos que pudessem interromper o progresso da doença. O envelhecimento saudável deveria ser uma meta de todos nós, independentemente do status sorológico.”

Para Jean Dantas, diretor do Núcleo de articulação com sociedade civil organizada e assessor da gerência de planejamento do CRT de São Paulo, envelhecer é uma vitória. “As pessoas que estão envelhecendo com HIV puderam chegar até aqui, constituíram famílias, tiveram a oportunidade de ver seus filhos crescerem, seus netos, oportunidades de ter trabalhos. A aids ceifou a vida de uma geração, ainda bem chegamos até aqui, vivemos e podemos comemorar a possibilidade de não transmitir o vírus para outras pessoas desde que façamos o tratamento corretamente.”

O cientista social e mestre em Saúde Coletiva Renato Barboza completou o time de especialistas da live. Segundo ele, envelhecer é conseguir reconhecer as conquistas e os desafios que enfrentamos ao longo da vida. “Quando a gente começa a envelhecer, nos damos conta desta trajetória, é um privilégio, principalmente envelhecer com saúde, inserido socialmente, com grupos de afetos. Por outro lado, é desafiador quando a gente pensa na trajetória das pessoas vivendo com HIV/aids. Na década de 80 até meados dos anos 90, antes do coquetel, a gente tinha outro cenário. Graças a ciência, aos avanços tecnológicos e ao Sistema Único de Saúde, conseguimos mudar o quadro. Hoje, podemos até em falar em pessoas vivendo com HIV/aids, pessoas indetectáveis.”

Envelhecimento ativo

Roseli quis saber como tem sido o envelhecimento ativo de Maria Elisa e José Armando.  Elisa garantiu que sua agenda de atividades se mantem sempre cheia. “Além da militância, trabalho com comida e recentemente me inscrevi em um grupo de ginástica. Tive covid em janeiro, fiquei com muitas dores muscular e na próxima semana devo começar a atividade física. Caminho muito, me movimento bastante e aos finais de semana sou babá de dois pré-adolescentes.”

Já José Armando contou que não se sente velho. “Sou idoso por causa da idade, mas faço de tudo um pouco. Até aprendi a cozinhar.”

Segundo explicou a infectologista Gisele, envelhecimento ativo é praticamente a vida que o José Armando leva. “O fato dele cuidar da própria casa, passear com o cachorro, vida social com os amigos. O tabagismo e as bebidas alcoólicas não são hábitos saudáveis, mas ter uma vida ativa faz com que você tenha um envelhecimento saudável. Por isso, sempre incentivo os meus pacientes a manter uma dieta equilibrada e a praticar atividade física.”

Medo da solidão

A jornalista questionou ainda Jean Dantas sobre quais são as principais queixas e vitórias das pessoas com HIV com mais de 60 anos. “Existe o grande medo da solidão e do estigma. Tivemos muitos avanços nos últimos anos, mas o estigma ainda é muito presente. Existe também a preocupação sobre como estará o corpo com o passar dos anos, sobre efeitos colaterais do tratamento a longo prazo. No passado, tínhamos a questão da andropausa e da menopausa, o envelhecimento interno das pessoas com HIV é um pouco avançado, existe o envelhecimento celular causado pelo processo inflamatório continuo. E isso gerou muito medo. Mas sempre digo que a rede de apoio é fundamental. A solidão potencializada por um estigma na população idosa é um grande desafio.”

Na avaliação dos especialistas, ainda é preciso avançar bastante na política pública. “Já temos ambulatórios específicos, como o da Unifesp, mas temos que caminhar bastante no Brasil. Avançamos, os medicamentos mais novos são menos tóxicos. Os antirretrovirais são aliados da vida. Mas o processo de envelhecimento faz com que os nossos pacientes apresentem doenças próprias do envelhecimento: hipertensão, diabetes, osteoporose, todas as comorbidades que acometem qualquer indivíduo em idade mais avançada, a diferença é que nas pessoas vivendo com HIV isso acontece em uma idade mais precoce”, explicou a médica Gisele.

“O acesso a informação é fundamental para reduzir o peso do estigma. Muita coisa precisa ser revista, inclusive entre os profissionais da saúde. As pessoas precisam aderir também aos serviços de saúde”, acrescentou Renato.

O bate-papo durou mais de uma hora e está disponível na íntegra. Assista:

Redação da Agência de Notícias da Aids

Dica de entrevista

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Movimento Nacional das Cidadãs Positivas

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