A infância, considerada uma janela de oportunidades crucial para a saúde, o aprendizado, o desenvolvimento e o bem-estar social e emocional das crianças, também é marcada por desafios e por uma enorme curiosidade. Parafraseando o Unicef, órgão das Nações Unidas dedicado a proteger a infância e assegurar os direitos das crianças e adolescentes em todo o mundo, “cada criança é um futuro e merece a melhor chance possível”.
É nesse contexto que a saúde se apresenta como um pilar essencial, assegura a Organização Mundial da Saúde (OMS), que considera o letramento em saúde como o sexto sinal vital, além dos já conhecidos, que são: a frequência cardíaca, a frequência respiratória, a pressão arterial, a temperatura e a dor.
“Essa abordagem também é muito importante para as crianças, para que elas saibam como se cuidar e se empoderar para o autocuidado”, afirmou a médica Daisy Maria Machado, infectologista e especialista em doenças infecciosas em crianças e adolescentes.
Neste Dia das Crianças, justamente para entender melhor como abordar a sexualidade, [o que inclui os diálogos que cercam o mundo do HIV/aids], com este público, a Agência Aids bateu um papo com a profissional.
De acordo com a médica, essa educação não deve ser restrita aos adultos, os pequenos merecem, precisam e devem aprender a cuidar de si mesmo desde cedo. Os tutores dividem a desafiadora responsabilidade de capacitar os pequenos para o autocuidado; e é aí que a especialista pontua que a educação em sexualidade desempenha papel fundamental.
“Esse tema está relacionado ao que a gente entende por letramento em saúde, ou seja, é a capacidade dos indivíduos entender, obter e utilizar as informações da promoção da saúde. Isso é super importante”, explicou.
Linguagem simples
Dra. Daisy disse que em primeira instância, deve-se adaptar a linguagem às diferentes faixas etárias, tornando-a natural e compreensível. “A sexualidade é uma parte intrínseca da vida humana e deve ser tratada como tal, mas a profundidade da conversa deve ser ajustada à maturidade de quem está ouvindo”.
A médica ressaltou a importância de se criar um ambiente onde as perguntas fluam livremente e as respostas sejam claras, honestas e didáticas. Concomitantemente a isto, destacou que “temos que incentivar relacionamentos saudáveis, baseados no respeito, confiança e na comunicação aberta”.
Nesse sentido, recursos didáticos complementares, como livros e vídeos educativos, são ferramentas de apoio tanto para esclarecer o que é HIV/aids, quanto para ensinar sobre os conceitos relacionados à sexualidade.
Prevenção
No que diz respeito especificamente à prevenção do HIV/aids, ela reforça que “devemos orientar que essa é uma decisão individual, mas mostrar os benefícios da prevenção e que práticas seguras protegem tanto a saúde pessoal quanto a do parceiro ou parceira, independentemente do gênero”.
Segundo a infectologista, pais, docentes, e outras figuras de cuidado precisam conhecer a história e a evolução da epidemia de HIV/aids, bem como tudo que envolve a pauta.
“A adoção de uma cultura de não discriminação e aceitação entre crianças vivendo e convivendo com o HIV/aids é a chave da mudança. Abordar o tema desde a primeira infância é vital, assim a gente torna esse assunto habitual e interiorizado”, afirmou.
Ela continua: “Respeitar as crenças individuais e o ambiente cultural de cada um é essencial; porém, as informações precisam ser baseadas em evidências”, acrescentou ao esclarecer alguns dos equívocos e estigmas.
Autocuidado
A entrevistada reiterou que a função educativa e de autocuidado é uma estratégia eficaz, mas que para surtir efeitos e impactos positivos na vida de cada criança, “isso deve ser uma parceria entre escola, família e instituições de saúde”.
“Neste Dia das Crianças, lembramos que educação e saúde caminham juntas. A discriminação não deve ser tolerada, e é fundamental combater estigmas e preconceitos. O HIV continua sendo uma questão importante, muitas vezes negligenciada, e em termos de políticas públicas esse silêncio é prejudicial. A epidemia de aids ao longo dos anos foi marcada por desafios e conquistas, mas a ciência avançou, permitindo que crianças com HIV sobrevivessem e chegassem a adolescência’’.
“Não existe uma receita pronta, as famílias são únicas e tem suas particularidades, mas o objetivo central é criar ambiente de apoio, compreensão e abertura para esclarecimentos […] Crianças HIV+ que hoje são jovens e adultos cresceram em um mundo de discriminação. A questão principal para elas era o segredo, o medo de que seus filhos passassem pelas mesmas experiencias. Por muito tempo as pessoas tiveram medo, as escolas não queriam que as crianças participassem do recreio, das brincadeiras… isso é de outro tempo, mas ainda hoje ideias como essas circulam em muitos lugares e ambientes’’, refletiu.
Hoje tivemos essa maravilhosa conquista do I=I, a prevenção combinada… isso tirou o peso da culpa’’, finalizou.
Kéren Morais (keren@agenciaaids.com.br)
Dica de entrevista
CEADIPe / EPM – Unifesp
(011) 5576-4848