O Ministério da Saúde estima que mais de 100 mil brasileiros não sabem que têm o HIV (vírus da imunodeficiência adquirida). O dado é preocupante, pois quanto mais precoce é o diagnóstico e o início das medicações, menor é o impacto gerado pelo vírus no organismo, evitando a evolução para a Aids (síndrome da imunodeficiência adquirida) e outras infecções que afetam a saúde.

A primeira etapa do processo de tratamento e prevenção de transmissão é saber quem vive com o vírus. “Em alguns casos, uma pessoa com HIV possui a mesma expectativa de vida de outra da mesma idade sem o vírus, mas isso só ocorre se o diagnóstico for obtido no início da infecção”, afirma Bernardo Almeida, infectologista do serviço de vigilância epidemiológica do CHC-UFPR (Complexo do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná), ligado à rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), e diretor médico na Hilab, laboratório de análises clínicas.

Além disso, ao iniciar o tratamento e segui-lo, de maneira correta, o vírus fica indetectável no sangue, e a pessoa deixa de transmiti-lo e reduz os riscos de novas infecções.

Ao longo do ano passado, foram 50 mil novos casos no país, atingindo a marca de 960 mil pessoas vivendo com HIV. Destas, 27% ainda não recebem o tratamento. No mundo, são 38 milhões de infectados com o vírus.

Os testes para detecção do HIV permitem rapidez no início da terapia, previnem a evolução da doença e ajudam no controle da disseminação.

A testagem faz parte da base das estratégias da OMS (Organização Mundial da Saúde) para o controle da infecção até 2030. Dos países da América Latina, apenas o Brasil disponibiliza kits de autoteste por meio de serviços de saúde públicos ou privados ou farmácias, segundo dados divulgados recentemente no novo relatório do Unaids: Em Perigo.

Quem deve testar?

Todas as pessoas com vida sexual ativa devem realizar o teste que pode detectar a presença do HIV no organismo, uma vez ao ano. Em algumas situações, a frequência necessita ser maior, como no caso de múltiplos parceiros e entre os que praticam relação sexual anal.

“A testagem tem sido, nos últimos anos, direcionada de uma forma mais propositiva em populações de risco como gestantes no pré-natal, indivíduos privados de liberdade, homens que fazem sexo com homens e profissionais do sexo”, informa Sergio Ramos de Araujo, infectologista, supervisor da área assistencial de Doenças Infecciosas e Parasitárias do HC-UFPE (Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco), ligado à rede Ebserh, professor associado de doenças infecciosas e parasitárias do Centro de Ciências Médicas da UFPE e pesquisador da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).

Há outras indicações como no diagnóstico de ISTs (infecções sexualmente transmissíveis), após acidente com material biológico ou exposição sexual de risco.

Quais os tipos de testes existentes?

Os mais utilizados são os imunoensaios sorológicos que detectam os anticorpos contra o HIV. Há várias metodologias que evoluíram ao longo do tempo. Atualmente, segundo Almeida, os de quarta geração encontram tipos diferentes de anticorpos e o antígeno do vírus, fazendo com que identifiquem a doença em fase mais precoce e diminuindo o período da janela imunológica —período entre a infecção pelo HIV e a produção dos anticorpos contra o vírus pelo organismo em uma quantidade suficiente para serem detectados.

Os testes de primeira e segunda gerações descobrem apenas o anticorpo IgG, reagindo somente após 30 a 45 dias após o contágio. O de terceira geração já consegue detectar o IgM e o IgG —anticorpos que têm ação conjunta na proteção imediata e a longo prazo contra infecções—, passando a janela imunológica para 20 a 30 dias. Os mais recentes, de quarta geração, reduziram a janela imunológica para apenas 15 dias.

Segundo dados do Ministério da Saúde, a duração da janela imunológica é de 30 dias, mas esse período varia de acordo com a resposta do organismo e o tipo do método de testagem.

Caso o exame para detecção de anticorpos anti-HIV seja realizado durante o período da janela imunológica, existe a possibilidade de um resultado não reagente, mesmo que a pessoa esteja infectada.

Dessa forma, o Ministério da Saúde recomenda que, nos casos de testes com resultados não reagentes em que permaneça a suspeita de infecção pelo HIV, seja feito um novo após 30 dias. Saber quando ocorreu a última exposição de risco é essencial para a correta interpretação do resultado, segundo os especialistas.

É importante ressaltar que, no período de janela imunológica, o HIV já pode ser transmitido.

Testes rápidos

Na opinião de Almeida, o maior avanço recente no combate ao vírus da imunodeficiência adquirida foi o desenvolvimento dos testes rápidos —que ficam prontos entre 15 e 20 minutos—, e que podem ser realizados fora do ambiente laboratorial.

“Isso ampliou o acesso, em especial, para populações vulneráveis, e elevou a capacidade de diagnóstico do sistema de saúde.”

Os rápidos também acompanharam a evolução das gerações de testes, mas, além disso, segundo ele, ampliaram a capacidade de testagem da população ao serem mais simples, rápidos e disponíveis, mantendo alto nível de acurácia.

O diagnóstico da infecção pelo vírus pode ser feito com os rápidos, fazendo-os duas vezes usando marcas diferentes, com o resultado positivo, na explicação de Rodrigo Molina, infectologista, professor da UFTM (Universidade Federal do Triângulo Mineiro) e consultor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia).

Detectam o vírus pelo sangue: feitos por meio da punção de uma polpa digital e o resultado é liberado em poucos minutos. “É um bom método de triagem, inclusive passível de ser utilizado em unidades básicas de saúde e em campanhas que têm como alvo indivíduos mais vulneráveis”, ressalta o infectologista do HC-UFPE.

Detectam o vírus pela saliva: é conhecido como autoteste e feito pelo próprio indivíduo.

Exames laboratoriais

Sorológicos: são realizados em laboratórios para a detecção de anticorpos e/ou antígenos do vírus.

Molecular para detecção de ácido nucleico do HIV: PCR (reação em cadeia da polimerase) utilizado na prática clínica para monitorar a carga viral e o controle da infecção.

Todos são confiáveis, apresentam alta especificidade para o diagnóstico de HIV no organismo e autorizados pelo Ministério da Saúde, de acordo com o professor da UFTM.

Margem de erro

Para um teste ser utilizado, deve possuir sensibilidade mínima de 99,5% e especificidade de 99%. Situações de falso positivo ou falso negativo, apesar de ocorrerem, são raras.

“A margem de erro varia de acordo com a metodologia empregada e em qual momento da coleta do exame o indivíduo se encontra após a exposição sexual. Os de triagem —rápido, saliva e sorológicos—, habitualmente, apresentam elevada sensibilidade, com o objetivo de não deixar haver um falso negativo, e uma elevada especificidade, a fim de assegurar que um positivo é um verdadeiro positivo. Na prática, se o teste é negativo provavelmente o é, e, se for positivo, precisa de confirmação com um segundo”, afirma o professor da UFPE.

O teste deve ser refeito dentro do período de janela imunológica, se houver outras exposições de risco ou na frequência recomendada para cada situação.

Deu positivo, e agora?

Há um protocolo de diagnóstico que deve ser seguido. A primeira e mais importante medida, segundo o infectologista do HC-UFPE, é repeti-lo por meio de uma nova coleta e metodologia diferente, no caso de testes rápidos, ou repetir o mesmo quando o diagnóstico tenha ocorrido pelo sorológico.

Os especialistas indicam buscar um serviço que permita realizar a confirmação do diagnóstico e iniciar a terapia antirretroviral, como assistência médica em SAE (Serviço de Atenção Especializado), que estão distribuídos em vários municípios e costumam fazer parte das unidades hospitalares de grande porte da rede pública de saúde.

O atendimento é sempre prestado por equipes multiprofissionais. Há também o CTA (Centro de Testagem e Aconselhamento) e os endereços podem ser consultados no site: http://www.aids.gov.br/.

A pessoa é direcionada à consulta para orientações com médicos. Além destes, são realizados exames complementares para a avaliação das condições imunológicas, identificação de outras infecções e quantidade de vírus no sangue.

Quais os tratamentos existentes?

Existe um amplo arsenal terapêutico que oferece as recomendações de combinações de drogas antirretrovirais, capazes de tornar a carga viral indetectável no sangue e melhora da imunidade celular. Todos os remédios são disponibilizados gratuitamente pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

Segundo o infectologista do HC-UFPE, existem propostas de tratamento para indivíduos recém-diagnosticados e esquemas mais complexos para os que apresentam falha terapêutica, ocasionada por baixa adesão aos medicamentos.

“Alguns de comodidade posológica incluem três drogas em apenas um ou dois comprimidos ao dia, até outros mais elaborados que demandam uma composição com vários ao dia.”

São cerca de 20 medicações disponíveis para o tratamento, com menos efeitos colaterais, a ponto de não serem mais chamados de coquetéis, segundo o diretor médico na Hilab.

“É crucial tomar os comprimidos corretamente para não criar resistência do vírus que exige mais medicações”, alerta Molina.

Fonte: UOL / Viva Bem