O Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP), realizou um bate-papo para discutir a prevenção e o enfrentamento da violência contra mulheres.

A ativista do MNCP, Ane Aveline, defendeu que “o Estado tem que entender que a violência é doméstica, mas a situação é pública e o estado precisa se posicionar. E ele só vai se posicionar bem se conhecer as demandas dessas mulheres. Com o cenário político que estamos vivenciando, onde mulheres são agredidas verbalmente durante o exercício de seu trabalho, temo por essa reprodução quando ela chega em casa. O que devo esperar de meu colega de trabalho, se meu governante, que deveria dar exemplo, não tem respeito e consideração e muito menos políticas públicas para mulheres cis e trans?”

“O Estado tem que se envolver, inclusive dentro dos lares. Precisamos desconstruir a ideia de que público é o que está fora de casa. Isso é um trabalho difícil, porque está enraizado”, defendeu.

“A pandemia veio para carimbar e constatar que a violência tem múltiplas determinações. Carimbar que a culpa não é da pandemia. A culpa é pelas políticas públicas inexistentes no meu município, estado e no meu Brasil. O estigma foi latente para mim nessa pandemia. Ele ficou mais intensivo, efetivo e mais agressivo. Estava fazendo um tratamento de câncer, precisei entregar um laudo e, nesse documento, viram minha sorologia e fui dispensada do meu trabalho em meio a um tratamento de câncer. Ou eu vou me informar, me empoderar ou vou continuar a vida inteira sendo estigmatizada.”

O estigma acompanha a mulher desde quando ela nasce, muitas são rejeitadas porque muitos desejam um menino em vez de uma menina. Se essa menina for negra, ela ganha mais estigma ao longo da vida dela. Se for negra e obesa, ainda mais. Se for negra, obesa e da periferia, ela ganha mais estigma ainda. A pont0 de ser difícil conseguir ter uma autoestima. E quando ela cresce em um núcleo familiar desestruturado, fica difícil para ela mudar a vida dela. Assim, até chegar em um relacionamento onde ela aceita ser violentada verbalmente, sexualmente.”

Para Ane, a pandemia colaborou para fazer com que o lares dessas mulheres deixassem de ser acolheredores e se tornou local onde agressores têm liberdade.

A violência no lar 

A advogada Eri Bernadinho lembrou o cálculo estatístico que revela que são 9 gerações para uma pessoa que nasceu na extrema pobreza chegar a uma condição de vida adequada.

“A pandemia agravou o cenário do caos. A gente vê um governo federal dissociado da realidade e, em especial, das famílias em maior vulnerabilidade, além da ausência de legislação para conservar as políticas e conquistas que tivemos nos governos anteriores”, defendeu.

Um levantamento do Datafolha mostrou que a cada 4 mulheres, uma já foi vítima de alguma violência durante a pandemia no Brasil. Diante desse dado, Eri lembrou que a família, que é reconhecida pela política pública como uma entidade maior, é justamente quem realiza essas violência.

“Por isso, devemos nos perguntar: que família? E, por isso, é importante cada vez mais abraçarmos o sentido plural de família. São famílias em sua concepção macro. Esse olhar coservador de achar que o seio da família é um local de segurança é inocente. Isso para não falarmos das crianças que sofrem violências sexuais dentro desse espaço. Esse local de proteção não é realidade no nosso país. Não posso considerar um lar, com o número de lares sem saneamento básico, onde sequer há onde correr os dejetos, posso chamar de habitação, moradia, mas não um lar.”

Para Eri, essas condições refletam nas relações. “Não somos mais frágeis porque somos mulher, somos mais frágeis porque a legislação desse país nos colocou em um lugar de fragilidade”, disse ao lembrar que a primeira lei de proteção à mulher foi de 1890 dizendo que o homem não podia açoitar a mulher até a morte. “Podia açoitar, mas não podia de modo a lhe matar.”

Como apoiar

Segundo mapeamento do IPEA, para uma mulher decidir romper o ciclo da violência ela já sofreu, em média, sete episódios de violência anteriores. Nesse sentido, a Major Denice Santigo explicou que essa ruptura não é fácil e rápido. “Estão envolvidas muitas questões e precisamos entender que a violência doméstica não é matemática. Há mulheres que não querem denunciar e que, na verdade, querem saber quais são seus direitos, como vão ficar os filhos. Essa mulher pode ir nos Centros de Atendimento à mulher ou ligar no 180 que são de proteção à mulher.”

A Major explicou que, nas cidades em que não existem Centros de Atendimento à Mulher, elas podem procurar os Centros de Referência Especializado em Assistência Social que tem uma equipe similiar e que são espaços não punitivos. Então, nesses locais não se constrói um processo penal contra aquele homem.

Para que esse processo se constitua e que haja o boletim de ocorrência, deve ser procurada a delegacia da mulher. Para isso, ela deve levar provas, ou seja, precisa levar duas testemunhas, e fazer exame de corpo de delito, por exemplo.

Por fim, Major Denice pediu para que se construa uma rede de apoio à mulheres e que, sempre que possível, outras mulheres testemunhem e denunciem essas violências.

 

Mais informações 

Central de Atendimento à Mulher

Dique 180

MNCP

Site: https://mncp.org.br/

 

 

Jéssica Paula (jessica@agenciaaids.com.br)