Há quem acredite nos bordões mais clichês sobre a maternidade como o “ser mãe é padecer no paraíso”. Realmente a maternidade trás isso para muitas mulheres, mas mesmo quando o mundo estava relativamente normal e “tranquilo”, ainda sim a maternidade por si só sempre trouxe muitos medos, até comuns, enfrentados por nós mamães. E eles chegam sorrateiros e naturalmente junto com a notícia do novo serzinho: é o medo de não dar conta, de não ser suficiente, de amar demais, de amor de menos, de falhar!

Agora imagine você que além do “ a maternidade transforma a vida da mulher”, e realmente transforma, para as mães HIV+ como eu, há outras questões maiores em quantidade e intensidade. Sabemos que nos dias de hoje, seguindo todos os protocolos (AZT intraparto quando preciso, não amamentar, xarope para o bebê nas primeiras semanas de vida), é possível para uma gestante HIV+ gerar uma criança saudável e livre do vírus, e isso é incrível, mas é inevitável tudo aquilo que é pesado, que atormenta, aflige, que penaliza e tantos sentimentos ruins que não temos escolha a não ser aprender a lidar.

Além destes, os sentimentos relacionados à própria condição que engloba desde a aceitação até acesso a retirada do tratamento, ao lado também do medo de perder a criança, não poder amamentar, como esconder dos familiares , medo que a criança não sobreviva, medo da própria morte e com isso do futuro da criança, e a culpa! E os problemas aqui sem dúvida são desproporcionalmente experimentados em mulheres racializadas que enfrentam também a opressão sistêmica.

Com hiv ou não, sim, “o amor de mãe é incondicional”, mas o que significa cuidar de um filho além de tudo isso, no meio de uma pandemia? Essa questão sem dúvida vale para todos os adultos em qualquer país do mundo, mas no Brasil ela ganha contornos mais dramáticos. Mundialmente existem protocolos e diretrizes pré-existentes de enfrentamento a pandemias e em comparação ao Brasil a gestão publica tem sido muito desigual. Temos notas baixíssimas na condução do surto e é razoável pensar que uma criança brasileira sofrerá muito mais impacto que a maioria das demais.

Aliado ao externo, quando vamos para dentro das casas, a combinação de pressão financeira, perda de cuidados infantis como escolas e creches, e preocupações com a saúde, é extremamente desafiador. As crianças tem dependência quase total de cuidados, para atender às necessidades básicas de saúde e segurança, e a ansiedade e até depressão de nós cuidadores, causada por tudo isso são repassados a eles. Sem dúvida as consequências em longo prazo para as crianças, serão reflexo do que estamos passando .

Sendo assim, para todas as mães, acredito que tudo isso vá passar logo e que finalmente possamos ter o mínimo de normalidade e equilíbrio; se depois de tantas dificuldades continuamos em pé, só tenho razão pra crer que tudo vai dar certo, afinal, como diz um último clichê: “Intuição de mãe não falha”.

* Thais Renovatto é mãe da Olivia e do João, publicitária e autora do livro 5 anos Comigo.