No atual cenário de grande complexidade sanitária mundial, uma vacina eficaz e segura é reconhecida como uma solução em potencial para o controle da pandemia, aliada à manutenção das medidas de prevenção já estabelecidas.

A discussão de priorização de imunização na pandemia da covid-19 é um dos principais assuntos nesse momento uma vez que temos uma escassez de doses e uma lentidão na expansão de acesso a essas tecnologias de prevenção para toda a população.

Como fator complicador temos poucos estudos avaliando grupos populacionais específicos, incluindo a população vivendo com HIV. Importante nesse momento também o entendimento das vulnerabilidades próprias dos coronavírus e também aspectos sociais e características epidemiológicas do HIV em nosso país para se considerar ou recomendar uma vacina.

No começo da pandemia vários estudos foram publicados sobre a covid-19 entre pessoas vivendo com HIV sendo a maior parte deles sendo composta por relatos e pequenas série de casos e, muitas vezes, sem avaliar todo o conjunto de dados relacionados à infecção pelo HIV, aspectos demográficos dessas populações (raça/escolaridade), comorbidades concomitantes e a correlação deste fatores com os desfechos clínicos da covid-19. Indicadores clínicos que poderiam ser associados à maior gravidade da doença, como ausência de uso de antirretrovirais, carga viral detectável, menores valores de CD4 e comorbidades outras, não mostraram associação com a necessidade de suporte de terapia intensiva ou a ocorrência de óbito.

Todavia tivemos evidências bem diferentes nos últimos meses. As publicações mais recentes com número maior de pessoas em estudos realizados nos EUA e Europa e Africa têm demonstrado mais complicações e pior prognósticos entre as pessoas HIV+ quando comparadas à população não infectada pelo HIV. Além dos fatores de risco já descritos na população geral (idade, comorbidades, privação social e econômica) menores valores de CD4, e a ausência de supressão da replicação do HIV também foram encontrados como associados à ocorrência de doenças mais graves, com maiores taxas de hospitalização e de mortalidade.

No primeiro trimestre de 2021, o governo federal incluiu todas pessoas com HIV/aids entre os grupos prioritários definidos para receber a vacina contra a covid-19. A indicação, independente da contagem de células T CD4 parece um bom cenário, levando em consideração todos esses fatores. Lembrando que influenza e pneumococo são patógenos respiratórios cujas vacinas fazem parte do PNI para essa população em caráter de priorização.

Esse plano deve ser rediscutido a luz das evidências científicas que forem aparecendo na literatura, a fim de minimizar ao máximo o impacto da pandemia nas pessoas com imunodeficiência pelo HIV.

* Dr. Alvaro Furtado Costa é médico infectologista.

** Artigo publicado originalmente no Boletim Mopaids.