“Parafraseando Armando Nogueira, amigo José, tu já eras o melhor muito antes de ser e continuara sendo mesmo depois de ter sido.”

Amigo José, obrigado pela honra de ter compartilhado momentos tão próximos em seus últimos dias por aqui, confesso que preferi mais os dias que me mandava embora aos dez minutos de visita, sua ranzinzisse era melhor que seu silêncio quando não dizia mais e não brigava mais.

O conheci em 1994 recolhendo lençóis para cobrir o monumento as bandeiras no 1º de dezembro daquele ano, a palavra de ordem era: “Ninguém é tão alguém que não precise de ninguém”, frase do GIV – Grupo de Incentivo a Vida ao qual eras Presidente.

Envolvido por uma profunda e inconsolável tristeza me despeço de ti amigo, não por seu descanso merecido, mas pela ausência de uma vida que pulsava e nos empurrava a seguir adiante nas trincheiras do enfrentamento do HIV/Aids nessas quase três décadas que nos deram tantas conquistas históricas.

Não fui seu melhor aluno, mas tenho clareza de ter sido seu maior admirador e minha maior referencia, pergunto: e agora José, José para onde vamos sem você?

Saiba que não figuras para mim como o melhor militante da causa, mas sem duvidas alguma foi o maior deles, pela conduta ética, coerência reta em sua trajetória.

Por causa de minha antiquada tradição religiosa, seu ateísmo racional e sua agressiva tensão no ativismo me chocavam na mesma proporção que me orgulhava ao vê-lo no front da luta, nenhum Cristão, que convivi, tenha defendido a vida com maior voracidade.

Ateu por convicção demonizou teorias verdadeiramente absolutistas no campo religioso, dizia acreditar muito mais na ação pratica do que na oratória.

Por sua ousadia e inquietude, por seu perfil polemico e radicalmente “xiita” nas abordagens da militância, atravessastes com muita obstinação, embora conflituosa, barreiras anunciada intransponível, não eras unanimidade e orgulhava-se disso.

Incisivo, direto não fazia rodeios e agia no confronto ativista sendo chamado muitas vezes de “homem bomba”, não explodia pessoas mas pensamentos que julgava contrários a direitos voltados a melhoria da qualidade de vida dos que vivem com HIV/Aids, materializando-se através das muitas políticas publicas implementadas oriundas de sua postura e cobrança, quando “carregava na tinta” ao se convencer, voltava atrás sem constrangimento.

Sua trajetória o credenciou a fazer parte do CONEP – Conselho Nacional de Ética e Pesquisa, respeitado por acadêmicos sua honestidade intelectual e dedicação foi destaque em temas importantes dessa área. Mais do que a luta contra a Aids, buscou uma saúde publica inclusiva e humanizada..

Como poucos, transformou sua soropositividade negativa em negatividade positiva esquivando-se da vitimização e da ideia paralizante de morte para a ideia mobilizante de vida.

Foi além-mar contra a Aids, quando encantou a terra do sol nascente com suas idas e vindas, peregrinou anos a fio em varias cidades japonesas, defendendo Decasséguis em seus direitos.

Dizia ser tolerante com seus pares que ingressavam no governo, desde que trocassem apenas a roupa e não a pele.

Às vezes, inteligentemente contraditório, foi fundador do Fórum de ONG/Aids do Estado de São Paulo ao mesmo tempo em que funda o Mopaids (Movimento Paulista de Luta contra Aids) desvencilhado de amarras de inclusão, acreditava que o contraponto era producente e equilibrava a causa.

Dedicou-se em especial a crianças e jovens da periferia de São Paulo, extremamente reservado em sua vida pessoal, me vem a mente seu relato ao amor incondicional além da vida e amigos , de um casal de filhos felinos: Eros e Latona, bem como de sua amada afilhada ao qual os deixam órfãos.

Seu legado ficara marcado pela resistência e resiliência, se aqueles que amamos não morrem jamais, apenas partem antes de nós, então viveras para sempre!

Saístes as 8:30 da manha de 03 de setembro de 2019 da vida pra entrar na historia, mentes e corações de familiares, amigos e do movimento de luta contra a aids.

Até breve amigo!

* Rubens Duda é amigo de José Araújo. Formado em letras pela Universidade Bandeirantes, ele já coordenou a Casa de Apoio Lar Betânia e integrou a equipe do Grupo de Incentivo a Vida (GIV).  Duda foi um dos fundadores do Foaesp (Fórum de Ongs/Aids do Estado de São Paulo). Atualmente trabalha no Programa Municipal de DST/Aids de São Paulo.