A Justiça Federal determinou que o Ministério da Saúde entregue ao estado de São Paulo lotes integrais de sete medicamentos destinados ao controle da hepatite C. A decisão liminar foi proferida a pedido do Ministério Público Federal e deve ser cumprida em até 60 dias. Os problemas no fornecimento dos remédios pelo governo federal, registrados desde o segundo semestre de 2016, têm levado ao desabastecimento na rede pública paulista e colocam em risco mais de 4,6 mil pacientes que estão na fila de espera para iniciar o tratamento, além daqueles que já realizam a terapia contra a doença e também dependem do envio dos comprimidos.

A ordem judicial refere-se à entrega de lotes de Daclatasvir 30 mg, Daclatasvir 60 mg, Simeprevir 150 mg, Sofosbuvir 400 mg, Elbasvir 50 mg, Grazoprevir 100 mg e do composto Ombitasvir 12,5 mg/Veruprevir 75 mg/Ritonavir 50 mg + Desabuvir 250 mg. Segundo a decisão, o governo federal deve respeitar rigorosamente o cronograma de fornecimento trimestral e destinar os remédios ao estado de São Paulo em remessa única. O envio com atraso e parcelado tem sido prática comum do Ministério da Saúde. A situação chegou a um ponto crítico nos últimos cinco meses, quando a pasta deixou de expedir lotes inteiros de alguns dos medicamentos.

A liminar estabelece também a obrigação de envio de estoques de segurança dos mesmos medicamentos, com quantidades suficientes para o fornecimento à população por 30 dias. A medida visa a resguardar a rede pública paulista de novos episódios de desabastecimento devido a falhas do Ministério da Saúde. São Paulo concentra o maior número de pacientes com hepatite C no país e, por isso, é o maior consumidor dos remédios. Em 2017, o estado registrou 41% dos novos diagnósticos em todo o Brasil. Só na capital, a taxa de detecção da doença chegou a 36,1 por 100 mil habitantes, muito superior à média nacional (11,9).

A hepatite C é uma doença viral que, quando crônica, requer medicação contínua. O tratamento envolve a combinação de diferentes fármacos, e a interrupção no uso de um deles pode comprometer a eficácia de toda a terapia. Se os remédios possibilitam 90% de chance de cura, sem eles, os pacientes estão propícios a desenvolver cirrose e câncer hepático, um dos tipos mais letais. Três ou quatro dias sem tomar os medicamentos é o suficiente para a anulação de avanços no quadro clínico, levando à necessidade de reinício do tratamento.

A aquisição e a distribuição dos medicamentos são centralizadas no governo federal devido à gravidade da doença, ao preço elevado e à indisponibilidade dos itens no mercado convencional. O Ministério da Saúde alega entraves burocráticos pontuais para justificar as pendências, mas o MPF avalia que as causas vão além. Inserida na estratégia de corte de gastos públicos nos últimos anos, a renegociação de contratos da pasta acabou trazendo problemas para o atendimento à população em diversas áreas, entre elas o fornecimento de remédios. A revisão levou à falta de fornecedores e ao atraso em novas licitações para a compra de vários produtos.

“A idealizada economia gerada no orçamento da assistência farmacêutica do Ministério da Saúde é não só ilusória como de curto prazo”, diz a Procuradoria da República em São Paulo na ação civil que resultou na liminar. “A demora no início do tratamento causa reflexos na saúde pública, já que o número de pessoas a serem tratadas no futuro sofrerá grande incremento, dada a transmissibilidade da doença.”

O número da ação ajuizada pelo MPF é 5024822-49.2018.4.03.6100. A tramitação pode ser consultada aqui.

Fonte: Ministério Público Federal