O presidente Jair Bolsonaro disse, nesta semana, que uma pessoa vivendo com HIV é “despesa para todos no Brasil”. A declaração foi manchete nos principais jornais do país e gerou críticas de organizações da sociedade civil que lutam contra a estigmatização das pessoas que convivem com HIV.

Os ex-diretores do Departamento de Doenças Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis, Alexandre Grangeiro e Adele Benzaken também se posicionaram a respeito da declaração.

Para o sociólogo e especialista em saúde pública, Alexandre Grangeiro, “assim como na área econômica, o presidente Bolsonaro deveria reconhecer sua incompetência para os temas relativos à saúde e se abster de emitir opiniões. Contribuiria muito para reduzir o “Risco Brasil” de adoecer e morrer.

“A tentativa de justificar a campanha de abstinência sexual com a afirmação de que pessoas com aids são um peso para o Brasil nos leva para quase três décadas atrás na história. Naquela época políticos, representantes de organismos internacionais, agentes econômicos e burocratas ainda podiam desculpar sua ignorância pelo desconhecimento dos benefícios que a política de prevenção e tratamento começava a trazer para o país e o mundo.”

Alexandre ainda acrescenta que “sem se ater à questão de humanidade e de direito, princípios básicos que parecem não orientar a ação e o pensamento do atual governo, relembremos uma evidencia cientifica e uma obviedade:

A ciência: Adolescentes e jovens estão se infectando mais pelo HIV não porque estejam tendo mais relações sexuais, mas porque tem caído o número de escolas que mantem programas de saúde sexual e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Este silêncio tem construído gerações incompetentes para lidar com o HIV e com situações de abusos e violência sexual.

A obviedade: pessoas em tratamento contra o HIV são saudáveis. Trabalham, geram lucros, constituem famílias, não transmitem o HIV. Simples assim.”

Segundo Alexandre, “o contraponto a isso foi a reação da sociedade que massivamente defendeu o Programa de Aids e suas conquistas. Pesado mesmo nessa história foi o preconceito.”

Já a médica Adele Benzaken, afirmou que “essa declaração do presidente é extremamente incorreta e mostra o desconhecimento com relação a questão de custos no âmbito ambulatorial e hospitalar. Como primeiro ponto, é importante esclarecer que se uma pessoa não toma medicamento antirretroviral obviamente o custo para o Estado será muito maior porque as pessoas adoeceriam, precisariam de UTI, que é muito mais caro ou até mesmo a internação hospitalar. Então essa conta que o presidente está fazendo, é uma conta errônea. Fora o fato de que o tratamento para todos tem como objetivo justamente a redução da transmissibilidade do vírus, já que uma pessoa que está em tratamento não transmite o HIV. E, portanto, o tratamento é uma forma de prevenção e, portanto, reduz o número de casos.”

Segundo a ex-diretora, “o tratamento, assim, já é por si só, uma forma de ter economia na saúde. Essa conta, por desconhecimento, não está correta pelo ponto de vista dos custos”.

“A segunda questão que coloco é a Lei 9.313/1996 que institui o tratamento gratuito para todas as pessoas vivendo com HIV. Então, não importa o custo, existe uma lei que ampara o tratamento do HIV no Brasil. Além disso, o Brasil, através da premissa do SUS, é um país onde todas as pessoas tem direito à saúde. Então, ao dizer que as pessoas estão dando despesa ao governo, você estaria negando a assistência à saúde”, complementa.

Adele ainda reforça que “a declaração está infringindo a saúde mental das pessoas com HIV. Hoje, as quase 700 mil pessoas vivendo com o vírus e em tratamento no país se sentem extremamente inseguras com o posicionamento do atual governo e a sustentabilidade do tratamento.”

 

Redação da Agência de Notícias da Aids