O Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) lançou nessa terça-feira (10) o estudo Stigma Index. Segundo dados aferidos, o preconceito prejudica a adesão ao tratamento das pessoas que vivem com HIV/aids. A pesquisa contou com 1784 pessoas entrevistadas em diferentes partes do Brasil e comprova cientificamente o impacto dos preconceitos que envolvem diferentes aspectos da vida de uma pessoas que vive com o vírus.

A Agência Aids quis saber quais são as sugestões de especialistas e ativistas para diminuir o estigma e a discriminação em relação às pessoas que vivem com o HIV. Confira o posicionamento dos entrevistados:

 

Rodrigo Pinheiro, presidente do Fórum de ONGs Aids de São Paulo: “Precisamos de dados relacionados aos aspectos sociais para avançar no enfrentamento à epidemia no Brasil. O Departamento de IST/Aids e Hepatites Virais precisa colocar como pauta a questão da Aids e Pobreza no Brasil e a Câmara dos Deputados incluir na agenda social que começarão a discutir ano que vem. Veio em um momento oportuno e não podemos deixar de ampliar as ações para além da saúde.”

Maria Clara Gianna, coordenadora adjunta do Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo: “Quanto ao preconceito dentro dos serviços de saúde, já trabalhamos muito com os funcionários e com as equipes dos serviços de saúde, mas percebemos a necessidade de que esse trabalho continue. Não apenas com as equipes que trabalham diretamente com as pessoas que vivem com HIV/aids, mas os trabalhadores e profissionais de saúde dos diferentes locais. É uma minoria, mas ainda é um dado que chama atenção. Pessoas que vivem com HIV/aids que denunciam violações de seus direitos nos serviços de saúde mostra que não é uma questão já resolvida. Precisamos continuar avançando na discussão sobre o que é viver com HIV. Campanhas de mídia, que possam envolver os diferentes setores da sociedade são muito importantes. Assim, o trabalho com as escolas também é importante. No ambiente escolar, isso leva a outras discussões importantes que envolvem as populações mais vulneráveis que tambémestão envolvidas na questão do HIV.”

Edna Kahhale, professora de psicologia e sexualidade na PUC-SP: “A minha sugestão é conversar com as pessoas, responder perguntas, informar e acolher as questões e vivências das pessoas. Ajuda também as campanhas e divulgação das informações mas criar espaços de escuta e troca. Espaços coletivos de resistência!””

Ramon Nunes Mello, poeta e ativista: “Falar abertamente sobre HIV/aids, sem silenciamento, é fundamental paradiminuir o estigma e a discriminação. Além disso, é necessário que as políticas públicas sejam estendidas a toda população, sem quaisquer tipo preconceito, incluíndo a parcela mais vulnerável: negros, trans e gays. O Ministério da Saúde precisa compreender que não é com uma campanha equivocada e ultrapassada, com lentes dos anos 80 de pânico e medo do HIV/aids, que a população vai se conscientizar. É necessário apoiar e ouvir as instituições e ONGs, que há mais de três décadas dedicam-se a enfrentamento da epidemia, como a ABIA, Gapa, GIV e Grupo pela Vidda.”

 

Marília Casseb, diretora de assuntos externos da Gilead Sciences: “Não há milagre. A única forma de quebrar estigma e preconceito contra a doença é a gente insistir infinitamente em campanhas de conscientização e projetos de educação seja dentro de escolas, seja em universidades, por meio da mídia constantemente, em programas de todos os tipos como inserção do tema em novelas, exposições fotográficas, sejam em rodas de conversas, peças teatrais. Tem que colocar na boca de líderes de opinião para trabalhar esse tema. A gente tem que educar as pessoas. Que a gente contagie outras pessoas que são líderes e que elas sejam porta vozes da causa.”

Moyses Toniolo, Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids RNP+: “Estamos lidando com questões socioculturais ainda não resolvidas e que somente uma ação mais efetiva de comunicação sobre o assunto poderia contribuir para reduzir os tabus que rondam o coletivo social. Sabemos através da PECAP – Pesquisa sobre Comportamento e Atitudes da População brasileira que a maioria das pessoas sabe ou pelo menos conhece sobre o tema aids, e com o advento da globalização da informação e maior acesso a internet, as pessoas poderiam estar recebendo informação de qualidade e mais conhecimentos específicos sobre a aids, que ajudasse na luta contra a epidemia. No entanto, ao mesmo tempo, vivenciamos um tempo de retrocesso sobre as narrativas que buscam condicionar o comportamento humano, principalmente o sexual, a dogmas e questões fundamentalistas religiosas, que impedem e fazem retroceder a consciência da população sobre Prevenção, sobre Cuidado e Auto-cuidado, e como lidar com as relações com as demais pessoas. As pessoas estão cada vez mais isoladas, buscando a satisfação imediata de suas necessidades, bombardeadas por apelo consumista que não permite pensar no futuro mais distante, vivenciando apenas o presente muitas vezes de maneira exacerbada e com baixa capacidade de elaboração sobre as consequências de seus atos. Sem conhecer devidamente os avanços, sem podermos falar de prevenção nas escolas, nas empresas, nas igrejas, e em diversos outros espaços sociais, ainda convivemos com uma expectativa de 135 mil pessoas que não sabem seu status sorológico, e por diversas questões socioculturais que não são trabalhadas, ainda se constituem como maior desafio para contenção da epidemia por não obterem os benefícios do tratamento como prevenção.

Silvia Almeida, ativista vivendo com HIV há 30 anos: “Acho que tem duas frentes muito importantes. Uma é a gente trabalhar o empoderamento da pessoa vivendo com HIV para que ela não deixe diminuir sua autoestima por conta do pensamento alheio. Isso tem relação com o autojulgamento por questões de gênero, por questões de sexualidade. Também é importante a gente falar sobre sexualidade e conseguirmos sair daquele ponto onde o sexo é pecado, proibido. Isso vem de uma sociedade que vive sexualidade sem falar sobre ela. Claro que isso precisa ser pautado em cima de políticas públicas eficientes que consigam acessar a população nas bases de suas comunidades.”

Jenice Pizão, Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas: “Para diminuir estigma a grande questão é informação. As pessoas desenvolvem um estigma incompreensível. Ninguém está pedindo misericórdia, ninguém está pedindo dó. Estamos pedindo informação. As pessoas têm que estar mais bem informadas sobre a epidemia e entender que a epidemia não é privilégio de alguns, mas de qualquer pessoa que está viva, que qualquer pessoa pode se infectar. Isso tem que partir da escola, do estado. As campanhas têm que transmitir informação e não medo.”

 Marta McBritton, Instituto Cultural Barong: “Para tirar o estigma é preciso falar sobre HIV/Aids como fazemos de 1996, em todos os momentos, em todos os lugares. Só acredito em conjunto da obra sobre qualquer tipo de preconceito. Você precisa falar sobre, as pessoas precisam conhecer. Estive no interior do país recentemente e tem gente que acha que HIV é transmitido por mosquito. Então sem um trabalho de fato, concreto, em todas as instâncias, escolas, universidades, empresas, campanhas de mídia, é impossível.”

 

Jair Brandão, Secretario Nacional de Articulação Política da RNP+ Brasil e Equipe Técnica da Gestos : “Ter políticas públicas de enfrentamento ao estigma e a discriminação em relação às Pessoas Vivendo com HIV e Aids (PVHA) para termos serviços sem preconceito e discriminação, e que respeite os ciclos de vida, as diversas orientações sexuais e identidades de gênero. Além de ter ações com profissionais dos serviços que contribuam na conscientização destes profissionais sobre o estigma e discriminação que as PVHA vivenciam. Assim como trabalhar a questão do acolhimento integral respeitando a singularidade dos usuários. Importante que temas como ética e sigilo sejam pontos fundamentais nas formações. Ter campanhas especificas sobre estigma e discriminação em PVHA para sociedade em geral é fundamental. Por fim, divulgar amplamente os resultados da pesquisa do Índice de Estigma e Discriminação em relação às PVHA que mostram dados reais (evidência) dos diversos problemas que ainda passam as PVHA em relação ao estigma e discriminação. Viver com HIV e Aids não é tão simples e “normal” como muitas pessoas dizem.”

 

Redação da Agência de Notícias da Aids