Abrangendo garantias e direitos fundamentais, a Constituição Federal de 1988 representa um símbolo do que se pretendia à época, após um período de 20 anos de ditadura militar: democracia plena, com liberdade e igualdade para todas as pessoas. Proteção aos direitos de cidadania, um sistema de freios e contrapesos, e uma série de previsões sociais que, na prática, não se concretizaram. Para alcançar a realidade, as leis precisam se transformar em ações afirmativas e parte desta equação só é resolvida com a participação popular. Distante para grande parte da sociedade, a política brasileira nunca retratou sua população. As decisões políticas são tomadas, em sua maioria, por pessoas que não possuem contato com a multiplicidade de realidades do Brasil. Para mudar este cenário, um dos caminhos é aumentar a inserção e participação sociais nos espaços de representatividade. Debater estas questões, para encontrar um ponto de encontro e atuar em conjunto, foi um dos propósitos do painel sobre “Direitos, Advocacy e participação juvenil pelo fim do preconceito e garantia de direitos”, durante o I Encontro Estadual Juventudes e HIV/aids (01/09).

Histórias de vida tem o poder de transformar quando são contadas. A importância destas vivências é considerada pela advocacy, que é a prática de influenciar a formulação de políticas. Entre estas histórias, consta a da Isabella. Um processo que busca reparar a omissão do estado pela transmissão vertical, que poderia ser evitada com diagnóstico precoce e atenção no pré-natal, explica Patrícia Diez Rios, do Movimento de Mulheres de São Gonçalo (RJ). Desde quando nasceu, em 1996, Isabella enfrentou série de internações devido a problemas de saúde, e, ainda assim, teve pedido de benefício de assistência social negado.

Outra narrativa é levantada por Lázaro da Silva, da Rede Nacional de Jovens, participou do debate e apresentou a Campanha Vidas Negras Importam. que traz dados alarmantes do país: “A cada 23 minutos, um jovem negro é assassinado no Brasil. Sete em cada 10 pessoas assassinadas são negras. Na faixa etária de 15 a 29 anos, são cinco vidas perdidas para a violência a cada duas horas. De 2005 a 2015, enquanto a taxa de homicídio por 100 mil habitantes não negros teve queda de 12%, para os negros aumentou 18,2%. A letalidade das pessoas negras continua aumentando e isso exige políticas com foco na superação da desigualdade racial”, enfatiza. Números que representam pessoas, vidas e Lázaro acrescenta que o objetivo da campanha, lançada em conjunto com a Organização das Nações Unidas (ONU), é dar visibilidade para a violência que atinge jovens negros.

Já as batalhas de ações para garantir direitos fundamentais para quem sofre com preconceitos e discriminações, devido a sua sorologia, foram divididas pelos advogados, Filipe Pombo, da Rede de Jovens São Paulo Positivo, e Dimitri Sales, do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe). Os casos trazidos dão conta de uma jovem impedida de participar de aulas de educação física e um adulto impedido de assumir cargos em concursos públicos.

“Todo aparelho estatal burocrático e a forma como o direito é posto, nos impossibilita de lutar pelos nossos direitos, dificultando ao máximo, até que ficamos desgastados de estar toda hora nesse enfrentamento. Mas temos que continuar persistindo, lutando e pensar em formas de resistência, construção de redes, de lutas, para além do direito, porque ele é posto pelo estado colonialista e colonizado”, pontua Filipe. Em sua atuação em defesa dos direitos humanos, Dimitre Sales constata que em questões raciais, de gênero, ou sexualidade, o sistema se volta contra a vítima. “Se você luta pelos direitos humanos, será uma luta árdua, porque você está lutando contra um sistema”, ressalta, observando que o atual momento histórico é marcado por um processo de desmonte do estado democrático de direito.

Prêmio Paulo Teixeira e Homenagem à Micaela Cyrino

Além da luta, é preciso resistir com celebração. Após os intensos debates e compartilhamentos, o Encontro Estadual de Juventudes e HIV/aids foi marcado por entrega do prêmio Paulo Teixeira e homenagem à Micaela Cyrino, artista visual, por sua militância. Responsável por implementar o programa de HIV/aids em São Paulo, antes mesmo do governo federal e por tornar o estado percursor no país, Paulo Teixeira foi agraciado com prêmio em seu nome, recebido por sua amiga, Nina Laurindo.

 

 

Marianna Marimon