Posicionamento do Grupo Temático Expandido em HIV/Aids no Brasil sobre o enfrentamento à violência e  discriminação por orientação sexual e identidade de gênero 

 

Nós, membros do Grupo Temático sobre HIV/AIDS no Brasil (GT/UNAIDS), conformado pelas instituições relacionadas abaixo e presentes à reunião extraordinária no dia 10 de outubro de 2012 em Brasilia/DF, na sede da União Europeia no Brasil, em caráter de urgência, para examinar o problema da homofobia e crimes homofóbicos em particular, seus impactos na epidemia de HIV no Brasil e as constantes violações de direitos humanos da população LGBT em todos os seus aspectos, bem como para garantir um compromisso em âmbito nacional de intensificar iniciativas para fortalecer a resposta à Aids e promover a redução dessas violações;

 

1.      Considerando os compromissos internacionais estabelecidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Declaração sobre Direitos Humanos, orientação sexual e identidade de gênero (AG/RES 2435);

 

2.      Considerando a “Declaração Política sobre HIV/AIDS: Intensificando nossos esforços para eliminar o HIV/AIDS”, adotada pela Assembleia Geral da ONU em 10 de junho de 2011, e o compromisso em “intensificar os esforços nacionais pela criação de marcos legais, sociais e de políticas públicas em cada contexto nacional a fim de eliminar o estigma, a discriminação e a violência relacionados ao HIV/VIH; (…) e promover e proteger todos os direitos humanos e liberdades fundamentais com especial atenção às pessoas vulneráveis ao HIV/VIH e afetadas pelo mesmo”;

 

3.      Recordando as palavras da Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Exma. Sra. Navi Pillay, no âmbito da recém lançada publicação intitulada “Born Free and Equal” (Nascidos Livres e Iguais), que afirmam a esperança de que “com o compromisso e esforços combinados de estados e sociedade civil, (...) veremos os princípios da igualdade e não-discriminação traduzidos em realidade para milhões de pessoas LGBT no mundo”;

 

4.      Recordando o discurso da Presidenta do Brasil, Exma. Sra. Dilma Rousseff durante a abertura da 67a Assembleia Geral da ONU (em 2012), que reafirmou os valores da “tolerância, o respeito pelas diferenças, a igualdade, a inclusão, a amizade e o entendimento, princípios que são também os alicerces dos direitos humanos”;

 

5.      Reconhecendo que a epidemia de Aids no Brasil afeta desproporcionalmente a população de  homens que fazem sexo com homens (HSH), com prevalência do HIV superior a 10% comparativamente àquela observada na população geral – 0,6% ;

 

6.      Reconhecendo o alto grau de violência perpetrada contra a população LGBT no Brasil e que o estigma e a discriminação constituem fortes obstáculos às ações de prevenção, diagnóstico e tratamento das DST/Aids junto a essa população, e representa evidente violação aos direitos humanos e à dignidade dessa população.

 

7.      Reconhecendo as iniciativas do Poder Executivo, nas esferas federal, estadual e municipal, e demais parceiros, na promoção da saúde da população LGBT e enfrentamento às DST/Aids junto a essa população, em especial, as mobilizações a partir do Plano de Enfrentamento da Epidemia de Aids e DST entre Gays e Outros Homens que Fazem Sexo com Homens e Travestis, e do Plano de Enfrentamento à Feminização da Epidemia de Aids e Outras DST, e a necessidade de sua efetiva implantação em todos as esferas de governo e com  participação da sociedade civil;

 

8.      Considerando pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo em 2008 que apontou que a população brasileira reconhece a existência de forte preconceito contra lésbicas (92%), gays (92%), bissexuais (90%), travestis (93%) e transexuais (91%);

 

9.      Considerando que o Relatório sobre a Violência Homofóbica no Brasil, referente ao ano de 2011, elaborado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, informa que, de janeiro a dezembro de 2011, foram denunciadas 6.809 violações de direitos humanos contra LGBT, que representam 18 violações diárias;

 

10. Consternados com a crescente violência contra a população LGBT, conforme indicada pela pesquisa do Grupo Gay da Bahia, que aponta a ocorrência em 2011 de 278 homicídios contra a população LGBT motivados por homo/lesbo/transfobia. No ano 2012 até a presente data já alcança 254 ocorrências (http://homofobiamata.wordpress.com/estatisticas/relatorios/, das quais 93 são pessoas trans;

 

11. Considerando também as recentes conclusões da Comissão Global sobre o HIV e a Lei, que indicam que o ambiente legal de um país – legislação, sua implementação e os sistemas de justiça – têm um grande potencial para melhorar a vida das pessoas vivendo com HIV/Aids e populações mais vulneráveis à epidemia de aids, tais como a população LGBT e, por isso, haveria a necessidade do incremento de leis protetivas e que visem coibir violências contra essas populações;

12. Recordando as palavras do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Exmo. Sr, Marco Aurelio de Melo “Não adianta comemorar o cinquentenário da Declaração dos Direitos Humanos, se práticas injustas que excluem os homossexuais dos direitos básicos continuam ocorrendo. É preciso que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário tomem consciência e tenham percepção de que é necessário enfrentar essa situação de grave adversidade por que passam os integrantes deste grupo extremamente vulnerável.”

13. Reconhecendo a necessidade de suprir as lacunas da legislação brasileira com vistas a tipificar as violências contra a população LGBT;

14. Considerando o princípio constitucional da laicidade do Estado brasileiro e sua obrigação de garantir o respeito aos direitos humanos de todos, independentemente de sexo, raça, cor, idade ou qualquer outra condição, tais como a orientação sexual e a identidade de gênero;

15. Considerando o Artigo 19, inc. I da Constituição Federal/1988 que estabelece: “É vedado a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I. Estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvenciona-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da Lei, a colaboração de interesse público” ;

16. Preocupados com a longa demora em aprovar o Projeto de Lei n. 122/2006 que preserve em seu texto final as salvaguardas e princípios com vistas a criminalização de praticas contra o pleno exercício da livre orientação sexual e identidade de gênero,

 

Resolve:

17. Solicitar a Presidenta Dilma Rousseff a necessária  priorização politica na promoção de ações que garantam o respeito aos direitos humanos e coíbam a violência contra a população LGBT;

 

18. Solicitar ao Congresso Nacional prioridade e celeridade no tramite do Projeto de Lei n.122/2006, visando sua votação e aprovação em plenária do texto final que assegure a criminalização da violência contra a população LGBT;

 

19. Solicitar ao Poder Judiciário para no âmbito de suas atribuições, envidar esforços no sentido de aprofundar a investigação pertinente e punir, com base na legislação vigente, os crimes de caráter homofóbico;

 

20. Solicitar ao Poder Executivo, em seus âmbitos correspondentes, o fomento a linhas  de pesquisa que visem preencher lacunas do conhecimento cientifico no que concerne a dados nacionais que reflitam a realidade da população LGBT no Brasil, com vistas a implantação de politicas publicas adequadas baseadas em evidencia;

 

21. Reforçar sua própria atuação na promoção do diálogo e informação visando a aprovação do Projeto de Lei 122/2006  bem como adoção de práticas que visem prevenir, punir e reparar violências de motivação homo/lesbo/transfóbica no Brasil; e,

 

22. Reafirmar seu compromisso junto ao governo brasileiro, organizações da sociedade civil e demais parceiros em cooperar com os esforços de enfrentamento às violências contra a população LGBT no Brasil, incluindo a criação de ambientes livres de estigma e discriminação.

 

”O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silencio dos bons”

Martin Luther King

 

 

Brasilia, 10 de Outubro de 2012.

 

 

Pedro Chequer

Coordenador do UNAIDS no Brasil, em nome do Grupo Temático


 

Instituições do Grupo Temático Ampliado do UNAIDS sobre HIV/Aids (GT/UNAIDS) presentes à sessão especial :

1. Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR);

2. Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC);

3. Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF);

 

 

 

 

 

4. Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres/ONU Mulheres);

5. Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA);

 

 

6. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO);

7. Organização Internacional do Trabalho (OIT);

8. Organização Pan-Americana de Saúde / Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS);

9. Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAIDS);

10. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) – Presidência do Grupo Temático;

11. Ministério da Saúde – Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais;

12. Secretaria Especial de Direitos Humanos    (SEDH);                                                                                                            

13. Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids (RNP+ Brasil);

14. Rede Nacional de Adolescentes e Jovens Vivendo com HIV;

15. Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas;

16. Movimento Nacional de Luta contra Aids;

17. Agência de Cooperação Técnica do Governo Alemão (GIZ);

18. Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA);

19. Agência Espanhola de Cooperação Internacional;

20. Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID);

21. Center for Diseases Control and Prevention (CDC);

22. Delegação da Comissão Europeia no Brasil;

Outras Instituições/profissionais presentes como expositores e que apoiam o documento:

23. Marcio Sanchez- em representação da Senadora Lídice da Mata;

24. Tony Reis- Presidente da Associação Brasileira LGBT/ Grupo Dignidade, secretário-geral da Associação Nacional de Gays, Lésbicas, Bissexuais, travestis e Transexuais no Brasil (  / ABGLT ) e Coordenador ASICAL (Associação para a Saúde Integral e Cidadania na América Latina e no Caribe ).

25. Keila Simpson- Presidenta do Conselho Nacional de Direitos LGBT (CNCD/LGBT)

26. Osvaldo Francisco Ribas Lobos Fernandez-professor da Universidade do Estado da Bahia (UNEB)

Convidados especiais que participaram da sessão de abertura do evento:

27. Deputada Federal Erika Kokay;                             28. Deputada Federal Jandira Feghali;

29. Embaixadora Ana Paula Zacarias - Chefe da Delegação da União Europeia no Brasil;